Acordo de supetão. Caramba, fiquei tendo pesadelos a noite toda. Foram vários, mas o assunto era o mesmo. Demissão. Cruzes.
Desligo o despertador, já que acordei antes dele. Vou para o banho e, depois, me arrumar.
Não consigo parar de pensar o que eu vou fazer na frente do CEO. Como será uma entrevista com ele? É, porque vai ser exatamente isso: uma entrevista. En-tre-vis-ta. Eu tenho que falar da minha vida profissional, claro. Mas eu não vejo qualificações para o cargo. Preciso preparar algum tipo de apresentação, igual aquelas de filmes, tipo palestra?
"Calma, Ana! Minha nossa, mulher. Recomponha-se!".
Saio do banho - que nem consegui aproveitar - e vou vestir meu vestido tubinho, abaixo do joelho, claro. Preto, básico. Sem erro. Levarei um casaco azul, para ficar sóbria, mas não como se fosse para um enterro. Ainda. Sapatos scarpin bege, para alongar a silhueta (não sou muito alta e o vestido mais comprido vai encurtar as minhas pernas). Meia calça da cor da minha pele. Só para ficar mais elegante. Um brinco pequeno, um anel e o relógio. É isso. Elegante, mas não extravagante. O objetivo aqui é não ser demitida.
Desço no horário, pego o ônibus e, até um ponto antes do meu, estava tudo certo. Mas quando levanto, a pasta de uma senhora raspa na minha perna e eu sinto algo ser repuxado. Não acredito! Sem pânico. Eu vou olhar assim que chegar no prédio. Mentira, não aguento. Assim que desço, vejo o estrago. Com o movimento para descer, o rasgado ficou enorme. Um buracão bem na lateral do joelho.
Ando correndo para chegar logo até o elevador. Sou jogada para trás, sentindo um calor bem na frente do vestido. Demoro uns segundos para entender o que se passa.
"Nossa, mas o senhor poderia olhar por onde anda! Quase me queimou e derrubou!"
"Olhe VOCÊ por onde anda!"
Ele nem se dignou a me olhar! Cretino! Só pude notar que ele é alto, tem cabelos escuros e uma voz profunda. Se acha!Levanto sozinha e vejo que o restante da meia calça se acabou. Além de ralar minhas mãos. Sujar meu vestido. Droga! E, claro, a fila para o elevador está imensa. Mas tudo bem. Tudo certo.
Última leva de pessoas. Eu sou a próxima.
"Senhores, temos um problema no andar 21. Vamos parar no 20° andar e vocês terão que subir de escada. Se houver cadeirantes, por favor, avisar e vamos ajudar na escada, ok? Desculpem!".
Gente, mas isso é palhaçada! Como assim? Anda logo, elevador, preciso chegar a tempo de retirar essa meia calça e me limpar. Não posso me apresentar assim.
Quando o elevador parou no 20° andar, subi correndo e fui diretinho para o banheiro. Retirei a bendita da meia, enfiei na bolsa e olhei no espelho. Ok. Lavei meu colo, mas o vestido não tem jeito. Ainda bem que é preto e eu trouxe um casaco. Retoco o batom e passo uma máscara nos cílios. Sou pálida e não posso me dar ao luxo de não passar um batom, nem que seja da cor da minha boca - ou da que deveria ser. Pronta. Vamos manter esse emprego!
Vou até o corredor que dá para a sala do Sr. Suarez. A recepcionista, uma bela morena de olhos verdes brilhantes, abre um largo sorriso.
"Em que posso ajudar?"
"Ah, eu sou Ana Borges. Do setor administrativo. Fui informada que o Sr. Suarez gostaria de falar comigo, sobre uma vaga para assistente. Está marcado para as 7h30."
Ela olha na agenda e confirma. Pede que eu sente numa poltrona, após passar pela porta de vidro fumê. E assim o faço. Poltrona confortável. Digna.
Olho no relógio. São 7h29. Se ele não gosta de atraso, já vai chamar. Franzo o cenho. Detesto atrasos.
Mais um tempinho. São 07h44. Gente, ele deve tá entrevistando outra pessoa. Só pode.
08h03.
08h12.
Levanto. E sento novamente. Mais 5 minutos, aí vou lá na recepção.
08h17. É isso. Vou lá.
Quando abro a porta de vidro, ouço uma voz masculina.
"Sim, já estou indo, Gustavo. Estou com a agenda livre até as 10h00."
Não pode ser. É ele! Essa voz é do nojento que esbarrou em mim! Olho em direção a ele. Nossa. Fico parada, igual uma idiota. Só o que consigo pensar é que nunca vi um homem tão bonito em toda a minha vida. Alto, traços fortes na medida, olhos verdes penetrantes e um caminhar elegantérrimo.
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Desejos
RomanceTrabalhar com o chefão pode se mostrar uma tarefa e tanto. Ana Borges irá descobrir que, às vezes, a rotina deve ser quebrada para que algo de bom possa aparecer.