Capítulo V - Paranóia

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Depois de um tempo os braços de Jhonatan me envolveram e eu soube que ele tinha voltado a si. Ele chorava silenciosamente diferente do meu desespero no avião. Encaixei o queixo na curva de seu pescoço e deixei que ele fizesse o mesmo em mim.

Ele tinha um cheiro delicioso de sândalo, mas afastei o pensamento na hora focando em ampará-lo e não tirar proveito.

Depois de um tempo me afastei dele e segurei seu rosto entre minhas mãos.

- Você está melhor? - perguntei tirando os fios negros de sua face.

A ponta do  nariz e os olhos estavam avermelhados. Toda a postura confiante e desinibida parecia ter se esvaído e não era pra menos.

Você está lanchando e de repente aparece que seu melhor amigo de infância foi morto de forma brutal e arrancado o fígado? E ficar sabendo disso pela TV? Isso era avalassador.

- Eu... me desculpe ter desabado - passou as duas mãos no rosto demorando-as acima dos olhos antes de as abaixar.

- Ei não tem que me pedir desculpas, de forma alguma - o encarei - Você não tinha que ter fingido que estava bem. Ninguém tem. Qualquer um aqui no seu lugar teria feito o mesmo.

O garçom trouxe um copo com água e passei pra Jhonatan. Ele bebeu aos poucos desfocando o olhar no piso algumas vezes.

- Você quer companhia pra algum lugar? Posso ir com você até sua casa depois sigo pra minha. - atraí sua atenção.

- Eu vou falar com a legista. Preciso saber o que aconteceu com Dave de verdade. Tenho que ligar pra tia Margareth também, é a mãe dele. Vou aceitar a companhia. - sorriu entristecido ao aceitar minha oferta.

- Deixa que eu pago a conta - estava tirando o dinheiro da carteira quando ele sacou a dele.

- Não mesmo, meio a meio.

Nós saímos de lá e fomos pro local da perícia. Durante todo o trajeto Jhonny permaneceu calado encostado na janela do ônibus. Eu mandei mensagem pra Dandara dizendo que ia chegar mais tarde, mas que chegava ainda hoje.

Não tinha muito o que ver no local da perícia com suas paredes cinzentas e brancas. Assim que chegamos fomos recebidos pela médica responsável.

- Vocês vieram reconhecer o corpo? - a mulher baixinha de cabelos curtos e castanhos perguntou.

- Isso. Eu sou irmão de consideração de Dave e tia Margareth não tinha condições emocionais de vir fazer isso. Ele era filho único.

- Certo, me acompanhem - seguimos ela pelo corredor até a sala específica. - espero que tenham estômago - descobriu o cadáver.

Eu até poderia ter ânsia de vômito se não tivesse pesadelos em que me encontrava numa piscina de sangue e fluídos lotados de órgãos e vísceras.

O corpo de Dave estava em um estado deplorável e repugnante. A pele já ia perdendo toda a coloração rosada que era própria, como um filete de água que vai se afunilando aos poucos até acabar.

- Ele teve a carne dilacerada por algo afiado, mas não foram dentes nem facas. Também não parece com nenhum tipo de garra animal. O que mais assusta é que apenas o fígado está faltando.

- O fígado? - repeti - mais nada?

- Nada. Tudo no lugar. O corte no pescoço diz que ele sangrou muito antes de morrer, mas isso foi antes do dilaceramento então estamos lidando com um possível assassino ou assassina. Talvez um terrorista.

- Então a morte dele foi lenta e dolorosa... - a voz de Jhonatan saiu com uma dor profunda.

- Infelizmente sim. A polícia não descarta a existência de um serial killer, mas é preciso esperar pra saber se haverão mais mortes do gênero.

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