Casa de madeira

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Acordei com um raio de sol fraco, que me atingiu a face. Era fraco não por aquele ser um dia enevoado, mas sim pela cobertura e proteção que as copas das árvores me forneciam. Sentia o corpo todo dorido. Adormecera numa posição extremamente desconfortável, para não falar do lugar em que o fizera.

Esfreguei os olhos querendo acordar, querendo descobrir que tudo aquilo não passara de um sonho, mas foi inútil. Estava mesmo rodeada de floresta, toda igual, sem caminhos definidos. Não fazia a menor ideia de como voltar para casa e muito menos de como sair dali.

Levantei-me e tive uma tontura, tudo começou à roda. Quando parou dei um passo em frente, pisando um galho que se encontrava no caminho. Tentei ouvir algum som familiar ou ver algo que me pudesse ajudar a sair daquela situação, mas o bosque vivia num silêncio interminável que me provocava zumbidos nos ouvidos.

Comecei a caminhar numa qualquer direção, seguindo o meu coração. Vi alguns arbustos com bagas vermelhas, que por mais fome que tivesse não deixavam de ser venenosos, alguns pássaros à procura de comida para as suas crias e muitas outras coisas que não me serviam de absolutamente nada.

Após andar um bocado ouvi algo que me pareceu um machado. Batia intensamente e repetidamente contra uma árvore, provavelmente na tentativa de cortá-la. Eu e o meu pai costumávamos passear por aqueles bosques quando eu era mais nova e ele sempre me ensinara que a desflorestação tem de ser parada.

Compreendia o porquê. Afinal de contas são as árvores que nos fornecem o oxigénio que necessitamos para viver, mas parece que as pessoas só veem na madeira algo que podem arder para produzir calor, ignorantes.

Não posso julgá-los, de qualquer forma. A verdade é que a minha família também compra madeira, pois não quer desmatar o bosque perto de casa, para poder colocá-la na lareira durante o Inverno. O ser humano realmente é estranho: sabemos que estamos a errar mas cometemos os erros mesmo assim.

Procurei o homem do machado por todo lado, segui o som e dei várias voltas naquela grande mata, mas não encontrava ninguém e tinha a certeza que estava naquele momento o mais perto do som que podia. De onde vinha?

Levei a mão à testa quando me apercebi do quão parva estava a ser. Olhei para cima e tal como tinha suspeitado era um pica-pau. Perfurava o tronco da árvore com o bico como que na tentativa de magoá-la, mas sem sucesso.

Tinha-me perdido do caminho que estava a seguir anteriormente por isso decidi continuar na direção do bico do pica-pau. Andei mais alguns minutos, que pareceram dias, e encontrei uma pequena casa no topo de uma árvore: sempre quisera ter uma daquelas.

Olhei-a de longe. Era perfeitamente assimétrica. Era uma casa desajeitada, envergonhada e solitária. Aproximei-me e reparei nas escadas que davam até à sua entrada. Há quanto tempo estivera ali aquela casa? Seria seguro subir? Não queria destruir aquela linda residência e muito menos magoar-me.

Decidi arriscar. Quando lá cheguei a cima tive a noção de que a casa se encontrava muito mais alta do que parecera lá de baixo. Abri a porta, que chiou, com muito esforço, estava penra. Não era aberta há bastante tempo por isso tive algum medo entrar.

Entrei e, embora a casa fosse relativamente espaçosa, quase não havia espaço para o meu corpo. Haviam dois sofás cansados e tristes, uma mesa igualmente tristonha e alguma tralha, que cobria a superfície da mesa.

Estava óbvio que aquela casa tinha agora novas proprietárias: as aranhas. Estavam por todo lado e em todo lado. Não havia nada a ser feito naquele local e estava a começar a ficar esfomeada por isso desci as escadas e voltei ao meu caminho de saída daquele bosque.

De repente ouvi um barulho. Um barulho que mais me soou como o canto de um anjo: um automóvel. Olhei bruscamente a todo o meu redor, mas não havia sinais de nada: nem de um carro nem de uma estrada. Havia uma grande chance de haver estrada ali por perto, mas para onde devia dirigir-me?

Primeiro pensei em ficar quieta e atenta, à espera de que passasse outro carro para que eu reparasse de onde vinha o ruído, mas pensando melhor: quanto tempo poderia demorar até que passasse alguém numa estrada perto do bosque? Podia demorar alguns minutos, poderia demorar algumas horas.

Só havia uma coisa a ser feita: escolher que rumo tomar. Reparei que para um dos lados a floresta ficava mais densa, estava fora de questão. Tudo o que menos me apetecia era perder-me ainda mais e em sitios ainda mais confusos. Por isso restava-me umas... 40 direções?

O meu estômago roncava de fome. Soava tão revoltado que por momentos tive medo dele. Tinha de arranjar comida e água. Decidi caminhar para a esquerda. Voltei a passar pela pequena-grande casinha da árvore e segui caminho.

A certa altura já não caminhava a direito, encontrava-me numa subida consideravelmente íngreme. Não conseguia ver o que estava para além dela por isso o meu peito encheu-se de esperança e impulsionou-me a subir cada vez mais depressa. Estava a correr.

Comecei a ver uma mancha cinzenta por cima do monte de terra que ainda me faltava subir e arregalei os olhos de surpresa. Era uma estrada. Pulei para fora do bosque e observei em volta: à minha frente havia uma estrada e do outro lado desta havia.... mais bosque.

Tive vontade de me deixar cair no meio do alcatrão para ser atropelada por um camião, mas não o fiz, obviamente. Encontrara uma estrada ladeada por árvores e mais árvores. Mas pelo menos encontrara uma estrada.

Só tinha de esperar que passasse um carro para me dar boleia até à minha casa. Para me dar comida e água e para me ajudar por pura bondade, por simpatia. Sim, essa era a minha primeira ideia, mas não resultou lá muito bem...

Little AliceOnde histórias criam vida. Descubra agora