Bernardo

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 Será que ela estava na casa? Eu já tinha dado voltas em milhares de corredores diferentes, entrado em vários cômodos e nem sinal da filha do Rato, mas ela tinha que estar ali. Pelo menos era o que o Gordon pensava. Ele investigou a informação da morte da tal Elise, e como eu desconfiei, era infundada. Não havia lápide com o nome dela, e não havia nenhuma certidão de óbito. De acordo com o cartório do reino, Elise Barsel continuava viva. Ela não havia sido enviada para nenhum outro país, ele investigou, então estava no reino. A ideia de que Bárbara tivesse um cúmplice, ou alguém que aceitasse esconder a menina para ela era quase absurda, eu sabia como os camponeses gostavam de ser corretos, caretas, eles não fariam isso. A melhor forma de ela esconder a enteada sem que ninguém desconfiasse de nada, era prendendo-a em sua própria casa. Ela poderia alegar que a menina não gostava de sair de casa, que ela estava depressiva pela morte do pai, ou qualquer coisa assim. Então ela só podia estar ali. Mas eu já estava dando voltas a horas, e nem sinal de uma prisioneira.

Voltei para cima, passei pelo quarto de Bárbara e entrei no segundo quarto. Uma Carmine adormecida roncava como um porco e rapidamente saí do aposento. Entrei no terceiro quarto, a cama estava vazia, podia ser ali. Dei dois passos para dentro sem fazer nenhum barulho e algo pulou em cima de mim. Me assustei num primeiro momento, mas logo mãos femininas tocavam meu corpo e lábios beijaram meu pescoço. Aturdido pelo ataque, ascendi a luz e me deparei com Clarisse. Ela vestia uma camisola de seda, seu cabelo quase branco estava ralo sobre o ombro, diferente do cabelo volumoso dos jantares, e ela sorria maliciosamente. Interessante! Ela veio para cima de mim de novo e tive que me esquivar.

— Não precisa fugir, Alteza, sei que me deseja. Não pode estar realmente interessado na mamãe, ela é velha. Não sou santa, aceito ser sua amante.

Tive que conter a risada, eu estava em uma disputa de mãe e filha e poderia me divertir muito, na hora certa. No momento não podia fazer nada que despertasse a desconfiança de Bárbara e perder as terras, então, pacientemente afastei Clarisse. Ela continuou me atacando como uma louca e não tive outra saída a não ser atirá-la na cama com toda força que pude.

— Chega, Clarisse! Estou com sua mãe!

Ela pareceu em choque e começou a chorar, era só o que me faltava! A ouvi falando pelo nariz:

— O que ela tem que eu não teeeeeeenho, ela já está veeeeeelha, eu sou mais nooooova, você pode me ter por mais teeeeeempo.

Não aguentei mais sua ladainha e saí dali, não sabia o que fazer quando uma mulher chorava e Clarisse me fez perder tempo. Mas já era o bastante por uma noite, era melhor que fosse logo embora e poderia dormir um pouco antes de amanhecer. Com uma vela na mão, desci cuidadosamente as escadas, e ia saindo, quando reparei em um sapato deixado para trás. Era uma sandália velha de couro marrom, estava rasgada e desgastada. Devia pertencer a garota, mas por que estaria ali? Ela a estava usando quando nos encontramos? Me aproximei da sandália e avistei os três corredores, eu já tinha percorrido todos, certo? Ou será que não? Havia ido no da direita? Ou no da esquerda? Soltei um xingamento e segui pelo da esquerda, desci dois lances de escada e parei diante de uma porta estreita. Não devia ser nada. Dei a volta para ir embora, quando ouvi um barulho. Aproximei-me novamente e ouvi de novo, um palavrão. Eu devia estar ficando louco ou a porta estava ralhando comigo. Pisquei os olhos, eu devia estar com sono. Mas nessa hora o palavrão foi praticamente gritado e ouvi o barulho de algo acertando o chão. Abri a porta e me deparei com mais um lance de escadas para baixo. Eu não havia estado ali. Desci as escadas sem fazer barulho, mas não ouvi mais nada. Iluminei com a vela, era um velho porão, não havia nada ali.

Quando ia saindo, ouvi um barulho, e alguém chamou.

— Oi, tem alguém aí?

Segui o som da voz e me deparei com uma porta de aço na cor cinza, feito uma porta de cela, com um pequeno quadrado no meio por onde os presos recebem o alimento. Ela não tinha cadeado, mas uma tranca que era passada por fora. Abri a tranca esperando encontrar a jovem Elise desamparada e assustada, ela se jogaria em meus braços e eu seria seu herói. Então me casaria com ela, encontraria o tesouro e sumiria dali. Mas, assim que abri a porta, avistei a garota, a criada, chorando. Ela arregalou os olhos e pareceu desapontada.

Desencantados - COMPLETO ATÉ 11/01/23Onde histórias criam vida. Descubra agora