3 - Boys just wanna have fun

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Risinhos bobos e extremamente forçados interrompem meus pensamentos mais uma vez. Suspiro um pouco alto demais para que alguma das admiradoras do barista perceba que não estão sendo nada sutis e, de quebra, me atrapalhando, mas pelo visto sou a mulher invisível. Risco o caderno com força, deixando uma grande mancha azul sobre um dos itens na lista de reposição do estoque. Quem precisa de café colombiano em uma cafeteria? Alain com certeza não, já que apenas a sua presença é capaz de atrair clientes.

Com o canto do olho, eu o vejo está debruçado sobre o balcão, concentrado na xícara de café enquanto faz um desenho com uma pequena vara de metal. Já as duas mulheres estão bem próximas dele como se não existisse um grande cristaleira os separando. Aposto que se elas fizerem um pouco mais de força, o vidro se quebrará em pedacinhos.   

— Uau. Isso parece ser tão difícil. — Qualquer um que escutasse essa voz tão manhosa diria que pertence a alguma adolescente ou, pior,  a uma criancinha dengosa. Mas o decote da blusa da ruiva não deixa dúvidas de que ela é uma mulher bem crescidinha, o que torna toda essa atuação ainda mais ridícula.

Não é a primeira vez que as vejo por aqui, assim como tenho certeza de que não será a última. 

A cafeteria costuma ser o point de alguns universitários que frequentam a faculdade a uma quadra daqui. O mesmo centro universitário que eu, Selena e MaLu frequentamos, já Alain fez questão de trancar um curso de administração e nunca mais voltou. Entre os muitos clientes que recebemos de lá, há um tipo que chamo carinhosamente de as sem noção

Sem noção de pagar mico, sem noção do ridículo, sem noção de vergonha na cara.

Alain finalmente termina o seu desenho na xícara e a entrega para a ruiva, que por um breve instante parece realmente admirar a arte.

— Suas mãos são talentosas assim mesmo? — O olhar lascivo dos olhos castanhos não deixa dúvidas para a sua insinuação. Reviro os olhos ao ouvir o flerte mais famoso por aqui. Será que nenhuma delas tem alguma cantada original? 

— Elas têm muitos talentos. — Ele nos surpreende aos flertar de volta com um sorriso galanteador. Em todo esse tempo, eu nunca o vira responder a uma de suas admiradoras no horário de trabalho. Ele se aproxima ainda mais da mulher, que parece extremamente satisfeita consigo mesma por ter conseguido a atenção dele. — Sou tatuador no estúdio lá do shopping. Se você der uma passada lá, posso te mostrar os meus desenhos. 

Um sentimento desconhecido embrulha meu coração e volto minha atenção para o pequeno caderno na minha frente. Isso seria desgosto? Decepção? Ciúme? Não. Não, não. Eu não tenho por que me sentir decepcionada por vê-lo flertar descaradamente, sei bem que Alain não é nenhum celibatário. Mesmo assim, eu me recuso a ser plateia desse show. 

Finalmente, as duas vão se sentar em um canto de onde dá para ver o bar sem qualquer esforço. Eu já estava ficando preocupada com a pobre cristaleira. Alain, por sua vez, parece ignorar suas admiradoras, que, mesmo de longe, ainda lhe lançam alguns olhares nada disfarçados.

— Aposto que você adorou a atenção — eu o provoco, me aproximando enquanto ele lava algumas xícaras em uma pequena pia no canto da enorme máquina de café. 

— É bom ser admirado para variar. — Alain dá de ombros como se fosse uma raridade ter mulheres na sua cola. — Mas eu prefiro as morenas.

Ha! Que dó da ruiva!

— Ela não se deu conta de que estava sendo tão óbvia? — murmuro e me viro de costas para que as duas não percebam que estou falando delas. — Pelo menos as outras disfarçam melhor.

Amor à segunda vistaOnde histórias criam vida. Descubra agora