Capítulo 5

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Quando entrei no meu quarto, naquela noite, encontrei Clarice agarrada ao meu travesseiro, assistindo tv.

— Posso dormir com você hoje? — ela pediu, com voz de choro. — Eu não queria atrapalhar, mas...

— Pode — respondi, tirando minha blusa com cuidado. — Henry pode ficar assistindo alguma coisa no notebook, ou dormir na sua cama. A gente vê.

— Deixa eu ver o seu rosto — ela acendeu a luz, mas eu me virei para procurar um pijama.

— Eu estou bem, Clar! — disse.

— Não! Você está horrível, Liz! — ela se levantou e deu uma boa olhada no meu rosto. — Desculpe.

— Não é sua culpa. Marcos é que é um idiota.

— V-você vai denunciar ele, não vai?

— Vou. Mas não hoje. Hoje eu só quero dormir!

— Não queria que você soubesse, não queria que ninguém soubesse — ela se lamentou, agarrando-se ao meu travesseiro de novo. — Mas eu... eu me senti tão... bonita, interessante, ou sei lá.

— Você é bonita, Clar. Você é linda! — sentei-me perto dela e peguei sua mão com a minha mão inteira.

— Não. Eu não sou. Marcos está certo! Eu sou gorda e...

— E linda! — completei, abraçando-a antes de me levantar para procurar minha escova de dentes. — Que tal esquecer essa briga toda e me contar a parte legal? Pode começar me contando sobre esse cara.

— Você não conhece ele — ela disse, sentando-se de pernas cruzadas e enxugando as lágrimas que finalmente começaram a secar. — Marcos supôs que ele era daqui, mas ele não é. Ele é de São Paulo, só está aqui por uns tempos, fazendo um curso de fotografia.

— E ele é mais novo?

— Um pouquinho. Mas ele parece mais velho e bem mais maduro.

— Viu? Eu disse que a idade não importa!

— Você não disse.

— Disse sim. Mas continua contando — incentivei e comecei a escovar os dentes, de pé, escorada contra a parede.

— Não tem muito o que dizer. Além de que ele é fotógrafo e também que é super atencioso e... que me ligou no dia seguinte.

— Que raro!

— Sim, é ­— ela ficou me observando por um momento, até seus olhos alcançarem o baixo verde ao lado do armário. — Você ainda não fofocou comigo nada sobre Henry Moritz e seu baixo verde — ela se esticou para pegar o baixo e tocar algumas notas, distraidamente.

— Acho que não tivemos tempo, não é?

— Ele parece legal — ela disse, abaixando o tom de voz para que ele não ouvisse.

— Ele é — afirmei.

— Ele lembra o André.

— Não comece, Clarice! — Cantarolei. Ela tinha essa teoria de que eu escolhia os caras a partir do padrão "André de qualidade", o que era totalmente sem fundamento. Eu não fora apaixonada pelo nosso amigo André a esse ponto! Só tive uma leve quedinha que me fez cair na cama dele uma noite, mas nunca passou disso.

— De qualquer forma, parece que você acertou dessa vez.

— Não tem nada do tipo "acertou", Clar. Não vai dar em nada! Ele vai embora no fim da semana.

A canção que te escreviOnde histórias criam vida. Descubra agora