*\LUCAS/*
Os dias foram passando, tirando o desconforto de me ajustar aos novos ambientes, não tive maiores problemas. Frequentar a escola, aulas extracurriculares, fazer amizades com os colegas de classe, passar as noites com tia Ana e com a Léia, trocar figurinhas com o porteiro Pedro, brincar com o Bolseiro, terminar minhas lições a tempo, não perder o horário das consultas com a psicóloga. Quando se acostuma com a rotina, criamos um roteiro que é seguido no modo automático, essa estabilidade ajuda a não ter pensamentos desagradáveis. Mas o fim de abril se aproxima e traz perturbações ao meu frágil sossego.
A tia Ana estava incomodada com a proximidade DA DATA. Ela, a Léia, os professores, o seu Pedro, todo mundo!!! E obviamente sou a razão.
Não quis participar da preparação para a comemoração do dia das mães, por motivos de: NÃO TER MÃE.
Todo mundo está cheio de dedos comigo. Eu até entendo o lado deles, não queria estar nessa posição, mas querer eu não quero nem estar na minha! Porém, já que não tem muito jeito, temos que lidar com essas partes chatas da vida, de preferência sem encher o saco do próximo.
Eu estava deitado no sofá, passeando pelos canais da tv, tia Ana sentou no chão recostada no sofá. Ela nunca tenta me forçar a nada, me dá liberdade de fazer o que me deixa confortável, mas ela ficou muito esquisita quando se deu conta da proximidade da bendita comemoração.
- Tia? Você sabe que minha falta de vontade em participar do circo dos dias das mãe não tem nada haver contigo, né?
- Claro... É só que imaginei que fosse ficar mais fácil, mas o tempo passa e não sei se temos melhoras.
- Bem, uns dias atrás a gente só fingiu que não sabia que dia era, acho que falarmos sobre já é uma evolução.
Continuamos vendo TV e falando do evento de dia das mães que estava pra vir na escola. Quando surgiu o assunto de mandar um convite pro além, em meio a brincadeiras tia Ana falou para não mencioná-la na suposta carta.
- Eu não acho que a Mel ficaria tranquila se soubesse que eu estou responsável por cuidar de você. Meu histórico é péssimo, ela acharia que estou te ensinando a pular muros e fugir de fininho.
- Discordo. Lembro de perguntar se você não gostava dela, já que nunca ia visitar. Mamãe disse que antes de eu nascer, você era a pessoa que mais a amou, ainda brincou dizendo que você odiaria ficar em segundo, mas pra compensar você sempre seria a pessoa que mais cuidou dela. Acho que ela confia na sua capacidade e ficaria satisfeita de saber que estou sob seus cuidados. Esse foi um dos motivos pra eu querer ficar aqui, você teve as melhores recomendações.
Por um tempo tia Ana ficou em silêncio, escondendo o rosto numa almofada próxima, mas não foi muito útil para esconder o choro que ela deixou escapar.
Tia Ana sempre tenta me fazer falar sobre meus pais e lidar com meus sentimentos, mas ela mesma não sabe lidar com os próprios. Ela nunca se perdoou por ter se distanciado da mamãe. Acho que ela nem considera o fato de mamãe também ter se afastado.
Acaricio seus cabelos até ela levantar e limpar as lágrimas silenciosas de seu rosto.
- Sabe Lucas, eu sou muito grata por minha irmã ter feito um ótimo trabalho como mãe e muito grata por apesar de eu ter cumprido meu papel de irmã mal e porcamente, Mel ainda conseguiu enxergar meu amor. Em meio a tantas burradas ela conseguiu enxergar o cuidado. Apesar de tudo, eu sou muito grata e a cada dia mais feliz, pois você não foi outra parte tão preciosa da minha vida que deixei para traz.
- Tia, eu sempre irei desejar que o final daquela noite fosse outro. Que eles voltassem trazendo a sobremesa que prometeram por terem saído sem mim. Mas mesmo podendo mudar toda aquela noite, na manhã seguinte eu imploraria pra vir até a senhora. Eu com certeza gostaria de conheceria o seu Pedro, de brincar com a Léia e de saber o quanto você é importante em nossas vidas. Eu estou triste, todo mundo falando em todo lugar sobre mães me deixa deprimido, mas estou feliz por ter você ao meu lado.
Tia Ana sentou no sofá comigo e me abraçou com carinho, passamos o resto da tarde conversando, chorando e sorrindo.
Novamente penso em mamãe, uma vez ela encontrou o maior carinho do mundo nesses braços e ainda posso senti-lo aqui.
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Welcome home
General FictionFamília é aquela coisa importante de mais pra ser tão delicada. Apesar da delicadeza não é nada frágil, seus laços resistem mesmo quando nos afastamos. Seja a sua perfeita ou tão bagunçada quanto a minha, sua vida sempre terá as marcas dessas amarra...