Capítulo 9

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Bruxelas - Manhã da primeira apresentação

Eu mal pude dormir depois dos eventos dos últimos dias. Em meu colchão de ar, eu repousava (ou tentava) enquanto pensava o quanto minha vida havia mudado em todos os aspectos. Eu quase não podia pagar um café para mim mesma. 

Hoje, deixei tudo o que tinha (que já não era muito) com minha querida amiga Gabriela. Ela simplesmente não tinha para onde ir e eu precisava ser o famoso e famigerado "ombro amigo" do qual todo mundo comenta nas redes sociais com declarações mas nunca é capaz de faze-lo. Além do fato de que minha amiga pirada e maluca vai ser uma mãe e terá que ser responsável, eu ainda iria trabalhar para um dos maiores circos da Europa. 

Eu ouvi falar algumas vezes mas nunca fui referencia de atualidades com a cabeça voada que tinha. Eu podia jurar que não sabia qual era o atual presidente da França ou se meu amado país tinha de fato um presidente ou se ainda eramos uma monarquia (ainda que constitucional) como a doce Inglaterra dos meus pais. O fato é que eu trabalhava em um local que reunia artistas de primeira qualidade e eu realmente não saberia dizer se me encaixaria nas expectativas elevadas do público de de quem participava do circo. 

Eu era a novata e era julgada e analisada por isso. Um passo em vão e todos saberiam  desastre que foi contratar Adeline, a francesa desastrada e desempregada que não tem a menor capacidade de viver sozinha. Quem sabe, talvez, eu tenha me entregado. Esse tempo que passei longe de meus pais serviu para me colocar a prova e eu sequer lutei. Esse pode ser o motivo mais plausível para a minha derrota. Quando foi que eu me deixei ser nocauteada pela minha própria vida? Quando foi que a garota esforçada que em mim habitava na escola se desagarrou de mim? Por que sinto que perdi o rumo depois que tive que agir por conta própria? 

A vida é incerta e turbulenta. É como uma cenoura sendo cozida na panela de pressão, a água que participa de seu cozimento é tempestuosa e... por que eu estou falando de cenouras mesmo? Talvez seja a hora de descansar o que me resta antes que o circo todo esteja acordado e me atrapalhe de ensaiar meu número. E por falar nele... o que farei? Eu preciso de um repertório único, criado por fim. Afinal, esse é o Clair de Lune e o chefe não aceitará um serviço pela metade. Eu preciso ser autentica, e serei! 

Me levanto com rapidez e logo em seguida me sentindo profundamente arrependida por isso. Depois que Cézar foi embora de minha tenta ontem, bufando e falando alto, como se amaldiçoasse todas as gerações que proverão de mim, eu me despedi de Henzo e consegui uma garrafa de vinho com minha colega da tenda ao lado. Anotar na memória de devolver a ela a garrafa no horário da tarde. Mas talvez eu tenha exagerado e já não há mais conteúdo sequer na garrafa para devolver. Nem umas gotinhas para se observar. Estou de ressaca? Minha cabeça lateja e eu não tenho muita coisa disponível para alimentar o leão que ruge no meu estomago. A não ser, é claro, pelas besteirinhas de mercado que comprei e levei na mochila com Henzo quando fui fazer o teste. A mochila veio, e estava com chocolates e biscoitinhos. 

Como eu estava zerada de grana, resolvi não exagerar e peguei apenas uma barrinha de chocolate. Eu definitivamente precisava me alimentar melhor. Como uma atleta, era necessário que eu procurasse energia em alimentos saudáveis. Como eu não sabia direito o caminho do refeitório que montaram nas tendas de Bruxelas eu tinha que me contentar com minha fonte de energia abarrotada de açúcar. 

Há algo melhor para curar a ressaca do que chocolate e remédio para dor de cabeça? Não há e por sorte eu tinha quatro analgésicos. Anotar a compra de remédios quando tivermos o dia livre. E a lista só ficava mais extensa: O vinho de minha nova amiga do circo, remédio, um celular (deixei o meu com Gabriela), frutas e pagar o Milk Shake de Cézar. E o que tinha sido aquela viagem de carro com ele, afinal? Foi tão estranha e desconfortável. 

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