Capítulo 3

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—O que está fazendo aqui? —Ele perguntou, segurando meus ombros com força, prestes a me sacudir. —Você ficou maluca? Você quer ferrar com a minha vida, é isso?

Eu demorei pelo menos uns trinta segundos para responder, enquanto tentava entender como uma pessoa tão calma e tranquila podia se transformar em alguém tão rude em fração de segundos. Não era a primeira vez em que essa pergunta me perturbava e não era nada agradável me sentir de volta àqueles dias, pouco depois da volta para o Brasil, em que eu tentava decidir o que fazer com as roupas deixadas por Henry.

—Talvez você não tenha notado, mas estou namorando Ben. —Respondi finalmente, soltando-me dos braços dele com a mesma estupidez com que ele me tratara.

—Não vem com esse papo pra cima de mim! Olha só, aquilo é passado, entendeu? Eu acabei de marcar a data do meu casamento...

—Parabéns. —Disse, com ironia até me dar conta do que realmente estava acontecendo. —Espere um segundo... —Eu respirei fundo para organizar meus pensamentos. —Você acha que estou aqui por sua causa?

—E porque mais seria?

—Olha só, eu nem ao menos sabia sobre a sua amizade com Ben. Nem sabia o nome da sua banda. Aliás, você nem ao menos me disse o seu verdadeiro nome, James. —Dei ênfase o bastante no nome para deixa-lo envergonhado, e saí batendo os pés com raiva.

Por sorte não havia ninguém no corredor e ninguém pôde ver que estivéramos, eu e James, trancados no banheiro por um breve minuto. Tentei me recompor até chegar à sala, mas não era boa em atuar. Então, fingi uma enxaqueca repentina causada pelo vinho e me despedi de todos, agradecendo mais de uma vez a hospitalidade e o jantar. Ben me levou de volta para casa e não questionou quando pedi que ele não passasse a noite. Eu não estava nada bem para ter outra companhia além de Clarice.

Percebi, enquanto abria a porta do meu apartamento, que também não queria ver Clarice, mas era tarde demais.

—E aí, como foi? —Ela perguntou, empolgada, com um balde de pipocas na mão.

—Você não checou seu celular, checou? —Perguntei desanimada, trancando a porta e me jogando de costas no sofá de três lugares.

—Não. Estava fazendo maratona de Crepúsculo. —Ela se justificou, pegando o celular e dando um gritinho após ler a mensagem. —Henry? Aquele Henry? O baixista?

—Ele mesmo. —Murmurei, cansada. —Clar, tem certeza que você não sabia sobre ele? Quero dizer, você é fã da banda, não é?

—Sou, mas nunca fui muito tiete. Só escuto as músicas, porque Ben me passou. Nunca nem fui à um show! Mas, Liz, não tem um Henry na Blue Vanilla.

—Porque não há um Henry nem na vida real. Nunca houve. Ele mentiu. —Sentei-me e roubei uma pipoca do balde. —Ele se chama James.

—O JJ? Não, Liz. Não é o JJ. Acho que você se enganou. —Ela voltou a dar play em Lua Nova, que ela estava assistindo pela milésima vez, e continuou mastigando sua pipoca.

—Isso mesmo. JJ. Foi assim que Stieve o chamou.

—Liz, o JJ é trans.

—Sim.

—V-você sabia? —Ela franziu o cenho.

—Sabia.

—Espera, você é lésbica? —Ela perguntou, depois de uma pausa breve.

—Clar, que parte de "gênero é diferente de sexualidade" você não entendeu? James é um homem.

—Tá, desculpa. Eu posso ser ignorante nesse assunto?

A canção que te escreviOnde histórias criam vida. Descubra agora