Pérola negra

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Era apenas mais um dia comum na minha vida comum, guardada as devidas proporções, lógico, e minha corrida ia bem, eu tinha muita resistência e adorava correr muitos quilômetros todos os dias.

Eu estava a pouco menos da metade do meu circuito habitual quando eu ouvi uma voz fininha gritar. Parei por poucos segundos antes de desatar a correr para o meio da floresta atrás da pessoa. Podia ser um turista desavisado, podia ser alguém em sérios problemas e naquela hora ninguém estava por aquela região, era exatamente por isso que corria ali a tarde.

Quando cheguei no local a primeira coisa que vi foram os cabelos pesados, crespos e em um coque frouxo balançar e então a garota cair em um baque surdo sobre um arbusto. Dali então só pensei em levar ela para casa e torci para que não fosse nada grave. Peguei a garota no colo e foi quando senti que a pele dela ardia.

— Febre.

Sussurrei antes de desatar a correr com ela de volta para o castelo.

Eu era atlética, eu adorava esportes radicais, eu tinha uma tendência aos hábitos dos meus dois pais mais atléticos, assim correr com uma garota magrinha nos braços nem era lá essas coisas, contudo algo nela me fez tomar mais cuidado do que o habitual e eu não sabia bem se eram as pintinhas espalhadas pelo nariz arrebitado, se era pelas pálpebras que se moviam como se ela estivesse em um pesadelo ou se era pelos lábios que se espremiam incômodos. Eu realmente não sabia, contudo não conseguia deixar de sentir o perfume leve e doce que exalava da pele dela febril.

Talvez fosse todo o conjunto da obra, mas ao chegar em casa e com meia dúzia de guardiões da guarda branca ao meu redor, surpresos – Não era muito comum gente de fora surgir, ainda mais no colo de alguém da família como naquela situação – Eu só gritei pelo doutor da família mesmo. Dr, Jin.

Dez minutos depois eu tinha o médico verificando a garota enquanto ela jazia sobre o divã macio da sala de consultas. A maca era fria e eu não queria ela sobre a maca.

Eu não queria. E aquilo disse tudo para mim.

Minha família é toda fora dos padrões comuns e mesmo fora dos padrões da própria sociedade em que vivia e para mim, que tinha abraçado todas as estranhezas da minha vida com devoção, sentir o que eu sentia naquele segundo era tudo o que eu precisava.

A garota era minha, ela soubesse ou não.

Eu nunca tinha me sentido atraída por ninguém, nunca, mas agora era como se aquela garota de pele macia e escura como a mais bonita pérola negra que o papai tinha, fosse toda a razão pela qual nada nunca me interessou até ali.

Eu estava esperando por ela. E era isso.

— O que ela tem, doutor?

— Insolação, Shawn, ela ficou muito tempo fora, no sol... – Eu senti algo errado no tom do médico, mas ele por fim suspirou e se ergueu – Ela vai ficar bem com o devido repouso – Ele se virou para mim e parecia pensativo – Ela tinha alguma mochila com ela?

Eu parei para pensar com afinco, mas não tinha visto nada, realmente... Ela estava ali sem bolsa?

— Doutor...

— Volte lá e veja se há algo.

Ele não precisou falar duas vezes. Aquilo era estranho.

— Cuide dela, eu já volto.

Sai rápida do castelo outra vez até ir ao ponto onde encontrei a garota e nada. Não havia nada mesmo, nenhuma bagagem...

Que estranho.

Irmãs PhiravichOnde histórias criam vida. Descubra agora