Capítulo 4 - Who are you?

168 24 26
                                    

       Quando Lauren chegou em casa aquela noite, tudo que conseguiu fazer fora entrar debaixo do chuveiro frio e pensar. Sua cabeça parecia estourar de dor e por dentro ela estava apavorada. Parecia surreal tudo aquilo estar acontecendo. Parte de sua mente dizia que ela estava cansada demais. Cansada o suficiente para ter visto uma garotinha que não existia. No entanto, ela sabia que uma estafa seria uma saída fácil demais para explicar o que estava acontecendo. 

      Ela era médium. Sabia disso desde criança. Estudou por muito tempo, mas quando começou a estudar medicina mal sobrava tempo de respirar. Entre um trabalho como garçonete a noite, e a faculdade em dois turnos, ela precisava sacrificar alguma coisa e acabou sacrificando sua vida religiosa. Não que ela sempre tivesse sido, mas o espiritismo era diferente. Era uma religião raciocinada, que aceitava que a ciência e a filosofia eram parte da vida humana e uma parte importante da religião. Lauren nunca conseguiu acreditar cegamente, não sem realmente entender as coisas. E aquela doutrina a proporcionava isso. A proporcionava o questionamento, o estudo, o entendimento. E quando descobriu seu tipo de mediunidade tudo parecia encaixar-se em sua mente. As coisas que via quando criança, os diversos amigos imaginários. 

       A bronca que sua mãe, que até então não era espírita, lhe deu no velório do seu avô quando ela tinha dez anos. Lauren o estava vendo lá, de pé, em frente ao seu túmulo. Ela via a desorientação dele, então tentou ajudá-lo. Tentou explicar que ele estava morto, mas esqueceu que todo velório havia simplesmente parado para assistir a interação de uma criança com o nada. Alguns convidados ficaram com uma imensa pena de seu ser infantil, outros ficaram realmente chocados. Sua mãe, no entanto, passou por todas essas fases em um curto espaço de segundos. Primeiro a pena por ver sua filha sofrendo, depois o choque quando Lauren simplesmente não ouvira seus pedidos para que se calasse, até a raiva que a fez gritar com sua filha. O ceticismo e a vergonha diante dos convidados a fizeram cometer esse erro. Um erro que qualquer um poderia cometer. Porque não? Diante de nossas fraquezas e paixões, deixamos o orgulho, a vergonha e o medo do desconhecido comandar nossa mente. E, na maioria das vezes, essa combinação nos leva ao erro. O erro da ignorância pura e simples. 

       A água batia na nuca de Lauren enquanto ela lembrava aquele episódio. Sua mãe a colocou de castigo depois de lhe dar umas boas palmadas. Ela chorou de dor, de raiva por não entender o que havia feito de errado. Seu avô estava lá e não havia nada de errado em ajudá-lo. Ela tentou explicar-se para mãe algumas vezes, mas os gritos fizeram-a se calar até que nunca mais tocou no assunto. Em segredo conversou ainda muitas noites com o avô. Ele aparecia sempre na cozinha e abria a geladeira. Ele adorava tomar leite de madrugada e em quase todas elas Lauren o via na cozinha. Até que um dia ele se despediu. Disse que havia finalmente entendido que havia morrido. Lauren não soube para onde ele foi, mas nunca mais o vira. Ela não sabia rezar, mas sempre antes de dormir pedia a Deus que cuidasse dele. 

     A maioria das pessoas não acreditava em espíritos. E por isso, acreditava que quando ficasse mais velha pararia de ver aquelas pessoas mortas em todo lugar. Mas não parou. Alguns eram benevolentes e outros nem tanto. Alguns faziam barulho e ela teve realmente medo por muito tempo. Não podia falar com sua mãe a respeito. Sua melhor amiga era evangélica e não era muito adepta a esse tipo de assunto. Então o silêncio fora o melhor amigo de Lauren. Ela não entendia porque era a única a ver e não sabia o que fazer a respeito. Começou a pedir que a deixassem em paz e por um tempo parou de ver os espíritos. Mas um dia, vira seu avô novamente. Ele estava com uma veste branca e disse a ela que não podia negar sua mediunidade. Fora a primeira vez que a palavra médium foi dita a ela. E acredite, por alguém, que aos olhos da maioria das pessoas nem vivo estava. 

     A vida não cessa, no entanto. Ela permanece mesmo após a morte. A morte não é fim, mas sim apenas mais um capítulo na eternidade do espírito. Uma vida é um capítulo e quando você chega ao final dele, não chega ao final do livro. 

Radio ParadiseOnde histórias criam vida. Descubra agora