você tem um talento genuíno

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Estamos todos de bobeira no restaurante, esperando o momento em que abriremos e começaremos nossas atividades. O sol está forte hoje e eu acho que devo beber bastante água para não me sentir mal. Estou tentando evitar isso a todo custo.

Estou pensando sobre começar a fumar somente pela manhã, porque assim o cheiro não ficará emancipado pelo meu corpo com tamanha veemência pela noite quando, ocasionalmente, eu estiver com Ten. Não sei se ele gosta do cheiro do cigarro em mim, não sei se gosta do cheiro de café do meu hálito. Nem sei se sente alguma dessas coisas, ficamos tão distantes...

Mas conversamos demais... ah, como conversamos... Às vezes me recobro do nada acerca do horário e tenho que sair apressado, uma vez que me desligo total do horário limite da circulação de ônibus na cidade. É cansativo ter horário máximo para conversar com ele, porém vale a pena escutar sua risada todos os dias e descobrir um pedacinho dele a cada momento.

Observo, observo, observo. Me aproximo, me afasto. Como descrevi mesmo? Ah, sim... Flores, baunilha e mel. Sentir seu aroma de maneira ilegal faz parecer que não passa de um perfume caro numa vitrine chique, o qual ninguém nem sequer pode experimentar, apenas sentir ao acaso o exalo no ar. Triste, Ten. Isso é triste.

— Ei, ei! — um Ten apresado e afobado entra atrapalhado na porta dupla de entrada com o cabelo molhado e uma revista na mão. No canto dos seus lábios tem noz-moscada e um secador está sendo segurado por ele. Nem de óculos ele está, me surpreendo. — Atenção, atenção!

Todos estranham sua aparição repentina e mais "gente como a gente". Ninguém comenta nada, porém fica explícito que Chittaphon mal comeu e arrumou-se para dar essa notícia. Eu me desencosto do balcão e bocejo.

— Finalmente a crítica saiu!! — ele exclama tão entusiasmado que é impossível não sorrir também com ele. Está tão radiante!

Ten enfia o secador de qualquer jeito na sua mochila de ombro caramelo e ajeita-a direito para não cair. Ele solta dois gritinhos antes de chamar todos para se aproximarem e checarem a revista.

— Descoberta da semana... — alguém vai lendo. Eu não tiro os olhos de Ten. Ele está eufórico. — ... Hm... Wow, aqui diz: "digno de quatro estrelas"!

— Sim!! — Ten saltita de felicidade.

— "Digno de quatro estrelas"? — repito, com um sorriso nos lábios. Ten me olha feliz da vida e me envolve num abraço apertado.

Uau, eu não esperava por isso. Isso é sério? Tipo, sério de verdade? Eu estou mesmo sentindo seus bracinhos ao redor do meu pescoço? Ele está mesmo na ponta dos pés para chegarmos na mesma altura? Seu queixo macio está mesmo no meu ombro esquerdo? Ele está mesmo me sacudindo de um lado para o outro como se estivéssemos dançando sem sair do lugar? Sinto que minha morte está chegando. Zerei a vida e ainda vou ter um enfarto de alegria.

Nossos peitorais estão grudados e estou perguntando-me se, talvez, ele está sentindo um tum tum ba tum de um tambor cujo os cardiologistas costumam chamar de coração. Eu nem sei o que devo fazer agora. Devo me enlaçar no seu cheiro, mergulhando-me no doce aroma do teu pescoço? Devo afastar-me? Não, burrice. Vou cuidadosamente abraçá-lo pela cintura e apertá-lo só mais um pouquinho. Só preciso aproveitar isso... Só um tiquinho...

— Você não tem ideia do quão estou feliz! — ele se afasta logo quando sente meus braços ao redor do seu corpo. Impossível não me sentir machucado. Me reconforto convencendo a mim mesmo que não fora proposital, afinal Ten está energético demais.

— Você tem um talento genuíno — e eu não minto, de fato. É óbvio, isso é transparente, notório que chega me faz parecer um tapado aos meus próprios olhos ao dizer isso. É como se eu tivesse falado que um mais um é igual a dois.

café et cigarettes༶✎༶tae•tenOnde histórias criam vida. Descubra agora