Nunca pensei que viajar com Bella fosse tão calmo e até mesmo tranqüilizante. Essa manhã não tinha sido nada comum, pelo contrário, fugiu completamente à regra. Fomos à padaria, Bella fez o pedido para viagem enquanto meu corpo parecia estar grudado no banco do passageiro esperando impacientemente para irmos para São Paulo, eu não estava nem um pouco com fome, mas Bella foi a Bella de sempre, me obrigando fazer coisas que supostamente eram para o meu bem. Ela estava sempre certa.
Tomamos o café no carro, Bella dirigia olhando para todos os lados com uma mão no volante e a outra segurando um pão que ela estraçalhava brutalmente com os dentes vez ou outra, as vezes ela colocava o pão todo no boca para mudar a marcha.
- Bella isso é nojento, esse pão já ta todo babado.
Ela se virou em minha direção e sorriu com mais da metade de um pão na boca. Depois desses segundos olhando em minha direção eu achei arriscado comentar mais algo e ocasionar algum outro tipo de distração em relação à estrada. Eu foquei meus olhos em lugar nenhum olhando através da janela do Volvo, era estranho como me sentia entediada, eu passei toda minha vida procurando saber sobre meu pai e não passou pela minha mente, em nenhum momento, de perguntar a ele. Eu agia como se ele estivesse morto, o que era o oposto da minha mãe, que eu sempre imaginava viva, linda, com seu sorriso e sua forma descoordenada de ser, em alguma varanda, sentada em uma cadeira pintando a imagem de um lago à sua frente com a luz do sol refletindo nas águas e pássaros preguiçosos indo às vezes bebericar um pouco de água. Desde que perdi minha mãe, antes de dormir eu me lembro da canção que ela cantava para eu dormir e então eu repasso ela em mente até cair num sono profundo.
Bella ficou em silêncio todo o percurso e por mais que aquilo assustasse, foi um alívio a desistência de tentar trazer algum tipo de felicidade para mim naquele dia especificamente, agradeço aos céus seu mau humor matutino. Normalmente eu não me importaria com as tentativas de Bella, mas hoje não era um dia comum.
Nós chegamos na garagem do presídio e Bella desligou o carro e se ajeitou no banco, virando levemente em minha direção.
- Lia, eu gostaria muito que você voltasse comigo hoje ainda de uma maneira fácil. Teria como você não enlouquecer lá dentro, me forçando a matar algumas pessoas para te trazer de volta?
Eu olhei com os olhos arregalados e as bocas abertas em sinal de espanto para Bella como se ela estivesse falando algum absurdo e recebi um sorriso no canto de sua boca e uma levantada na sobrancelha declarando dúvida, estragando sua tentativa de um rosto descontraído.
Saímos da garagem em direção a prisão. O presídio de segurança máxima Readaptação Penitenciária de Presidente Bernardes foi construído para receber detentos especiais, enquadrados no recém-criado Regime Disciplinar Diferenciado por mau comportamento durante o cumprimento da pena ou por participação em facções criminosas. Esse regime objetiva uma detenção máxima por 180 dias, com o intuito de readaptar o preso para o cumprimento integral da pena em outra penitenciária, o período de reclusão pode ser estendido por um ano.
- O que ele aprontou para acabar aqui? – Bella resmungou perguntou para si mesma.
- O caso é muito semelhante com os dele, é óbvia a intenção de reclusão, ninguém quer um novo serial killer na ativa, ainda menos um com a reeducação mental que só meu pai pode oferecer. A possibilidade de termos uma cópia do meu pai solto por ai é muito provável, a ponto de não deixá-lo em contato com uma mosca se quer.
Bella se sentiu desconfortável alisando as mãos no jeans velho dela.
- Você é maior que uma mosca eu diria. – ela disse sorrindo torto.
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Batalha de Rainhas
General Fiction[ CONCLUÍDA] E lá estava ela, sem saber que sangue tinha circulando em suas veias, nem tão pouco em quem confiar. Ja há um tempo não muito distante, quase no presente, ela acreditava saber o significado da palavra ficção, ato ou efeito de fingir, s...