Maria Cristina Cumbana Lima, 2005
Com lentidão coloco as chaves na fechadura e deixo-a girar de leve, abrindo a porta. Estou estoirada. Não fosse o baile desta noite, desistiria do último ensaio e passava o resto da tarde a descansar. Entro casa adentro e estranho o silêncio. Ainda não fui lá acima, mas não ouço ninguém. Subo até ao meu quarto e ao depositar as chaves na estante vislumbro um bilhete dirigido à mim. É da Bia, uma das filhas do meu padrasto. O bilhete diz que a Cremilde não apareceu (a senhora que costuma vir três vezes por semana cuidar da casa), e que nenhuma delas teve tempo de ajeitar seja lá o que for. Pelos vistos sobrou para mim. Outra vez. Espreito os outros quartos, nem as camas conseguiram fazer. Na sala a mesa está suja com loiça do pequeno-almoço, e há roupas ao léu na varanda.
Tenho que fazer as arrumações todas, caso contrário será uma confusão quando a minha mãe e o meu padrasto chegarem, não gosto de bater boca ou trocar acusações com a Bia ou a Letícia. Não tenho tempo para isso. Também, não sou nenhuma ingrata, afinal dão-me abrigo e comida, então tenho que me comportar. A princípio achava que elas tinham vergonha de mim. Elas são miúdas populares, com acesso as mais badaladas festas da cidade e conhecem meio mundo, mas sempre que eu as pedisse para me levarem à alguns desses convívios - não porque gosto, mas porque sempre posso arranjar negócios nesses ambientes - elas recusavam-se, e arranjavam mil e uma desculpas, levando a minha mãe e o pai delas a acreditar que eu é que não queria juntar-me à elas. Com o tempo descobri que era o facto, de simplesmente, não me suportarem. Agora a coisa está ainda pior, pois além de não me suportarem, me desrespeitam.
Verifico então a cozinha imunda, pelos vistos terei que trocar a botija de gás, o que, felizmente, consigo fazer num instante. Normalmente troco botijas de gás e lâmpadas sem precisar de muita coisa ou de ajuda. Viver apenas com o meu pai, foi um aprendizado. Depois de fazer comida, lavo a casa de banho, limpo os quartos e a sala, e sento-me a ver os emails e para conversar no chat do ICQ, enquanto como uma fruta.
Mal acedo a internet, noto que a Angelina me enviou um chat.
- Viste o email dele, MC?
- Email de quem? – digito.
- Do Daniel! – responde.
Abro o email e lá estão três novas mensagens. Uma delas é do Daniel de Barros. É dirigida à mim, à Angelina e ao Fradique, com conhecimento do professor Masseque Júnior, o coordenador do nosso curso.
"Caros, tenho o prazer de informar que a CRW aprovou o vosso pedido para estágio no nosso escritório. Agradecíamos que aparecessem cá na segunda-feira às 10:00 para os devidos arranjos e formalidades.
Cordiais saudações,
Daniel"
- Com que então aprovaram o pedido! Não acredito! – digito a meio de um sorriso.
O pedido foi submetido há cerca de três semanas, logo depois que começamos a fazer visitas à CRW, para o trabalho da faculdade.
- Eu bem disse-te que iria ser assim! – escreve ela. E chega-me outra mensagem
- A tia Irina está em casa? Preciso falar com ela sobre aquele assunto.
Angelina anda com a mania de fazer terapias, estranhas terapias. Parece que a minha mãe está a ajudá-la com isso. Eu não me conformo com estas maluquices e prefiro manter distância do assunto.
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Sina
RomanceA última coisa que Pedro Lucas deseja, é ver a sua amada traficada como escrava às Ilhas Francesas. Dona Luísa Noronha, entretanto, dona do Prazo de Aruanda e mãe de Pedro Lucas, é uma mulher que não mede esforços para alcançar seus objectivos, traz...