Botando Para Fora

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5.

A situação foi se tornando costumeira, digo até "resistível". Não que eu não ficasse assustada e sentisse uma sensação horrível com aquilo, mas, como nenhuma de minhas tentativas contra funcionavam, só me restou aceitação.

As férias de julho estavam chegando, e eu literalmente contava os dias fiscalizando o calendário da porta da geladeira afim de que ele fizesse os dias voarem. Não pensava em brincadeiras, dormir até tarde ou se empanturrar de doce até não aguentar mais, diferente das outras crianças, as férias me eram interessantes porque eu teria uma desculpa para não sair de casa.

Meu interesse pelas aulas estava em queda, tornou-se menor do que já era. Em casa, TV, rádio, tudo parecia chato e as conversas do grupinho não me prendiam mais como antes. Luiz foi o único que teve coragem de perguntar o que estava acontecendo comigo, e, por um momento, pensei em contar-lhe tudo, por mais louco que podia parecer, não importava. Só queria falar com alguém, mas o maldito sinal da escola tocou, ele me disse virando os olhos e segurando a testa com a mão, que tinha de ir logo, pois precisava organizar ainda naquele dia (quinta-feira) a mala que levaria para passar as férias na casa dos avós. Espremi um ruído baixo de minha boca que era para ser um "tudo bem", enquanto ele saia. Não sei se ele me ouviu. Exalava pressa, tive dúvidas se ele estava animado ou aborrecido.

Fiquei um tempo na sala, esperei até que todos já tivessem ido antes de me levantar. Fui sem pressa, sem vontade, sem ninguém. Caminhei na avenida só. O azul não me trouxe paz, pelo contrário. Entre um passo e outro, odiei meus pais. Na minha cabeça, era culpa deles. Culpava-os pela mudança, culpava-os por me fazerem ir a pé, culpava-os por não me ouvirem nunca, culpava-os.

Quando cheguei ao local maldito, toquei as grades e procurei. Como não sabia o que procurar nada achei, só tive mais uma visão daquela casa malcuidada, de pinturas desgastadas, madeiras enegrecidas e um gramado seco e amarelado em volta. Parecia que a vida abandonara há tempos aquele lugar.

Senti náuseas, um cheiro de mofo e podridão me atingiu. O mundo girou ao meu redor e me derrubou. Ainda zonza, lembro-me de ouvir alguém e de um aperto no meu abdômen. Não lembro quanto tempo fiquei ali, mas quando voltei à razão, acordei num espasmo, fui incapaz de controlar a respiração, minha barriga queimava de acidez e minha mente era caos. Corri para casa e fui direto ao banheiro. Permaneci lá até mesmo depois de ter me desfeito de tudo que estava em meu estômago.

Aquilo era real.

O Mistério da Estranha Residência SilvaOnde histórias criam vida. Descubra agora