Manhã de esperança

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                  ~Pai de Alice~

Acordei muito cedo e abri a janela. Estava meio zonzo, sentia-me como se não tivesse dormido nada. A Virgínia também acordou passado um bocado e dirigiu-se à cozinha. Seguia-a e ajudei-a a preparar o pequeno-almoço: chá de camomila, café e um pouco de pão.

A comida não sabia a comida. Sabia a desespero. Sabia ao desespero de um pai ou de uma mãe que acabara de perder uma filha porque tinha ido jantar fora. Bebi o café e engoli o pão o mais rápido que pude.

Vesti uma roupa leve: uma t shirt e uns calções. A Virgínia fez o mesmo e desligou todas as luzes da casa, trancando a porta atrás dela e colocando a chave de casa no bolso de trás dos calções.

Estava um dia radiante. O sol brilhava no céu, espalhando a sua paz calorosa e queimando ligeiramente os meus olhos. Seguimos até à orla da floresta e trocámos um olhar de esperança e coragem.

Entrámos por fim no território no qual a Alice estaria perdida e decidimos separar-nos para podermos percorrer maior distância em busca dela. A Virgínia foi pela esquerda e eu pela direita.

Caminhei por entre árvores e mais árvores gritando pelo nome da minha filha e nada. Não havia sinais da minha filha.

Conhecia aquele bosque como a palma da minha mão. Antes de mim e da Virgínia, já viviam naquela casa os meus pais e os pais deles, por aí fora. Brincara ali no meio das árvores desde pequeno e vira muitas delas crescerem ao longo dos anos.

                       ~Virgínia~

Eu e o Paulo entrámos no bosque, olhámos um para o outro e separámo-nos. Não encontrei nada que se aproveitasse. Caminhei e caminhei às voltas. A certo ponto encontrei uma casa de madeira abandonada, mas nada da Alice, nem nada que me pudesse levar a ela.Já estava a entrar em desespero.

Depois chegou a polícia. Consegui ouvir o som dos carros em emergência através das copas das árvores. Voltei para trás até encontrar o Paulo e fomos os dois ter com eles.

Um agente de fato chegou perto de mim, perguntou-me se permitia que ele me interrogasse e eu disse que sim. O que eu não sabia é que teria de ir até à esquadra para responder a meia dúzia de perguntas.

Ele ligou o carro e abriu-me a porta de trás para entrar. O carro estava um pouco sujo e cheirava mal, mas era suportável. Durante a viagem falámos um pouco sobre a Alice e ele disse que lamentava. Agradeci e continuámos em silêncio até à cidade.

                         ~Paulo~

Estava a caminhar pela floresta quando senti algo mexer-se por detrás de uma das mil árvores que me rodeavam. Fiquei agitado. Seria a Alice? Olhei em redor com extrema atenção e fiquei com medo de ter sido apenas algo da minha cabeça.

Era apenas uma raposa. Uma raposa majestosa que andava por ali como se também estivesse à procura da Alice. Ela olhou para mim e fugiu na direção contrária àquela em que me encontrava. Suspirei.

Depois encontrei-me com a Virgínia e saímos dos bosques. A polícia tinha chegado e um agente de fato levou a minha mulher para a esquadra para interrogá-la. Ao ínicio não queria que ela fosse, estava desconfiado, mas era a polícia, o melhor era acartar com as suas ordens.

Um grupo de homens fardados entrou floresta a dentro e eu segui-os. Andámos nas buscas todo o dia e ninguém encontrara a minha filha. Começava a pensar que ela tinha sido levada pelos assaltantes e isso deixou-me extremamente incomodado. Tinha medo de que algo de mal lhe acontecesse.

Já estava a anoitecer quando saímos da floresta. Disseram-me que haviam procurado em todo o perímetro florestal até à estrada, no fim do bosque e que não tinham encontrado nada. No dia seguinte iriam atravessar até ao bosque do outro lado e recomeçariam as buscas lá.

"Senhor Paulo. A nossa equipa vai continuar com as buscas toda a noite, mas peço-lhe que deixe o trabalho para os profissionais. Sei que isto vai ser-lhe difícil, mas por favor vá para casa descansar, a polícia trata de encontrar a sua menina. Prometo-lhe"

A promessa daquele humilde homem quase me convenceu. Cheguei a entrar em casa e comi qualquer coisa, mas assim que pude peguei na lanterna e dirigi-me de volta aos bosques.

                       ~Virgínia~

A cidade parecia ainda maior quando se viajava no banco de trás. Chegámos à esquadra. Nunca tinha passado por aquela rua, porque na verdade nunca fomos uma família de passear pela cidade, preferíamos os bosques, a Natureza.

O edifício era alto, um dos mais altos da cidade e entrámos no elevador, que nos levou até ao segundo piso. Seguimos por um estreito corredor e entrámos numa porta que dizia "Gabinete 5". Aquele gabinete tinha um perfume que me abriu o apetite.

O senhor começou com as suas perguntas e fui respondendo atrapalhadamente, devido ao nervosismo, mas sempre dizendo a verdade. Quando acabámos ele pediu-me para esperar ali e, sem exageros, devo ter ficado cerca de meia hora sozinha naquele gabinete.

Observei tudo o que podia. Já tinha a imagem daquele gabinete ao promenor na minha cabeça, quando o homem entrou pela porta e disse-me para segui-lo. Assim o fiz. Subimos até ao quarto piso e fiquei entregue a uma rapariga um pouco mais nova que eu.

Ela contou-me a história do desaparecimento da Alice e confirmei tudo o que ela dissera. Nem mesmo a poderia contar melhor. Depois ela falou-me de algumas das teorias sobre onde estaria a Alice e o que lhe poderia ter acontecido.

Saí de lá um pouco mais animada porque muitas das teorias eram mais positivas do que tudo aquilo que eu pensara sobre este caso e o inspetor levou-me de volta a casa, ao anoitecer.

Quando cheguei a casa não estava ninguém. Onde estaria o Paulo? Fiquei extremamente preocupada. Já perdera uma filha, não iria perder o meu marido. Precisava dele mais do que nunca.

Little AliceOnde histórias criam vida. Descubra agora