CAPÍTULO 5

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Os dias foram se passando, as perdas de ambos os lados foram aumentando, mas nenhum dos líderes conseguia ficar no mesmo lugar por muito tempo. Ninguém sabia exatamente porque se odiavam, mas sabiam que não era mais por divergência de opiniões e sim pela quantidade de pessoas que o clã vizinho havia matado.

Luke, um pequeno garoto do clã do Sul, não acreditava nisso de ter que odiar o outro clã porque eles acreditavam em leis e punições, mas chegou o dia que chegava para todo mundo de ambos os clãs. Ele perdeu alguém.

Esse dia havia sido bem tranquilo para ele, havia brincado com outras crianças, treinado e até se divertido bastante, mas, como qualquer outra morte, a dos pais de Luke foi inesperada e sanguinária. Bem parecida com a dos pais de Eloise. Ele encontrou os pais mortos, mas sem casa em chamas ou algo assim. Eles estavam no chão, com a garganta cortada.

O garoto desfez o sorriso que estava em seu rosto quando viu a cena, sentiu sua vista embaçar por causa das lágrimas e correu ao encontro dos corpos de seus pais. Eles já estavam mortos quando ele chegou. O menino não teve a chance de se despedir, de ouvir uma última palavra ou um último suspiro.

A dor era tanta, que ele ficou sem ar e sem saber o que fazer. Queria gritar, mas não conseguia fazer nenhum som. Um soldado que estava passando por lá viu a cena e correu para avisar Rebecca, pois sabia que a mãe de Luke também era alguém próximo da líder.

-- Líder? – o soldado disse ao entrar lentamente no escritório. Rebecca olhou para o rapaz, negro, vestindo seu uniforme, com um semblante muito triste no rosto. Só isso bastou para que o coração de Rebecca batesse mais forte.

-- Quem foi que morreu dessa vez? – ela perguntou como se estivesse completamente acostumada com aquilo, e estava mesmo.

-- É melhor a senhora vir comigo. – ele disse e Rebecca assentiu.

Ambos foram rapidamente até o local. Rebecca, ao ver o pobre garoto no chão, se encheu de compaixão. Abaixou-se para conseguir olhar nos olhos dele.

-- Luke? – ela disse, suavemente, e o rosto do garoto se virou para ela. – Você viu quem fez isso?

Rebecca não queria perguntar essas coisas, mas ela tinha que o fazer. Porque se tivesse alguma chance de ele saber quem estava fazendo aquilo, a guerra não seria necessária.

Mas o garoto apenas negou com a cabeça e ficou ainda mais triste por não poder ajudar a punir o assassino. Ele tentou segurar as lágrimas por um tempo, mas não conseguiu.

-- Está tudo bem, querido. – Rebecca o abraçou, sabia bem a dor de perder os pais – Eu estou aqui agora e vou garantir que você não passe por isso de novo.

O garoto encontrou conforto no abraço de Rebecca e a líder o guiou, lentamente até o local onde Rebecca passava a noite.

A líder colocou o garoto na cama de lá e se ajoelhou para conseguir olhar para ele.

-- Você está melhor? – ela perguntou e o garoto apenas balançou a cabeça em um "sim" mudo.

Rebecca compreendeu que ele não queria falar. Apenas deu um beijo na testa de Luke e disse a ele que poderia agir como se a casa fosse dele. E se precisasse de qualquer coisa, era só chamar.

O garoto só concordou com tudo que ela disse e a observou andando pelo quarto, colocando uma daquelas luzes portáteis de 2043.

Logo depois, ela saiu, deixando ele sozinho para assimilar tudo o que aconteceu.

Quando chegou na porta de seu alojamento, viu Thomas, que acenou para ela e veio a seu encontro.

-- Rebecca, eu soube da morte de Ana, o garoto está bem? – ele perguntou, com olhos preocupados.

-- Sim e não. – ela olhou para ele com olhos tristes e ele sabia o porque da tristeza: ela já havia passado por isso. – Você sabe, o garoto está em choque. É jovem demais para perder alguém assim...

-- Você não era tão mais velha que ele quando isso aconteceu com você... E isso a tornou mais forte, talvez isso também aconteça com ele.

-- Ou isso o destruirá e ele crescerá com o desejo de matar todos os nortistas. – ela ficou séria – você sabe que é isso o que eventualmente acontece. Não é à toa que várias pessoas vão ao meu escritório pedir a morte deles. Nosso povo é amargurado.

-- Nosso povo é normal. Só começou a ficar meio ruim quando começaram a dividir classes. Alguns tem funções, outros são meros seres que não servem para quase nada além de comer sobras e se arrastar no chão... depois disso, alguns se tornaram esnobes e começaram a pensar que têm o mundo nas mãos e podem matar quem quiser.

-- Divisão de classes nunca teve um bom histórico, lembro bem que meu pai dizia que classes servem apenas para criar conflitos internos... – ela riu ao pensar em como tudo estava um caos – eu estou falhando tanto com o nosso povo, Thomas, minha nossa, estou sendo uma péssima líder!

-- EI! – ele agarrou os ombros dela e olhou fundo em seus olhos – Nunca, jamais diga que você é uma líder ruim. Pode perguntar por aí, você é a melhor pessoa que já liderou esse povo. Fale com os anciãos, pergunte se pode mudar o quadro da desigualdade. Faça diferença! Porque você é capaz disso, ok?

Ela não disse nada, apenas balançou a cabeça e o abraçou. A única pessoa que ela era íntima viva na terra. Thomas era tudo o que lhe restava.

Agora deixa eu explicar essa coisa de "anciãos", "classes", enfim.... é importante.

Os anciãos, como o próprio nome já diz, são os mais velhos daqui, os únicos que podem dar opiniões nas decisões da líder. Antigamente, existiam até alguns que tinham visto a guerra, mas o tempo foi passando e agora são só pessoas mais idosas que, as vezes, não sabem do que estão falando ou tem o pensamento muito fechado. Mas é dever de todos respeitá-los.

Os líderes são pessoas escolhidas ainda crianças, elas lutam e a criança mais forte é a escolhida. É claro que o sangue e a linhagem importam. O sangue O- foi o mais extinto na terra, já era raro e agora se tornou ainda mais. Se alguém nasce com esse tipo, já pode se preparar para lutar ou morrer lutando.

Logo abaixo do líder, vem o chefe de guerra, ele comanda os guerreiros e as estratégias das batalhas que eles podem a vir enfrentar. Eles são escolhidos pelos próprios guerreiros ou pelo chefe anterior.

Depois, os guerreiros, que são basicamente as pessoas mais bem treinadas para lutar. Servem para lutar em batalhas, apaziguar brigas internas, entre outros.

Temos também os que cultivam os alimentos, os construtores, enfim... mas todos eles se resumem a trabalhadores livres. Livres porque eles podem parar quando quiserem. Não se tem mais valor no dinheiro, então ele não circula mais. O que define poder lá é a capacidade que uma pessoa tem de matar outro, não é à toa que o líder é escolhido através de uma batalha.

E nós temos também os desocupados, que não trabalham, não lutam, só ficam por aí, catando lixo e se reproduzindo. Ninguém gosta deles e ninguém se importa. São assim por escolha, Rebecca sempre tenta resgatar alguns. Ah! E quando uma criança nesse meio nasce, ela se chama "catadora', porque geralmente é ela quem vai catar o lixo para os pais.

Bom, acho que é só isso, vamos continuar a história.

Aquela noite já estava uma agitação, mas o que eles mal sabiam é que estava longe de acabar. 

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