03 | 俺はあなたが大嫌いです

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Eu tinha catorze anos. Eu tinha catorze anos. Ainda não consigo visualizar aquela época com um olhar nítido; minha mente parecia desfocada de alguma forma e, meus pensamentos, meio perdidos, aleatórios. Sei lá, é meio difícil explicar.

Parecia uma sombra ao redor da minha visão que tampava alguns elementos e deixava outros mais iluminados, com mais foque. Eu tinha catorze anos naquele momento, naquele orfanato de merda, tinha acabado de fazer catorze anos quando me encontrava sentado nos bancos desconfortáveis da igreja, à noite. Era de noite e estava trancado, mas eu tinha as chaves da igreja. Consegui roubá-las num incidente até mesmo engraçado, mas perdoe-me se não consigo focar nos pensamentos engraçados nesse momento.

Era de noite naquela igreja e no resto daquele orfanato, óbvio, e eu estava sentado sozinho, de olhos fechados, pensando num livro que eu tinha lido algumas milhares de vezes. Não tinham muitas opções ali. Mas, graças a ter lido tantas vezes, eu conhecia o roteiro tão bem que fui capaz de passá-lo em minha mente como em um filme.

Antes dos meus catorze anos, quando eu ainda era uma criança imatura, eu pensava em Johan todos os dias. Já haviam se passado cinco anos desde que ele saíra do orfanato.

Nós tínhamos tido uma amizade de três anos. Já haviam se passado cinco anos desde que ele saíra do orfanato. Pois bem, o saldo negativou-se e, com isto, eu deveria ter parado pensar nele.

Quer dizer, eu de fato parei. Parei por um tempo, por uns... bom, algum pouco tempo ou até mesmo um tempo razoavelmente mediano. Eu não sei se isso seria considerado muito ou pouco tempo, mas a questão é: eu tinha parado de pensar nele.

E ao mesmo tempo eu não tinha. Johan tinha sido o único amigo que eu fizera nesses catorze anos de orfanato. O único amigo que eu fizera, o amigo que teria prometido ficar comigo pra sempre, então eu nunca fiz questão de fazer outros amigos. Até porque eu odiava todo mundo dali.

Era de noite naquela igreja, naquele orfanato e naquela cidade. Mas vai saber se era de noite onde Johan estava; talvez ele tivesse sido adotado por japoneses. Talvez ele tivesse morrido e, nesse caso, eu não faço nem ideia de como são as divisões noite/dia do céu.

Se eu tinha catorze anos, os garotos mais velhos do orfanato tinham uns dezesseis. Só faltava dois anos pra eles irem embora e eu nunca mais precisar vê-los.

Bom, esses dois anos foram mais longos e demorados do que os resto dos anos, porque eu tinha catorze anos quando comecei a ter pensamentos realmente insanos.

Minha mente traiçoeira começou a me sabotar quase que de propósito. Eu sentia um cheiro horrível, meio salgado, meio ácido, não sei bem explicar, mas eu sentia um cheiro horrível em horários aleatórios mesmo não tendo nada ao redor. Parecia um cheiro forte, eu não sei muito bem definir cheiros. Mas era horrível e eu sentia.

E eu morria em agonia porque minha mente era solitária. Não tinha em quem pensar, não gostava de ninguém e nem mesmo gostava de mim, então eu pensava em Johan.

Naquele sorriso encantador, naqueles cabelos loiros macios, naqueles olhos azuis penetrantes. Na falta da voz dele e na presença da voz dele. Aquela voz era linda, apesar de embolada, e ele não tinha coragem de falar por causa daquela língua presa de merda. Mas eu pensava nele. Eu o comecei a odiar há pouco tempo, mas nada muito forte, nada muito rancoroso. Um ódio meio saudável até porque eu sabia que era tolice minha.

Johan deveria ter uns quinze anos agora. Ele, muito provavelmente, estava na escola atrás de alguma garota que bateu os olhos e se apaixonou, em uma paixão adolescente imediatista, ou então estudando pra prova de matemática. Ou mesmo tomando o ônibus junto com os outros alunos pra ir num passeio escolar. Ou mesmo dando seu primeiro beijo, ou mesmo comemorando que passou direto e sem recuperação... a verdade é que eu não fazia ideia do que ele estaria fazendo num momento daqueles.

O Mentiroso (COMPLETO)Onde histórias criam vida. Descubra agora