Sasuke fechou a porta do quarto e não chegou a soltar a maçaneta. O silêncio e a paz que o tinham acompanhado até ali subitamente desapareceram, e, no lugar, existia um cálido rastro de perigo que se arrastava por sua espinha. Apertou a maçaneta antes de se decidir por soltá-la e buscou em sua alma alguma sombra de medo, o que quer que fosse para então evitar se virar e optar por fugir o mais rápido possível dali. Contudo... revirando os baús empoeirados que protegiam sua mais pura essência, ele já devia estar acostumado a achar nada além do vazio que piscava curioso e ansioso para a hora de devorá-lo.
O rosto se virou lentamente, na certeza de que havia alguém além dele naquele quarto.
— Você não trancou a porta, padre. — Naruto sorriu de canto, sentado sobre sua mesa.
Sasuke respirou fundo. O aroma de terra molhada, da grama fresca após a chuva, parecia acompanhar Naruto sempre que o via, e isso só podia ser sua imaginação porque Londres não possuía aquele cheiro, não com todas aquelas fábricas a mil. Os pés dele balançavam inquietos, botas perfeitamente limpas com um delicado salto. Seus papéis estavam espalhados pelo chão sob a mesa, alguns amassados sob as mãos de Naruto que lhe sorria animado e em expectativa.
— Tranque a porta, Sasuke. — Naruto apontou com a cabeça.
— Por quê? — perguntou e se repreendeu em seguida. Não devia responder, aquilo não era real, não devia alimentar os demônios de sua mente.
— Por que não? Eu estou com fome, Sasuke. — Naruto sorriu ladino antes de rir abertamente para a carranca que recebeu em resposta. — Vamos, você não quer que alguém nos interrompa, não é? Tranque a porta e venha até mim, Sasuke...
Havia algo na voz dele, um magnetismo que Sasuke começava a perceber, quase como se ele depositasse uma pitada a mais de persuasão quando o olhava direto nos olhos. E foram os olhos que fizeram Sasuke franzir o cenho e não conseguir se mover. Os azuis celestes estavam diferentes de antes, com certeza mais... vivos.
— Isso é real? — perguntou, e Naruto tombou a cabeça pro lado enquanto o observava divertido.
— Você quer que seja?
— O que aconteceu? — Piscou enquanto tentava entender por que os olhos de Naruto brilhavam mais do que antes. — O que mudou?
— Como assim? — E a expressão de repente ficou séria, encarando Sasuke com dúvida e receio enquanto tentava compreender o motivo daquela pergunta.
— Você não é real — Sasuke determinou, enfático, e Naruto arregalou os olhos quando ele começou a andar pelo cômodo como se ele não estivesse ali.
E estava? Sasuke não sabia. Aquele não era o Naruto de que se lembrava, os olhos eram diferentes, e isso reforçava sua desconfiança. Até porque... por que motivo Naruto estaria ali? Como teria entrado? Ninguém que não fosse da igreja conseguiria ir tão longe, ainda mais sem a chave de seu quarto. Olhou então para a janela, fechada, e engoliu em seco quando se virou e Naruto estava de pé à sua frente.
— Explique-se — Naruto pediu, e havia uma nota de desespero em sua voz que Sasuke reparou apesar de ele tentar se manter firme. — Explique-se, Sasuke! O que quis dizer?
— Você não é real — sussurrou para si, o tom calmo enquanto continuava a andar até a mesa onde Naruto antes estava e pegava os papéis espalhados. — Estou com febre, estou delirando de novo, você não é real.
Naruto riu baixo, incrédulo com a tranquilidade com que Sasuke agia. Por um momento, havia desconfiado que pudessem estar interferindo em seus planos, mas não... era só Sasuke sendo... Sasuke. A mesma mania de negação, a mesma falta de fé, a mesma insegurança e incapacidade de enxergar algo que se apresentava tão nitidamente sobre a palma da mão dele.

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Ameno
FanfictionUm incêndio levou Sasuke a ser adotado pelo Cardeal Danzou e ser criado dentro da santa Igreja Católica cercado pelos muros do Vaticano. Sem muitas perspectivas para si, deixou seu futuro ser moldado pelas mãos de seu grande benfeitor e foi dessa fo...