Capítulo 3

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Ao mesmo tempo que as suas feições se alongavam, a sua pele assumia uma tonalidade avermelhada, que se assemelhava a uma pele esfolada. Os seus braços esticaram até alcançarem os seus joelhos. Conforme a sua estrutura tomava cada vez proporções maiores, o seu uniforme desfazia-se, rasgando-se. O seu cabelo caíra no chão, enquanto o branco tomava posse total dos seus olhos. O seu corpo, que agora era visível parcialmente, parecia tísico, salientando os ossos, articulações e músculos. No lugar das unhas, ameaçadoras garras desenvolviam-se. Assim que se virou agoniado tapando os olhos, observei a coluna vertebral salientada, bem como todas as suas vértebras.

Queria mover-me, sabia que tinha de me mover, mas não conseguia. Era como se uma força interior me impedisse de seguir o que o meu cérebro mandava. Sentia-me uma daquelas personagens de quem me ria quando via os filmes de terror. Aquela personagem que entrava em choque face algo novo, algo completamente aterrorizador. E eu sabia que estava em choque.

- Bom, já que estás aqui, não vais ficar só a ver o espetáculo. - sorriu diabolicamente o que antes eu considerava ser o Fred. - Podes mesmo fazer parte do jantar.

Dizendo estas palavras, lambeu os beiços e esticou os braços na minha direção com as palmas da mão abertas, prestes a segurar-me.

Do nada, senti-me a ser violentamente atirada para longe do ataque da criatura. Aterrei por cima do braço, sentindo o peso de alguém por cima de mim, mas nem tive tempo para processar a dor. Em menos de dois segundos, Aaron já puxava a minha mão, guiando-nos entre as estantes.

O rugido do monstro fez-se ouvir. As minhas pernas libertaram-se dos seus travões invisíveis, saindo do estado de choque, permitindo-me correr sem ser arrastada.

- Baixa-te! - exclamou Aaron, puxando-me, de novo, para o chão, no preciso momento em que uma mesa sobrevoava as nossas cabeças.

- O que é aquela coisa? - perguntei desesperada, sendo completamente ignorada.

- Semideuses! Semideuses deliciosos! - exclamou o monstro.

Ele estava a aproximar-se. Aaron apenas fitou-o e, num movimento rápido, puxou o colar de prancha que estava no seu pescoço. Num piscar de olhos, um clarão tomou conta do espaço e, no lugar onde estava o colar, um enorme arco dourado surgiu nas suas mãos.

Retirou uma flexa da aljava que aparecera nas suas costas e, num tiro certeiro, fez um urro ecoar pelo local. Consegui ver o monstro a agarrar-se à perna, em desespero, tentando arrancar a seta.

- Vão pagar por isto! - rugiu.

- Thíaso! - exclama o loiro, para a sala, levantando-se, movimento esse que eu repeti. - Procura o livro que eu trato dele!

Thíaso não se manifestou, mas consegui ouvir alguma coisa a ser atirada ao chão. Talvez fosse ele à procura desse item.

- Tu conheces este lugar melhor que eu. - disse-me Aaron, obrigando-me a olhar para si, ao agarrar-me com força no braço. - Esconde-te!

O meu coração começa a bater rapidamente outra vez quando Fred se fez soar. Engulo em seco.

- Eu juro que trato dele, mas tens que te esconder. - insiste e eu assinto com a cabeça ainda insegura.

Ele dá um sorriso de lado e dispara rapidamente outra flecha, bem rente à minha orelha, empurrando-me em seguida, para eu fugir.

E foi o que eu fiz.

Tentei bloquear o máximo que pude: os sons do monstro, as setas atiradas a cada segundo, a mobília a ser destruída, os gritos de Aaron.

Tive um vislumbre das escadas livres e avancei para andar de baixo o mais rápido que consegui, sentindo me ser encoberta pelo loiro. Rodei a maçaneta da porta da sala de limpezas, quase a chorar de alívio, quando constatei que estava aberta. Normalmente costumavam tranca-la.

Evelyn Brown e a Marca PerdidaOnde histórias criam vida. Descubra agora