Um

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O pôr do sol estava lindo em Havana naquela tarde de outono. Tudo era mais alegre naquela cidade ao cair do dia. Ao fundo podia se escutar a música e pessoas dançando. Respirei fundo levando todo aquele aroma da cidade para meus pulmões e apoiei meus braços em meu Fusca amarelo, fechando os olhos por alguns segundos enquanto tentava memorizar o cheiro daquele lugar. O mar a minha frente estava calmo, tudo estava calmo, até que o som ensurdecedor e repetitivo de uma buzina fez com que meus olhos abrissem na mesma hora e pulasse na cama. Era o meu despertador. Passei a mão por meu rosto rapidamente a levando até o celular logo em seguida, desligando aquele barulho. Olhei para os lados respirando fundo e constatando que eu estava em meu quarto e não na ensolarada Havana. Ai que saudade,  foi a primeira coisa que veio na minha mente naquele manhã.

Me levantei com certo desânimo e fui até o banheiro fazer a minha higiene matinal e me arrumar para o trabalho. Ser uma garçonete em tempo integral estava acabando comigo e eu basicamente não tinha vontade de fazer nada quando chegava em casa. Minha tia Elena sempre tentava me levar pra sair mas isso era algo que eu não fazia desde a minha formatura há quase dois anos atrás.

Sempre sonhei em estudar medicina, porém nunca tive condições de bancar a faculdade. Todo ano eu tentava entrar na universidade, mas sempre surgia algum imprevisto que me fazia usar todo o dinheiro que tinha guardado. Esse ano não seria diferente. A casa onde moramos é alugada e o proprietário está pedindo ela de volta, portanto temos que procurar outro lugar pra viver o mais rápido possível.

Terminei de fazer minha maquiagem, coisa que era exigida pelo dono da lanchonete onde eu trabalhava, e saí do banheiro indo até a cozinha, onde vi minha tia terminando de preparar o café da manhã.

Tia, eu já disse que não precisa se preocupar com meu café — disse me aproximando dela e deixando um beijo em sua bochecha. Ela soltou um riso baixo e me olhou rapidamente enquanto colocava a panqueca no prato e o estendendo pra mim.

Você sabe que eu me preocupo com a sua alimentação e eu sei que quando você deixa pra tomar café no trabalho acaba não comendo nada — ela disse me entregando uma caneca com café. Sorri ouvindo aquelas palavras e apenas concordei com a cabeça me sentando logo em seguida.

A senhora me conhece melhor do que ninguém mesmo — falo inalando rapidamente o aroma do café antes de tomar um gole do mesmo, respiro fundo lançando um olhar pra minha tia comendo um pedaço da panqueca em seguida. — Achei um apartamento ontem a noite, vou sair mais cedo do serviço para ir conversar com o proprietário. — disse antes de dar mais um gole no meu café e me levanto, indo até minha tia e parando a sua frente. Ela suspirou e negou com a cabeça voltando seu olhar para meu rosto.

Não quero que faça isso Mila... São suas economias para a faculdade, podemos nos virar com apenas meu salário — disse a mais velha com seu sotaque um pouco enrolado. Ri baixo levando minha mão até seu rosto e deixando um beijo em sua testa.

Não se preocupe com isso, está tudo bem — disse com a voz calma antes de sair da cozinha indo até a sala pegar minha bolsa. Volto para a cozinha e encontro minha tia no mesmo lugar me encarando com os braços cruzados em frente ao seu peito. — Tenho que ir, estou atrasada. Volte a dormir ok?! Te amo — disse mandando um beijo para a mulher que concordou com a cabeça e murmurou um Vai com Deus em espanhol para mim.

O caminho até a lanchonete era bastante calmo, apesar de longe, principalmente por ser de madrugada ainda. Meu turno começava as 6:30 e para eu estar lá nesse horário tinha que sair 5:30 de casa. Liguei o rádio para ouvir algumas notícias locais e me lembrei que o mesmo não estava funcionando. Droga, pensei apertando meus dedos no volante enquanto suspirava. Mais um pouquinho do meu dinheirinho indo embora.

SeñoritaOnde histórias criam vida. Descubra agora