Zoe estava feliz.
Não, ela estava maravilhada.
Não, estava exultante, irradiando alegria por cada poro.
As malas estavam prontas. Passaportes ok. Ela, seu pai e tia Vivian partiriam para a Grécia amanhã perto da hora do almoço. Sairiam cedinho para chegarem no aeroporto com tempo de folga, e ficariam ali até a hora do embarque.
Finalmente seu pai conseguiu juntar o dinheiro da viagem. Dois anos atrás, quando sua doença quase voltou, ele havia acabado de começar uma poupança para realizar o sonho dela e, depois do beijo de quase cura de Morten, a doença estava adormecida novamente, então seu pai havia conseguido juntar a quantia necessária e eles iriam comemorar o décimo quinto aniversário de Zoe naqueles mares azuis e paradisíacos.
Querido Morten,
Meu aniversário está chegando. Cada ano que passa eu devo a você. Desde criança, desde que descobri que meu organismo era falho e doente, eu nunca me permiti imaginar como seria meu rosto na adolescência. Como eu seria em minha fase adulta. Hoje eu sei que minhas maçãs do rosto são altas e rosadas. Sei que minha sobrancelha é escura e arqueada. Sei que estou tão alta quanto papai. Eu vi meu corpo mudar. E pude fazê-lo graças a você. Não sei quanto tempo ainda me resta, mas eu agradeço o tempo que tive. Hoje, mais do que naquela noite no hospital, a noite que nossa história começou, eu sei o valor do presente que você me deu. Então, eu agradeço por cada dia, cada hora, cada minuto e segundo que você me deu. Agradeço pelos momentos que passei com você. Obrigada.
Com carinho e gratidão, Zoe.
Ela furou seu dedo e pingou a gota de sangue no final, abaixo de seu nome. Dobrou o papel cuidadosamente e o colocou no envelope cor de rosa que ela selou com uma fita adesiva cintilante com estrelinhas. E esperou, sentada em sua escrivaninha.
-- Ainda acha que quando os mortais morrem eles viram estrelas?
A voz de Morten soa atrás dela, próxima ao seu ouvido lhe causando deliciosos arrepios. Há alguns meses que o sexo oposto estava despertando nela demasiada atração. Mas ninguém que conhecia lhe causava as sensações que ele causava.
-- Na verdade, Morten, eu não tenho certeza sobre nada nessa questão, há muitas possibilidades. Mas a idéia de que viramos estrelas é muito bonita, não acha? -- ela diz, sem se virar para ele.
-- Sim, Zoe, sem dúvidas. -- ele responde de um jeito que ela sabe que ele a está observando.
Ela sente seu rosto queimar, seu coração acelerar.
-- Se fosse assim, se virássemos estrelas, olharia para mim no céu? -- ela pergunta levantando-se, cravando seus olhos nos dele.
A sombra de algum sentimento passa ali, algo que pela pouca idade e experiência ela não sabe interpretar.
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Cartas à Morte
ContoSentem-se confortavelmente para ouvir essa história. A história da morte. A história da vida. Zoe tem oito anos e luta contra a leucemia há alguns meses. Seu tempo está quase acabando quando conhece a morte pessoalmente. Morten, o ceifado...