Capítulo 1

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- Evelyn!

...

- EVELYN ROTTEN BROWN! ACORDA AGORA ANTES QUE TENHA QUE IR AÍ!

Abri os olhos sobressaltada, sentando-me instintivamente.

- Já estava acordada mãe! - resmunguei, esfregando os olhos para me acostumar à claridade.

Estremeci ao sentir o piso gelado. Dirigi-me ao armário agarrando as primeiras peças de roupa que vi - umas calças de ganga escuras e rasgadas, assim como uma sweatshirt  preta que a minha mãe me ofereceu na semana passada. Notavam-se alguns borbotos, mas isso era algo que me era trivial.

Vesti-me à pressa, olhando de relance para o espelho baço - Podia estar pior. O meu cabelo estava caótico, diferentes tons de castanho emaranhavam-se desconcertadamente. Os meus olhos cansados, acompanhados dos típicos sacos escuros, sobressaíam-se no meu rosto, tornando a minha pele mais clara que o normal. Devia realmente estabelecer um horário de uso do computador.

Segui para a casa de banho amaldiçoando a corrente fria de ar que se instalava no corredor. Apressei-me a lavar o rosto e prendi o cabelo, enquanto bochechava um elixir para me livrar do mau hálito. Senti imediatamente os meus lábios a arder por estarem tão gretados.

Entrei calmamente na cozinha. A minha mãe soltou um gritinho quando me viu sentada à mesa com o café na mão.

- Filha, não precisamos de um ataque cardíaco hoje - comentou com um sorriso o meu pai, sem tirar os olhos do jornal, sentado na poltrona. - A tua mãe tem muitas encomendas hoje.

- Então a senhora Lockhearth sempre quis os cupcakes? - perguntei animada, vendo-a a tirar os bolos do forno. - Espera! Hoje não fazias o turno da manhã também?

- A Srª. Archeron dispensou-me esta manhã, então aproveitei para despachar estas caixas. - respondeu a minha mãe, entregando-me uma waffle.

A minha mãe trabalha num café perto de casa, o café Sixty Seconds. Só vi a dona do estabelecimento, Viviane Archeron, uma vez e apercebi-me logo que se tratava de uma pessoa bastante arrogante. Além deste trabalho, que já era suficientemente desagradável e desgastante, também havia as encomendas. A sua paixão sempre fora cozinhar, especialmente doces. Desde que me lembro, que a ouço falar sobre abrir a sua própria pastelaria, mas infelizmente nunca foi possível. Para compensar esse desejo, começou este pequeno negócio: um serviço de encomendas das suas iguarias. 

- Tenho quatro encomendas para hoje. - Continuou, enquanto eu engolia todo o café - E para amanhã tenho o bolo da nossa vizinha Fiona. Acreditas que aquela miúda já vai fazer 4 anos?

- É mais difícil acreditar que esta aqui vai para na faculdade para o ano. - interviu o meu pai, dando -lhe um beijo na mão, quando esta lhe passou uma chávena de café.

Devorei rapidamente o resto do pequeno almoço e apressei-me a calçar as botas no momento em que me apercebi de que horas eram. Estava definitivamente atrasada.

Dei um beijo na testa do meu pai e corri para me despedir da minha mãe. Deslizando sorrateiramente a minha mão, roubei um dos cupcakes que ela empacotava, já sentindo o seu olhar reprovador, enquanto vestia o casaco, pendurado à porta de casa. 

Saí de casa já com a mochila às costas, descendo as escadas em passadas largas. Mal saí do prédio, disparei em direção à paragem de autocarros que, para a minha felicidade, estava cheio, permitindo-me invadir o veiculo, passando despercebida entre a multidão.

-Ah! - Disse batendo com a mão na testa.

Esqueci-me completamente de devolver o livro ao meu pai, mas também não tinha coragem de lhe confessar outro fracasso. Simplesmente é me impossível ler mais de duas páginas seguidas, para além do tempo que o demoro a executar. Desde a sua admissão como bibliotecário, o meu pai tenta incansavelmente ajudar-me a superar a dislexia. Porém nunca resultou.

Evelyn Brown e a Marca PerdidaOnde histórias criam vida. Descubra agora