quem sabe calar, evita guerrear

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Sebastián

Fechei o porta-bagagem do meu carro e pressionei o botão que trancava as portas. Coloquei a alça do meu saco desportivo sobre o ombro e virei-me na direção da saída, deparando-me com o Fábio a fitar-me especado no topo das escadas.

O Coentrão estava, portanto, de mãos a abanar — isto significava que tinha deixado no carro o que a sua amiga tinha trazido (embora eu tivesse ficado com a ideia de ser algo extremamente urgente e que não poderia esperar o fim do treino).

Caminhei calmamente até às escadas enquanto discutia comigo mesmo acerca do quão sensato seria questionar o caxineiro em relação ao que acabara de acontecer ali, afinal, a única coisa que me pareceu ser sincera, no meio de todo o seu discurso... era o nome da brasileira.

Heloísa.

Para além disso, tive a sensação de que ela ficara ainda mais desconfortável depois da chegada do português — algo que não fazia sentido se fossem assim tão amigos.

Dirigia-me, de mãos nos bolsos, para junto do lateral esquerdo quando a jovem brasileira passou a meu lado com a sua viatura. Encarei-a com um sorriso nos lábios e, sem a intenção de me fazer ouvir, murmurei "parece-me que te verei mais vezes, Heloísa."

— Como é que tu te esqueceste do saco no carro? — O Fábio Coentrão inquiriu assim que comecei a subir as escadas.

— Estava com a cabeça noutro sítio. — Desconversei, dando de ombros.

Este tipo de situações tornava-se cada vez mais comum — eu não sei onde é que andava com a cabeça e como é que poderia explicar as minhas distrações tão frequentes.

— A tua amiga assustou-me. — Tentei abordar o assunto de forma natural mas a curiosidade não me permitiu parecer menos intrometido do que isto. Vi-o coçar a cabeça, provavelmente desconfortável com a questão colocada. — Não sei se foi por ter aparecido do nada ou porque me tapou a boca com as mãos antes de eu sequer lhe poder dizer alguma coisa.

— Ela fez o quê? — Arregalou os olhos e as suas sobrancelhas subiram tanto que quase alcançaram o seu cabelo descolorido. Assenti, confirmando o que tinha dito anteriormente, e o português não conseguiu conter uma gargalhada desconfortável. — Pois... É que a Heloísa... Bom... Ela é um bocadinho estranha e... Ela provavelmente pensava que tu eras eu e... Prontos, acontece.

"Um bocadinho estranha" parecia-me um eufemismo.

Para além disso, não é como se nós fossemos minimamente parecidos, certo? Eu tinha praticamente vinte centímetros a mais que o Fábio e não havia maneira de nos confundir um com o outro.

— Ela é alguma amiga da Andreia?

Fora uma pergunta completamente inocente — parecia-me lógico que a única maneira do Coentrão conhecer a jovem brasileira fosse através da sua esposa. Mas, pela reação do português à minha pergunta, o meu raciocínio não estava propriamente correto.

— A Andreia nem sequer sabe que ela existe. — Admitiu, dando de ombros. Ao observar-me franzir as sobrancelhas, demonstrando surpresa e confusão, o lateral esquerdo achou melhor explicar-se. — Eu conheci a Heloísa porque temos um amigo em comum e eu ainda não a apresentei à Andreia... mas também acho que não é necessário. Um homem pode ter as suas amigas, certo?

Pela forma como esta conversa evoluía, eu poderia ser levado a deduzir conclusões erradas; contudo, não me cabia a mim fazer-lhe um julgamento de caráter. Podiam ser, efetivamente, simples amigos — para além disso, não deveriam ser propriamente próximos.

The Hideout | sebastián coatesWhere stories live. Discover now