Medo

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Os olhos de Sakura estavam sobre o relógio na parede, o dia anterior havia sido longo, a briga com Danzou a tinha deixado preocupada com o rumo que o tratamento de Sasuke tomaria, isso a obrigou não dormir, virou a noite fazendo pequenas pesquisas. Era claro que não devia, mas algo dizia que precisava daquilo. Assim que chegou na clínica sua solicitação foi clara: não queria mais que as consultas com o Uchiha fossem na sala de vidro. Ela queria independência, queria tratá-lo como tratava qualquer outro paciente.

— Tem certeza disso? — Kakashi questionou, a mão do Hatake estava sobre seu ombro dando apoio.

— Sim, ele não pode ser tratado como um animal. — ela tinha razão, mas Kakashi a conhecia bem, algo naquela atitude tinha dedo de encanto.

— Toma cuidado, se precisar de alguma coisa... — a rosada sorriu, por algum motivo ela sabia que Sasuke não seria capaz de machucá-la. — Amo-te! — o prateado beijou o topo de sua testa e passou os braços ao redor daquele corpo frágil. Ela sabia que era verdade, e também o amava, o único problema era não serem parecidos o suficiente para terem um relacionamento melhor.

[...]

Longe dos braços de Kakashi, Sakura se sentia nova, como se estivesse fazendo algo muito errado, como a primeira vez que matou aula. Um frio subia por sua barriga e ela tinha certeza que se não se controlasse ela quem precisaria ser atendida.

Na noite anterior ela gastou tempo pesquisando sobre o massacre da família Uchiha; antes da morte eles ocupavam bons cargos na polícia de Konoha, que hoje eram ocupados pelos Senjus, que na época eram apenas investigadores de casos baixos. Nenhum culpado foi encontrado para aquele caso e muita gente ainda tinha fé que Sasuke — na época criança — escondesse algum segredo em sua mente perturbada. Depois de tudo que leu, a Haruno entendeu perfeitamente o sofrimento que Sasuke devia passar, entendeu também o porquê dele acusá-la o tempo todo. A única coisa que havia ficado por fora era o porquê de Danzou ser responsável pelo Uchiha, quando nem amigo próximo da família ele foi, isso deixava-a intrigada o suficiente para querer entender as coisas mais de perto.

— A senhora está estranha, doutora. — foi a primeira coisa que Sasuke disse depois de sentar na cadeira. — Fiquei sabendo que temos a mesma idade. — era inacreditável como ele conseguia mudar de assunto com facilidade.

— Temos sim, — Sakura sorriu, será que aquilo significava que ele estava se identificando com ela? — mas me fale de você, como se sente nesta nova sala?

— Me sinto mais seguro, — o Uchiha suspirou, o semblante sossegado sumiu dando lugar a um ar de preocupação. — acho que estou sentindo saudades...

Era difícil dizer a ela o que realmente sentia, não sabia se ela era confiável o suficiente, mas tudo que estava acontecendo martelava sua mente com tanta força que era quase impossível resistir a vontade de contar.

— Saudades? De quem você sente falta, Sasuke? — ela devia imaginar que ele sentia falta da companhia de alguém que pudesse confiar, visto que toda sua família fora assassinada.

— Sinto falta do meu irmão, — ela havia lido sobre ele. Itachi Uchiha, na época estava no auge dos treze anos, ainda uma criança. — ele costumava se importar muito comigo, costuma...

A última palavra fez a mulher estranhar. Costuma ou costumava? Será que Sasuke tinha noção de que seu irmão também havia morrido, ou acreditava desesperadamente que Itachi fosse voltar para ajudá-lo?

— Eu não tenho irmãos, mas sei que eles devem ser imensamente cuidadosos, ainda mais o seu, que era mais velho. — as ônix do Uchiha se entristeceram, ela tinha razão, ele ainda acreditava que Itachi estivesse vivo. — Quer me contar como era a relação de vocês?

— Não posso, — o Uchiha agarrou a mão da rosada sobre a mesa e apertando-a com delicadeza obrigou a médica a prestar atenção nele. — a senhora já se sentiu perseguida? — Sakura sentiu o coração palpitar.

Os dedos de Sasuke se moveram apontando para o canto da sala, haviam várias tomadas, todas forneciam energia para um cabo diferente. A Haruno entendeu que Danzou não tinha deixado de lado a ideia de vigiá-la, mas não podia confrontá-lo desta vez, deveria agir em silêncio.

— Já sim, — Sasuke entendeu que podia confiar nela, talvez existisse uma forma de fugir desse maldito lugar. — e eu tenho uma forma melhor de você me dizer o que sente, — ela se levantou com calma, ainda segurava a mão do paciente com precisão, foi para trás dele e depositou as mãos sobre o ombro do mesmo. — quero que feche os olhos e pense no que te machuca. — naquela posição ela evitava que a câmera pudesse ter uma visão direta do Uchiha.

— Muitas coisas me machucam, — ele abaixou a cabeça deixando os cabelos cobrirem seu rosto. — as vezes elas são mais fortes que eu, e não consigo controlá-las. Toda vez que penso, perco o sono, mas é difícil não pensar. Eu sempre acabo pensando.

Pensar. Essa era a palavra chave, precisavam falar por enigmas que nem mesmo ela entendia, mas se esforçaria para ajudá-lo.

— Tente pensar em coisas boas. — ela sentou-se ao lado do moreno, a chave de energia da sala ficava daquele lado, ela tinha um plano para ajudá-lo.

Abaixo da prateleira havia um chaveiro pendurado, em cor metálica letras grafadas transmitiam a palavra "think", quando Sakura passou os olhos pelo chaveiro entendeu a mensagem do Uchiha. Aquele chaveiro levava a chave para abrir a caixinha de energia da sala.

— Venha, — a doutora estendeu a mão para o moreno. — Tenho uma ideia para lhe ajudar.

Ela estava fazendo coisas que não devia, mas não podia pedir ajuda e muito menos dar a entender que estava ajudando Sasuke, Danzou precisava pensar que ela estava do lado dele, ou melhor, que não sabia de nada. A Haruno segurou a mão do paciente e juntos eles saíram da sala, ela sabia que Sasuke tinha problemas que eram mais do que suficientes para os passeios pela clínica serem proibidos, mas não via outra alternativa.

— Ele vai brigar com a senhora, — o Uchiha disse num tom baixo, apesar de saber quem Danzou era, ele não podia dizer isso abertamente para a doutora.  — não tem medo?

— Tenho, mas a presença de medo não significa ausência de coragem. — a garota abriu um sorriso imenso, enfiou a mão livre no bolso e tirou um papel quadrado, ali haviam algumas frases anotadas. — Leia e tente associar a algo no seu dia a dia.

A letra cursiva da mulher era elegante, o que deixava Sasuke impressionado, sempre ouvira que médicos escrevem com letras horríveis. Algumas palavras estavam escritas com caneta azul e outras com caneta vermelha.

— Amor... — ele pronunciou uma das palavras em vermelho. — Não acho que eu possa associar a alguma coisa.

— Não existe nada que você nutra amor? — ele se pegou refletindo. Desde seus seis anos sua vida havia virado de ponta cabeça, seus surtos de medo e raiva afastavam as pessoas, será que também afastaria ela? — Não precisa ser necessariamente uma pessoa, pode ser um objeto, um gesto.

Ele fechou os olhos e lembrou do gesto que Itachi costumava fazer, um toque na testa que significava muito mais que muitas palavras. Seus olhos repousaram sobre a câmera do corredor, o coração palpitou de medo, o horror de não estar seguro retornou ao seu corpo. A mão da doutora serviu de apoio, mas seu desejo interno era voltar a viver sem temer.

— Sasuke... — Sakura o viu parar, o Uchiha a puxou com um pouco de força e a fez permanecer ao seu lado.

— Pode me levar ao meu quarto? — suplicou.

— O que você está sentindo?

Em dois segundos as enfermeiras se aproximaram. A mão do Uchiha tremeu sobre a da médica.

— Doutora, está tudo bem? — uma mulher perguntou aparentando preocupação. Sakura sequer lembrava de tê-la visto por ali minutos antes. — Se quiser podemos...

— Não! — a rosada vociferou nervosa. — O que vocês estão olhando? Está tudo bem, não precisamos de ajuda!

Sasuke se sentiu protegido, como se a doutora estivesse criando um escudo de proteção ao seu redor. A enfermeira acenou positivamente e deu meia volta.

— Eu disse que não me sentia seguro... — ele sussurrou. Sakura teve certeza que algo muito errado estava acontecendo naquela clínica.

Flor da Loucura - SasuSaku Onde histórias criam vida. Descubra agora