Epílogo

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Em um dia calmo no orfanato, eu e o meu amigo estávamos no quarto. Era de noite; não deveríamos estar juntos em meu dormitório, mas estávamos.

Ele era aquele típico garoto estúpido: não era muito bom em estudar. Por sorte, eu era, e, mesmo sendo mais novo que ele, eu já sabia ler e escrever. Por mais que eu gostasse de ler livros pra ele, eu não pude deixar de querer ensiná-lo a realizar tais ações. Por isso, eu comecei a o ensinar a escrever.

– Então, é assim que você escreve o Jota...

- Kraepelin criou o termo "Demência Precoce" -

Francisco voltou para sua casa em prantos. Confuso, irritado, nervoso. Lembrava-se claramente que Nathaniel não gostava que ele saísse de casa sem avisar, ainda mais para encontrar pessoas que ele não conhecia. Sabia disso e, por isso, um dos sentimentos que sentia era a vergonha.

Vergonha por chegar em casa e dar de cara com a figura de Nathaniel. Nathaniel estava mais estressado que ele e caminhava pelo apartamento em passos infinitos, encarando diretamente o chão e bufando de ódio. Tentava espairecer seu ódio, mas seu semblante de fúria era maior. Fúria extrema. Francisco, por outro lado, o observava com medo.

– Você... você não vai falar nada? – Francisco indagou. Estava parado e somente via Nathaniel arrumar forças para não gritar.

Nathaniel, entretanto, não resistiu:

– COMO NÃO FALAR NADA? – Gritou, deixando o outro acuado. Virou-se de frente para Francisco. – Você mentiu pra mim, Francisco! Você mentiu! Você continuou vendo aquele cara, mesmo eu insistindo pra você não fazer isso! Como você faz isso comigo, hein? Por quê? Por que você fez isso comigo? Por que você mentiu pra mim? Que ódio, Francisco! Tudo que eu te pedi a minha vida inteira foi por honestidade! Como você mente pra mim? Por que você saiu com ele? O que vocês dois estavam fazendo essa hora da noite, juntos? Não pode ter sido coisa boa, já que você escondeu essa informação de mim!

- Bleuler tomou o termo para explicar os pensamentos confusos -

E eu era alguém realmente paciente. Sério. Eu não era alguém preguiçoso. Mesmo Johan sendo extremamente burro, eu continuei a o ensinar. Já cantávamos o alfabeto em conjunto, mesmo ele teimando em não querer falar, devido ao seu problema de fala.

Eu queria que ele aprendesse a escrever, no mínimo, o nome dele.

– Você conhece essa letra, não é? Que letra é essa? Jota.

– Jota.

Jota.

Nathaniel estava junto a Francisco no banheiro. Francisco chorava pesadamente enquanto lembrava-se do ocorrido um pouco mais cedo, naquela mesma noite. Em como ele havia perdido completamente a cabeça depois de achar que Johan era a mesma pessoa de sua infância. Aquele rancor que sentia, aquela vontade de matá-lo, aquilo havia sido o suficiente para querer ver Johan morto.

Se a irmã de Johan não estivesse presente na cena, Francisco o teria matado sem dó.

Nathaniel, em seu extremo oposto, não era uma pessoa rancorosa em nenhum sentido. Estava junto a Francisco, alisando as costas dele para ver se conseguia acalmá-lo. Falava com uma voz baixa, calma e tranquila, o mesmo tipo de voz que Francisco estava acostumado a ouvir:

– Ei, ei, ei... não fica assim. Eu não gosto de te ver triste, nem chateado.

– Eu menti pra você... – Francisco disse, em meio às lágrimas. – Você me pediu pra bloqueá-lo e eu realmente o bloqueei, mas eu saí com ele hoje à noite.

O Mentiroso (COMPLETO)Onde histórias criam vida. Descubra agora