03 - Olivia

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Para aonde ela foi? Me perguntei a certa altura, quando o ar da madrugada se tornou sufocante e meu corpo queimava em brasa. Para aonde ela foi depois que a deixei?

A ideia de deixar Grace me atormentou desde o momento que nossos olhares se cruzaram através do espelho daquele maldito trocador apertado. Seu rosto, tão belo e fácil de ser admirado, criou raízes tão profundas em meu ser que me dói a simples menção de esquece-la.

Deve ter voltado à Paris, respondo a mim mesma, para os braços franceses da calorosa Simone.

Não, Simone é hétero. Preciso lembrar. E tentar não gostar de Grace não mudará isso.

Em partes tenho razão. Ainda que eu me odeie por quebrar o coração de Grace Curie não posso inverter alguns fatos para tentar me sentir um pouco melhor. Eu sou a adúltera da história, Grace não esteve diretamente envolvida no meu processo de encantamento. Ela não me seduziu. Ela só estava ali, e eu me apaixonei. Tão leve, breve e natural.

E agora meus pensamentos me sufocam com o peso da minha decisão. Talvez eu não devesse ter escolhido Laurence, afinal.

Talvez eu ainda conseguisse ter uma noite de paz e tranquilidade se tivesse me divorciado de Laurence e revelado ao mundo minha verdadeira sexualidade. Mas antes tenho que descobrir qual é essa sexualidade. Eu sou realmente hétero e o que tive com Grace foi uma paixonite sem sentido? Ou eu sou bissexual? Muita gente se descobriu bissexual no seculo XXI. Talvez eu até seja lésbica e Laurence foi só uma ótima opção aos olhos da mídia para ofuscar minha sexualidade.

Olho para sua figura adormecida ao meu lado e suspiro. Tenho feito muito isso ultimamente. Fitar seu peito másculo se movendo e ouvir o calmo som da sua respiração preencher o vazio espaço do quarto. Não, eu realmente o amo.

Mas também amo Grace. E vê-la partir acabou comigo de uma maneira incompreensivelmente dolorosa. Em pouco tempo aquela garota francesa se tornou o meu mundo. Seu rosto suave e angelical era meu primeiro pensamento ao acordar e o ultimo antes de dormir. Nossos diálogos, toques e caricias ainda estavam meus sonhos e me faziam reviver tudo aquilo que já estava mais que gravado no meu subconsciente.

Agora, depois que escolhi deixa-la ir, nem dormir eu consigo. Sua presença é tão real e física que é como se ela estivesse aqui, dormindo ao meu lado, no lugar de Laurence.

Mas quando meus olhos se abrem no meio da escuridão, seu abraço confortável logo se transforma em um par de braços extremamente musculosos e sufocantes.

Exatamente como aconteceu ontem e nos dias antes deste.

Demoro uns segundos para deixar de vez a inconsciência. E quando o faço retiro lentamente o braço de Laurence do entorno da minha cintura e o repouso sobre seu próprio peito. Não acredito que outra vez adormeci entre um pensamento e outro sobre a francesa. E como em todas as outras vezes, meu sono não se permitiu evoluir de um breve cochilo e fui obrigada a continuar a encarar o lustre de cristal do quarto de infância de Laurence.

Os cristais começam a refletir todas as cores do arco iris no chão do quarto quando um fino feixe luz atravessou a janela vindo do sol que chegava do leste. Outra noite perdida em pensamentos confusos e sonhos sem nexo. Preciso conversar sobre isso com alguém. Mas quem?

Laurence? O que eu diria? "Amor, faz três semanas que não durmo porque não consigo parar de pensar na garota que amo." Ótimo. Receita para o fracasso.

Talvez eu deva contratar um terapeuta. Mas aí penso em quanto tempo levaria para ele sumir do mapa com a conta bancaria recheada depois de presentear todas as revistas de fofoca com o meu estrondoso caso.

BAZAAR // season 02Onde histórias criam vida. Descubra agora