A entrevista

348 25 2
                                    

  O universo deve amar me foder. 

  Lá estava ela, no elevador, concentrada em algo no celular. Ela levanta a cabeça e me vê, dando um sorriso. Dou um sorriso envergonhado, e entro no elevador, parando do lado dela, sem ter coragem de olhar. Manuela guarda o celular no bolso e deixa as mãos ali.

  - Então - ela arranha a garganta, rindo, ainda olhando para frente - quando tempo demorou para você descobrir quem eu sou? - ela brinca, claramente tirando uma com a minha cara.

  - Mil desculpas - falo, num tom mais alto que o normal. Olho para ela, que não consegue parar de rir. Acabo rindo também.

  Ela se encosta no fundo do elevador.

  - Não, tudo bem. Cada momento foi engraçadíssimo. - ela olha para os papéis na minha mão - Dia cheio?

  Faço que sim.

  - Consegui fazer uma entrevista. Com a Cristiane. - ela parece admirada - Foi muito boa, mas acabei gastando muito tempo, precisava de mais entrevistas. Mas amanhã no coquetel posso compensar de alguma forma e...

  - Posso te ajudar com isso. - ela me interrompe.

  - O que disse? - pergunto, sem acreditar no que ela está sugerindo.  

  - É, posso te ajudar se quiser, é claro. - mal posso acreditar - Ou me entrevistar não gera conteúdo suficiente? -  ela diz, brincando, e sorri.

  Não sei o que essa mulher tem que mexeu comigo. Estava tentada a recusar, mas ao mesmo tempo não podia dizer não.

  - Tá brincando? - digo - Vai ser mais do que suficiente! 

  Nesse momento, a porta do elevador se abre. Não é o meu andar, é o dela.

  -  Então venha. - ela diz, segurando a porta do elevador para eu passar. 

  A sigo pelos corredores, imaginando que iremos para um lugar parecido com aquele onde entrevistei Cristiane. Quando Manuela começa a destrancar a porta do quarto, surto internamente, mas não falo nada.

  Ela me convida para entrar, e peço licença. O quarto é igual ao meu, e consigo ver algumas das coisas dela. Alguns tênis, a mala, alguns livros ao lado da cama. Entrei num espaço muito pessoal, e me sinto meio desconfortável.

  - Fica a vontade, ok? - ela tira o casaco e joga em cima da cama. Ela se veste muito bem. Uma camiseta de botão, calças pretas e tênis igualmente pretos. Enquanto me sento em uma poltrona, ela pega duas latas de cerveja e coloca numa mesinha, e depois senta na cama. 

  Tiro pensamentos impróprios da minha cabeça e me concentro na entrevista. Ligo o gravador de Lia, e começo perguntando coisas mais genéricas sobre futebol, para aquecer. É uma coisa que fazemos antes de perguntar coisas mais "valiosas". Tinha algumas perguntas em mente, mas não tenho certeza se eram valiosas para a entrevista ou para mim mesmo. 

  Em determinado momento, vejo que ela começa a relaxar. Não sei se pelo álcool ou pela minha técnica, mas ela já tinha desabotoado o primeiro botão da camiseta e tirado os sapatos. Tava na hora.

  - Eu sei o que você tá fazendo - ela diz, antes que eu pudesse perguntar qualquer coisa.

  - Perdão?

  - Você me disse que é repórter de comportamento, e até agora só me perguntou coisas relacionadas a futebol. Cadê as perguntas de verdade? - ela não está bêbada, apenas mais... solta.

  - Você tá tentando me dizer como fazer o meu trabalho? - digo, fingindo ofensa.

  Ela ri, e dá um gole na cerveja.

  - Estou mentindo? - pergunta.

  Não, não está. Suspiro, e começo a rir.

  - É que são coisas muito pessoais, me sinto uma jornalista barata. - ela ri da minha comparação. Solta a cerveja e apoia os cotovelos nas coxas, unindo as mãos.

  - Vamos fazer o seguinte: a cada pergunta que você me faz, eu tenho direito a uma pergunta também. Ah, e eu começo perguntando, para ter certeza que não vou ser enganada.

  - Tudo bem, parece razoável. Pode começar.

  Ela pensa por um instante. 

  - Solteira? - pergunta.

  - Já começa assim? - rio, e ela me encara como se pedisse para eu parar de enrolar. Suspiro. - sim.

  Ela não expressa reação, apenas toma mais um gole da cerveja. 

  - Ok, minha vez. Como você e sua namorada conseguem conciliar o relacionamento, com você viajando o tempo todo? - bem direta, eu sei. Mas tentei pelo menos fingir que estava fazendo isso pela entrevista.

  Ela hesita por um instante.

  - Não é mais minha namorada.

  Porra, Helena.

  Antes que eu pudesse falar algo, ela faz outra pergunta. 

  - Você tem cara de hétero, mas eu não acho que seja. 

  Concordo.

  - Você está certíssima. - tomo mais um gole da cerveja - Sou do vale sim.

  Ela sorri.

  - Sabia! Meu gaydar é impecável. Bi? Assumida? - pergunta, animada.

  - Ei, é minha vez de perguntar! - falo.

  Ela ergue a mão em rendição, rindo. Decido responder.

  - Mas dessa vez você errou. Sapatão assumida. - paro um pouco, e penso na minha pergunta. Já não estava mais ligando para a entrevista, ou para nada. Só queria uma coisa. Termino minha cerveja, e pergunto - Interessada em alguém no momento?

  Manuela abre um sorriso malicioso e se levanta. Vai até o frigobar pegar mais uma cerveja, estende a lata para mim. Quando tento pegar, ela me puxa pela mão, me deixando em pé, com o rosto a pouco centímetros dela.

  - Sim - ela olha para meus lábios e depois volta o olhar para meus olhos - você?


***

  Opa, opa, opa, parece que as duas tão com fogo hein... será que a pegação vai acontecer, ou alguma coisa vai atrapalhar? Só lendo para saber rs

  Não se esqueçam de votar!


  

The Journalist - Manuela GiuglianoOnde histórias criam vida. Descubra agora