Capítulo 13 - Plangor

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"Eu podia sentir que estava perdendo o controle, mas algo me dizia que as coisas iriam mudar, e não era pra melhor."


Eram 6:30 da noite, quando Mario bateu em sua porta como sempre fazia. Depois de muito insistir, dessa vez não forçou.

"Me esforcei para me manter calada, e segurei firme em minha cama para controlar a tremedeira que dominava meu corpo. Pude ouvir o som de meu pai fechar a porta de seu quarto com violência, e logo em seguida trancar a fechadura para que nada o interrompesse. Depois dessa situação eu jamais iria atrás dele para saber os motivos que o levou a não me falar a verdade. O medo de ter conhecimento de outras coisas, era superior a minha curiosidade. Esperei acabar de escurecer e saí de meu quarto. Estava com uma fome terrível!"

Clara caminhou até a cozinha e pegou um pouco de leite gelado.Foi até o armário ver se tinha algo que desse pra alimentar. Algo que caísse bem com um copo de leite. Seu pai, Mario, ainda estava em seu quarto, e podia-se ouvir o arrastar de móveis e ranger da janela de seu quarto que insistia em bater. A noite estava fria, e o vento passeava pela casa que já não era muito aquecida.

Sentada à mesa, Maria comia e esperava que aquele dia, turbulento, terminasse e que a manhã seguinte fosse mais um dia comum. Um dia qualquer, como se não tivesse existido o hoje, e que amanhã chamaremos de ontem.

"Eu não esperava que as coisas voltassem a ser como antes, porque caso acontecesse, eu voltaria a viver naquela suposta liberdade que achei ter. A ilusão de achar que está solta, quando se está em um covil. Sim, posso comparar a isso pois a maneira em que eu penso que vivi, é semelhando a um covil. Apesar de ter uma vaga lembrança, ainda me sinto presa a uma culpa que não acredito que tenho, mas o pesar da memória, traz a tona um jugo que me faz caminhar por lugares sombrios."

Nada poderia justificar tal atitude que seu pai supostamente cometeu. Para Clara, estava nítido que aquele homem, que respondia como pai, era um farsante, mas que nada ainda fazia tanto sentido diante da frustração de achar que conhece alguém que julga ser familiar. Quando não se lembra de algo, sua mente começa a criar supostos momentos que não existiram, a fim de cobrir o buraco que o esquecimento deixou.

Às vezes é melhor não ter lembranças, a ter lembranças ruins. Elas trazem não só a felicidades de tais momentos, como também a dor. Há pessoas que sofrem pelas memórias perdidas, mas há aquelas que sofrem por não conseguirem esquecer.

"Acredito que meu pai não queria ser lembrado. Ele queria não ser esquecido. Parece óbvio a colocação, mas não é tão simples assim. As pessoas que são lembradas, elas retornam de tempo em tempo em nossas memórias. Mas as que não são esquecidas, estão presente todos os dias, não importando se foram boas ou ruins, elas estão sempre lá. Nos fazendo sorrir ou chorar constantemente."

Lá pelas 8 horas da noite, Mário abriu a porta de seu quarto, foi até a sala e ligou a TV. Estava passando um daqueles programas de músicas, onde pessoas cantam como se estivesse no banho, e outras pessoas votam como se fossem especialista na área só porque canta também. Onde a população vota como se soubesse o que é um Dó na harpa. Isso se sabem o que é uma harpa. Não que ninguém soubesse, mas não que a maioria soubesse. É difícil se posicionar a respeito de algo, e ao mesmo tempo é muito fácil, quando se concorda com aquele que lhe questiona, ou com a tal da minoria que tanto se tornar grande como a maioria. Do oprimido ao opressor. É isso que acontece com alguns oprimidos. Não todos.Passam pela metamorfose até se tornar o opressor, porque para essas pessoas, para deixar de ser oprimidas, precisa oprimir alguém. Se tornar um opressor.


Hoje, exatamente neste momento, terá gente falando que nada disso é verdade, mas com a permissão da subjetividade, digo-lhe: "sua realidade não é como de outras pessoas. Apesar de viverem no mesmo planeta, não quer dizer que não vivem de formas diferentes, então apenas leia, abstraia. Retenha o que é bom, e continue sua leitura sobre a vida de Maria Clara."


"Fechei os olhos e respirei profundamente. Desejei sua presença, seu carinho, mas em vez disso, percebi que fui tomada pela sensação de frescor que entrou pela janela. Sonhei de olhos abertos no dia em que vamos nos ver. No dia em que todas as coisas serão reveladas. Questionei-me por uns instantes na busca de descobrir se o erro estava em mim. Se tudo isso é coisa de uma mente perturbada. "


Enfim o dia estava acabando. Faltava pouco para as 23hrs, e Maria já estava na cama fazendo que lhe deixava mais leve. Suportar a dor por muito tempo, as vezes faz com que as pessoas desistam do mais belo dom dado pelo Divino. O dom da vida.


Em hipótese alguma, negar, violar, atentar contra a vida é a solução para uma dor. Ainda não se sabe para onde vamos após a morte, então na dúvida, faça o bem, porque se há um céu, é melhor estar lá. Por mais que a dor passe aqui, não sabemos o que vem depois, pois se há um inferno, é melhor não ir até lá.


O questionamento que mais é feito é "para onde vou após a morte?". E eu pergunto "para onde você quer ir após a morte?"

"Hoje eu chorei. Chorei porque a dor percorreu pelo meu corpo mais uma vez. Chorei porque tive a sensação de perda. De perda de alguém, e percebi que estava me perdendo em minhas mais profundas tristezas. Chorei porque achei em mim um resquício de esperança. Chorei porque sobrevivi mais um dia. Chorei porque escolhi dar mais uma chance a esse alguém que achei ter deixado num passado que não pertence mais a mim. Chorei porque algo falou em meu ouvido que por pior esteja sendo, alguém precisa de mim. Cacei em cada canto do meu ser, vestígios de boas memórias e percebi, que as coisas ruins, que por mais que tenham sido poucas vezes, tomam mais lugar que as diversas coisas boas que já me aconteceram. O problema está na ênfase que dei no que não deveria. Eu alimentei a tristeza e não reguei a felicidade. Me tornei amarga." 

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⏰ Última atualização: Dec 27, 2018 ⏰

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