XIII

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DIEGO, PARA!

A ordem de Luanna não fazia mais sentido: nós já estávamos onde eu pretendia, parados em meio às mesas de pedra cercadas por árvores. Diferente dos outros cantos do colégio, eu estivera ali poucas vezes, todas elas em busca de JP. Para um amante dos silêncios como ele, era um local perfeito. Isolado das piscinas por uma cerca viva de um metro e meio e envolto pelas árvores, o jardim fora um projeto dos primeiros anos da escola, no início do século XX, quando ainda era um seminário. Longe dos outros ambientes, o jardim era um convite ao silêncio reflexivo que as paredes de concreto e o assoalho de madeira não conseguiam fornecer. Com suas mesas de pedra, folhas despencando dos galhos e o característico cheiro de terra e mato, entrar ali era como cair em um mundo primitivo.

— Diego... o que a gente faz aqui?

— Lembra que o JP só vivia nesse jardim? Que sempre que sumia ele vinha pra cá?

— Sim, e o que tem isso agora?

— Ele escrevia nessas pedras, Lu...

— Escrevia? Escrevia o quê?

— Mensagens... Que nem a gente escrevia nas carteiras, lembra? Nas paredes dos banheiros?

Na expressão que Luanna lançou sobre mim eu vi um quê de preocupação com a minha sanidade. Ela passou a mão pela testa e buscou calma. Como quem explica algo a uma criança, perguntou.

— Di, o que você está fazendo? Você acha mesmo que quase vinte anos depois (vinte anos, Diego!) ainda tem alguma coisa aqui? Você não vê que isso não tem fundamento?

— Bom, é o que vamos descobrir...

Mal dei o primeiro passo em direção à mesa mais próxima, Will irrompeu pelo meio das árvores, vermelho e esbaforido.

— Só me faltava essa, mesmo! Já não basta os pequeno, os grande também vão me atentar, é?! Fora! Fora, diacho!

— Will, é só um minuto. Eu só quero...

— Não quer nada! Eles já tão vindo... Vocês... Vocês... vão... ver...v...

— Will?

— Meu Deus, Will! – Por pouco, o velho "Mão Boa" não despencou no chão. Sentamos o segurança em um banco e ficamos aliviados quando ele abriu os olhos, parecendo ainda mais furioso em sua mudez repentina.

— Cuida dele aí, Lu...

Diego!

Sem dar ouvidos aos apelos de Luanna e com outras vozes se aproximando, caminhei por entre as mesas em busca de vestígios daquele passado perdido. Entre riscos e ranhuras, poeira e marcas de tinta, reconheci letras familiares, linhas curvas que se destacavam das outras, marcações quase apagadas, mas feitas com tanto esmero que resistiam, ao menos em parte, ao passar dos anos.

Lado a lado com corações apaixonados, caricaturas grotescas e piadas diversas, havia uma tipografia saudosa com vários "A" minúsculos que não se fechavam, "T" perfeitos e "O" tão redondos que poderiam ter sido feitos com o mesmo compasso usado para gravar as mensagens na pedra.

Na base de uma estava escrito: "Viver é fácil. Difícil é sobreviver".

Em outra, a estrofe de um poema...

"Doce espelho invisível | De luzes terríveis | Escondes verdades | Cruéis."

Mais adiante, uma pergunta: "Quem és, afinal?".

O Jardim das Confissões PerdidasOnde histórias criam vida. Descubra agora