Cap. 14

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Mais uma vez eu ri. Só parei quando sua expressão de seriedade permaneceu. Dessa vez, a minha que mudou. Eu só poderia estar escutando errado.

— Espera, como é? — Meu olhar só continha ódio e repugnação.

— Eu sei que vou perder créditos com você, mas vamos lá. Você quer a verdade, não é? Tudo começou quando entrei no caso da Dr. Adriana — ela começa a se emocionar. — Quando estava mais ou menos umas duas ruas atrás do Batalhão para chegar até meu carro, sinto um braço se envolver no meu pescoço. E a partir daí minha vida nunca mais foi a mesma. Ameaçaram Maia, minha família, eu tive que agir e acabar com isso de alguma forma. Na época eu nem te conhecia, para mim você era apenas um policial sem coração, que não ligava para nada e ninguém. Eu aceitei, por impulso. Minha missão era descobrir tudo que pudesse te fazer perder a guarda do Miguel.

— Não, você não fez isso — Ela já começou a chorar três vezes mais. — Você não seria capaz de fazer isso. Não comigo!

— Eu queria que fosse só isso.

Meu coração estava saindo do peito no momento que ela disse aquilo. Eu não estava acreditando que tudo o que estava vivendo era real. Para mim poderia ser apenas um sonho. A mulher que eu amo me traiu, da pior forma.

— Tem algo pior do que você entrar na minha vida como uma culta mulher e sair dela como uma detetive contratada por vingança? Algo pior do que quase me fazer perder a guarda do meu filho para sempre? Me diz, o que é pior? — Eu nem conseguia chorar, só gritar.

— Beatrice não estava sozinha nessa.

— Ah, que maravilha. Todos os traficantes que aprendi ao longo da minha carreira na PM decidiram se juntar, montar um plano e acabar comigo, e para isso escolheram Beatrice?

— Francisco é o nome dele. Fez curso com você.

Como poderia ter me esquecido dele? Ele também estava por trás de tudo isso, como não percebi.

— No início, quando me encurralaram e conversaram, Beatrice estava junto o tempo todo. Até o momento que eu estava indo embora e Francisco me parou, me sufocando com a mão no meu pescoço. Ele ordenou que eu te matasse.

Eu não sabia como reagir. A cada vez que ela abria a boca era como uma facada no estômago. Como alguém poderia ser tão sangue frio assim?

— Eu...

— Sarah, só quero ouvir uma única coisa da sua boca a partir de agora. Seja sincera, por favor — digo sério. — Você me amou de verdade durante esse tempo juntos?

— Cadu...

— Responde!

— Não, no início não. Era só um plano. Eu queria sair logo dele.

Assinto, abaixando a cabeça, olhando meus pés e respirando pesado.

— E você ia me matar — olho no fundo de seus olhos escuros.

— Não, eu não...

— CHEGA! Chega de desculpas! Agora tudo faz sentido, como não pensei nisso antes. Aquele dia que eu acordei de madrugada, sem você ao lado, preocupado, desci e avistei você na sala, olhando bem sua arma. Lembro que perguntei o que estava fazendo e você ficou nervosa, muito nervosa. Gaguejou, gaguejou, no final apenas inventou uma desculpa qualquer que eu acreditei, como sempre. Houveram outras vezes suspeitas, mas NUNCA imaginei que fosse algo assim. Que você planejava me matar.

— Calma, Cadu! Me ouça, por...

— Não tem perdão o que você fez, Sarah! Eu jurava que tinha encontrado mais uma vez a mulher certa. Eu mostrei para todo mundo que te amava. Como conseguiu fazer isso comigo?

— Naquela época eu não te amava, era tudo pelo plano, mas eu juro, eu te amo! As coisas mudaram, meus sentimentos mudaram — seus olhos estavam vermelhos de tanto chorar.

— Eu nunca vou te perdoar por isso. Você brincou com os meus sentimentos. O pior de tudo é que foi com a pessoa que eu mais odeio nesse mundo. Você a ajudou a acabar comigo. E conseguiram, parabéns! — Bato palmas e saio batendo a porta.

Eu só queria espairecer. O mundo tinha caído sob minha cabeça e eu estava atordoado. Eram tantos os pensamentos que nem sabia o que fazer. Pensei em entrar no carro e voltar para casa, mas ao mesmo tempo me conscientizei, eu estava furioso, só poderia fazer besteira na estrada. Ali por perto tinha um lago grande, afastado o suficiente para que Sarah não me encontrasse. Agora quem não quer olhar em seus olhos nem ter contato sou eu. Entendo o porquê de todos não quererem essa conversa. Entendo agora o porquê de ela ser tão destrutiva.

Me sentei em uma rocha, o vento ainda estava forte e fazia a água bater na barra da minha bermuda. Naquele momento eu não tinha nenhuma preocupação, eu só queria esquecer tudo o que acabou de acontecer, tudo o que um dia me aconteceu, e focar no presente, no a partir de agora. Se eu for chorar, sofrer por cada coisa que me acontece, já era para eu ter desistido de tudo a muito tempo, bem como o tempo que fui muito julgado no início da minha carreira profissional como militar. Talvez se eu pudesse voltar no tempo, nada disso teria acontecido. Mas ao mesmo tempo foi bom, não vou mentir. Foi tão bom, tão diferente dos demais que eu até achei que fosse real, que desse certo. Não quero olhar mais na cara dela nem pintada de ouro. Assim como peguei um nojo grande de Beatrice, acontece com Sarah agora. Não, nem é por ser ex agora. Nunca é por ter deixado de ser algo para mim, é sempre por suas próprias atitudes.

Agora sou eu e eu. Nunca foi diferente.

Flashback On

— Mãe, aconteceu um negócio chato.

— O quê, exatamente? — Se sentou na mesa junto a mim.

Estávamos jogando bola e, quando Fernando chutou, ela atravessou a janela de um vizinho dele. Eu assumi a frente e disse que tinha sido um acidente, o moço entendeu depois de muito explicar e nos desculpar.

— E o que aconteceu?

— No dia seguinte a gente foi jogar bola de novo, que ninguém deixou a bola cair na casa de ninguém. Porém, o vizinho saiu da casa furioso com a gente, nos acusando de pintar os muros dele com spray. Estavam mesmo sujos, mas não tinha sido eu. O cara olhou para mim e começou a dizer um monte. Falou que quem me acusou foi o Fernando, o garoto que não gostava de mim, não sei nem o porquê. Estranhei, olhei para os cantos, vi que tinha uma câmera. Falei para o moço olhar nas filmagens, e adivinha?

— Quem tinha sido?

— O Fernando, enquanto ele estava como reserva do time. Mãe, ele me acusou injustamente, porque não gostava de mim. Eu não fiz nada para ele, como pode?

Filhotocou em meus ombros —, nem sempre precisamos ter feito algo para que as pessoas não gostarem da gente. Às vezes, a nossa educação, por todos gostarem de nós, por conquistarmos tudo o que queremos mesmo que no esforço, já é motivo o bastante para que nos invejem. Com isso, essas pessoas sempre vão tentar nos derrubar. Mas sabe o que nos mantém de pé?

— O quê?

— A nossa humildade. Enquanto muitos jogam sujo, você caminha pelo certo. É sempre assim, entendeu? Por mais que te falem para fazer algo de errado, escute seu coração, ele sempre vai te guiar pelo que é certo. O que te diferencia de muitos é a sua bondade, é você ser um garoto certo no meio de tanta gente errada. Continue assim.

Flashback Off

Algumas lágrimas escorreram pelo meu rosto. Minha mãe, sempre tão sábia, jamais me fará esquecer de cada um de seus ensinamentos enquanto meu pai esteve longe. Ela tinha razão. Quantas vezes fui apunhalado pelas costas, mas nunca deixei minha essência de lado, nunca esqueci de quem eu sou.

Meu Caveira - A Vingança (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora