Tentei chegar em casa sem fazer barulho e sem chamar a atenção de quem quer que estivesse acordado, mas eu estava transtornado demais. Há algumas horas atrás eu fui atropelado pelo trem Augusto Prado e desde então eu estava sem chão. O loiro havia ultrapassado toda barreira que eu tentei inutilmente criar em torno de mim e de minha vida. Augusto Prado apenas disse "foda-se o que você acha que é certo e errado, olha o que eu vou fazer com você". E então quando menos esperei eu me vi ainda mais fodidamente atraído por ele, e para piorar, ele fizera aquilo com o intuito de me afastar. Que tipo de problema ele tem?
Caminhei em direção ao meu quarto como se nada mais nesse mundo importasse, como se estivesse em alguma realidade paralela onde meus sonhos eróticos tornavam-se reais, mas o grito da minha mãe me fez ter a certeza de que eu estava na realidade certa e bem encrencado, aliás. Bem, levando em consideração que essa casa funciona com um sistema rígido onde todo mundo deve saber tudo que você faz e quando você faz, o fato de eu não ter almoçado, ter trancado a porta do meu quarto, não ter tomado café da tarde, ter sumido praticamente a tarde inteira, não ter ido à igreja e voltar somente agora com certeza ocasionaria o pontapé inicial para o início da terceira guerra mundial, não há dúvidas quanto a isso.
- Aonde você estava, Gustavo? - Eu tinha duas opções, ou eu inventava alguma mentira plausível na qual eu poderia combinar com alguém pra mentir por mim caso fosse necessário ou eu contaria toda a verdade e tentava mentir no meio dela. Como a minha mente ainda estava em choque pelo fato de Augusto ter colocado a boca dele no meu pau há algumas horas atrás, então eu obviamente escolhi a segunda opção, se bobear não haveria sequer a necessidade de inventar mentira alguma, só a verdade já bastaria.
- Eu estava com um amigo da escola em uma lanchonete. - Olhei para meu pai e ele estava de braços cruzados sentado em sua poltrona costumeira. Olhei para Magda e ela estava com uma expressão facial de "eu tentei o máximo que pude". Dei de ombros e um meio sorriso como se dissesse que não havia problemas e ela sorriu de volta. Aquela foi uma das comunicações mais pacíficas que tivemos em anos de convivência, acreditam?
- E por que demorou tanto? Já são quase onze horas da noite, além do mais você está sumido desde tarde. - Minha mãe continuou implacável, mas antes que eu pudesse dizer qualquer coisa, meu pai aproveitou para emendar a fala dele também, que pelo jeito seria longa uma vez que ele abaixou o jornal e o dobrou, deixando claro que não voltaria a ler e daria toda a atenção necessária àquela discussão.
- E por que trancou a porta do seu quarto? Sabe que aqui dentro de casa ninguém tranca nada... - Depois disso o meu pai começou um sermão que, sinceramente, entrou por um ouvido e saiu pelo outro, pois eu estava num puta estado de torpor onde minha cabeça girava, girava e acabava parando dentro da cabine do banheiro da lanchonete, fazendo-me esquecer o momento presente com os pais chatos e autoritários que eu tinha. Vocês devem pensar que eu sou um escroto por pensar que meus pais são chatos quando na verdade eles só estão preocupados comigo, mas vocês querem realmente saber como é a minha vida dentro dessa casa? Irei contar pra vocês mesmo que a resposta para essa pergunta tenha sido não.
Eu fui um filho planejado. Minha mãe não simplesmente engravidou e meu pai disse "opa, vou ter que assumir". Não, eles formaram-se cada um em suas faculdades, arrumaram empregos estáveis, casa própria, veículos e quando acharam que a vida já estava ok, eles decidiram ter um filho. Quando eu nasci, eu era mais esperado do que a taça de hexa do Brasil. Meu pai queria por tudo que era mais sagrado nesse mundo ter um filho homem, pois assim ele teria com quem ver jogo de futebol e fazer todas as coisas que somente homens faziam e que ele fazia com o pai dele quando era mais novo. Eu tive festas de aniversário de um ano, dois, três, quatro, e todas as festas que você possa imaginar até a idade que possuo. Quando eu ganhava algum campeonato ou alguma coisa, isso também era motivo para comemorar, então eu tinha festas e mais festas quase sempre, diferentemente da Magda que só foi ter a primeira festa de aniversário dela aos quatro anos de idade. Nós só tínhamos dois anos de diferença e era nítido como o tratamento era desigual, e isso, claro, gerou um abismo entre nós, pois querendo ou não ela notava o favoritismo de nossos pais para comigo e descontava toda sua frustração em mim. Não a culpo, em seu lugar eu teria feito o mesmo ou até pior. Para começar, Magdalena não foi planejada, o intuito dos meus pais eram ter apenas um filho, mas quando minha mãe disse que estava grávida não havia muito o que fazer, pois aborto não era nem de longe uma opção para eles. Meu pai ficou um pouco frustrado quando soube que era uma menina, pois, se ao menos fosse menino ele poderia repetir a experiência que era ter um filho pequeno e menino e curtir o dia dos caras com mais um filhote seu, mas Magda viera, e vira com tudo, pois nasceu prematura. Impaciente até pra nascer. Ela sempre foi assim, destemida, impaciente, mas nossos pais cerceavam a liberdade dela. Magda não podia fazer absolutamente nada, ao passo que eu tinha um pouco mais de autonomia que ela até que... os papéis estranhamente se inverteram.
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Fetish (Romance Gay)
RomanceGustavo Borges odeia absolutamente tudo em Augusto Prado. Seu cabelo está sempre diferente, nunca é o mesmo sempre. Seus trejeitos são excêntricos e ele fala alto demais. Ele beija garotas e garotos, mais garotos do que garotas. Suas vestes fogem to...