Calma, gatinha

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  Quando finalmente voltei pro quarto, já eram 5 da manhã. Não teria muito mais tempo de sono, então tomo um café e coloco corretivo no rosto para disfarçar minha cara de cansada. Espero que Manuela tenha descansado. 

  O jogo é de tarde, mas nós jornalistas não paramos nunca. Passei a manhã inteira cobrindo a rotina de alguns funcionários da CBF. Quando volto para o quarto, por volta de meio dia, só tenho tempo de colocar a roupa do jogo antes do meu celular tocar (sim, o truque do arroz funciona mesmo).

  Atendo, e mal posso acreditar. Minha chefe tinha dito que conseguiu um lugar para mim dentro do ônibus das jogadoras! Eu nem sabia que isso era possível. 

  Termino de me arrumar, e vou até o pavilhão no horário marcado. Entro no ônibus e vejo algumas jogadoras, e membros da equipe técnica. Me junto a outros dois repórteres sentados em um dos primeiros bancos, mas não vejo sinal de Jade ou Lia. 

  - Prazer, Helena. - disse a um dos jornalistas. Não deixo de notar o símbolo de uma emissora em sua camisa.

  - Marcelo, prazer. - ele estende a mão e me cumprimenta. O colega faz o mesmo. 

  - Meu nome é Lucas - também vejo o símbolo de outra emissora MUITO grande e poderosa - você não é muito nova para ser jornalista? - diz, olhando meu credencial de imprensa.

  Explico onde eu trabalho e minha situação para eles, que não conseguem esconder o deboche. Tenho que fazer alguma coisa, senão vão me tratar como criança pelo resto do jogo. 

  - Eu sei que sou muito nova, e não trabalho para uma grande emissora, mas se fui escolhida para estar aqui é por um motivo. Respeito vocês, e gostaria que fizessem o mesmo. 

  - Não precisa ficar brava, gatinha. - diz Lucas, pegando no meu queixo, rindo.

  Pude sentir meu sangue ferver. Minha vontade era falar umas poucas e boas para os dois. E eu ia, se um par de mão não tivessem apertado meus ombros. 

  -  Você é Helena, não é? - disse uma voz familiar.

  Vejo os olhos dos meu dois colegas arregalarem. Viro para ver quem é e dou de cara com Bárbara, goleira da seleção. Em pé, no corredor do ônibus. Falando comigo. Provavelmente viu toda a cena com os babacas. 

  - s-s-sim, eu mesma. 

  Ela abre um sorriso.

  - O que você acha de sentar com a gente no fundo do ônibus? 

  Só não caí morta porque não era minha hora de morrer.

   -  Tem certeza? Não quero atrapalhar, e...

  - Deixa de besteira - diz ela - Tenho certeza que as meninas não vão se importar. 

  Pego minhas coisas e levanto. Antes de acompanhar a goleira pelo corredor, me viro para os meus colegas:

  - Não precisam ficar bravos - digo séria, e depois abro um sorriso debochado - gatinhos.

  Reviro os olhos e saio rindo. Foi a atitude mais profissional da minha parte? Definitivamente não. Me arrependo? Também não. Alguém precisava ensinar aqueles convencidos uma lição. 

  Me sentei em uma fileira só para mim, na frente das meninas. Com o celular a postos, pronta para gravar tudo. A seleção era bem conhecida pela sua animação pré-jogo. 

  Meio que ninguém me deu atenção, mas já esperava isso. E sou eternamente grata à Bárbara por ter me salvado daqueles abutres. 

  No final, tinha várias imagens exclusivas da farra delas no ônibus. Muitas músicas, e muito samba. Ia ficar ótimo na minha matéria final! E o jogo nem tinha começado. 

***

  No campo, me encontrei com Lia e Jade. Elas pareciam surpresas em me ver.

  - Achamos que você tinha dormido demais. - explicou Lia.

  -  E nem pensaram em bater na porta do meu quarto? Ou me ligar? - pergunto. 

  Jade revira os olhos. 

  - Aqui é cada um por si, gata. - diz, e eu só deixo escapar um suspiro de preguiça.

  Essa profissão é lotada de gente falsa. Anoto mentalmente para tomar mais cuidado. 

  - Enfim, como conseguiu chegar aqui? 

  Abro um sorrisinho. 

  - Vim no ônibus.

  Pude ver o queixo das duas caindo. Lia, que a essa altura já estava vermelha, sai de perto de mim, seguida por uma Jade bem irritada. Dou de ombros.

  O espaço reservado a imprensa fica no campo mesmo. Ao lado de onde fica a equipe técnica de ambos os times, há uma parte do gramado destinado a jornalistas como eu. Não vejo sinal de nenhum dos dois patetas do ônibus.

  Sento no gramado, e começo a preparar minhas coisas. Não me ache louca, muita gente estava fazendo o mesmo.

  Encaixo lentes especiais no meu celular, para melhorar a qualidade das fotos. Há fotógrafos aqui especializados nisso, mas não custa tentar né. Preparo meu caderninho, e deixo tudo em mãos caso precise.

  Faço algumas anotações enquanto as jogadoras estão em aquecimento, mas nada muito útil. Elas voltam para o vestiário, ficam prontas e voltam ao campo. Os hinos tocam, e a partida tem início. 

***

  oii gente, como vcs estão?

  tentei att ontem, mas a internet aqui de casa tava péssima. antes tarde do que nunca né?

  espero que tenham gostado, talvez saia outro ainda hj...

 não esqueça de votar!

  

The Journalist - Manuela GiuglianoOnde histórias criam vida. Descubra agora