Capítulo 11: O Cofre

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Lilly quase puxou o braço com força antes de perceber que se tratava apenas de um pequeno marsupial que a cheirava, os bigodes fazendo cócegas em sua pele. Com cuidado, como se não quisesse assustá-lo, ela estendeu a outra mão para acariciar as costas do bicho; mas, quando ela o tocou, o animal soltou um guincho e fugiu correndo para a vegetação rasteira.

Que estranho, pensou ela. As marcas de picada inflamada pulsavam em seu punho. Será que aquela criatura tinha sentido o veneno se espalhando pelo seu corpo? Era ainda mais esquisito que um animal tivesse notado sua presença, que geralmente era imperceptível ali.

Ela só precisou de um instante para se localizar; estava em algum lugar dentro do Éden, mas sozinha: não havia sinal de Eva. Lilly andou em direção a uma rocha que dava vista para uma planície ampla e repleta de criaturas. Adão estava parado em cima da pedra, apontando para baixo, cercado pelo Fogo, pelo Vento e pelo Homem Eterno.

O que eles estão fazendo?, perguntou-se. Ela parou perto o suficiente para entreouvir a conversa. Adão, sentindo sua presença, virou-se e olhou através dela, como se tentasse se concentrar para materializá-la.

– Este é o fim do último dia da nomeação dos animais – declarou ele com tristeza, como se falasse para ela –, e ainda não encontrei nenhum outro ser semelhante a mim, para que eu possa criar uma relação face a face.

O jovem ergueu ospunhos e gritou enfurecido para o céu. As palavras reverberaram e ecoaram de volta, enquanto o tempo, o espaço e todas as criaturas ficaram imóveis.

– Estou sozinho!

Lilly sentiu o grito penetrá-la profundamente, e sentiu-se arrebatada pelo desespero daquela alma perdida.

Adonai estendeu a mão para tocar seu filho e Adão se encolheu, a cabeça baixa, as mãos cobrindo os olhos, constrangido por sua fraqueza. Lilly tentou dar um passo em sua direção, mas seus pés pareciam atolados em um lamaçal espesso. Então uma voz, que ela julgou ser de Adão, disse algo totalmente inesperado.

– Lilith? Lilith?

– Lilly? Lilly? – Anita sacudia seu braço.

Arrancada de sua visão com um sobressalto, ela se viu encarando a expressão preocupada da mulher mais velha. Lilly olhou ao redor e tentou mascarar sua perplexidade. Todos estavam tomando café da manhã e olhando para ela, com talheres congelados a meio caminho da boca, mas ela não fazia ideia de como havia chegado ali. Não tinha lembranças da manhã, de acordar, ou de qualquer outra coisa.

– Desculpem – balbuciou ela, procurando uma justificativa qualquer. – Estava com a cabeça longe, pensando em algo que John leu para mim alguns dias atrás. – Eles pareceram aceitar a explicação, pois todos relaxaram.

– Com a cabeça longe? – disse Anita. – Acho que longe é pouco. Você parecia estar em outro planeta, minha querida. Ficamos preocupados por alguns instantes. Em que estava pensando? Devia ser importante.

O alívio da mulher deu a Lilly os instantes de que ela precisava para organizar seus pensamentos.

– John leu para mim a história dos Inícios e eu estava me perguntando... quem é Lilith?

– Lilith?! – exclamou Simon, quase engasgando com a comida. Lilly teve a impressão de vê-lo balançar a cabeça de leve, em um gesto de alerta. Os outros pareciam igualmente chocados.

– Este nome não estava em nada do que eu li para você! – declarou John. Lilly vacilou.

– Qual é o problema com esse nome?

– Tolices sem fundamento, minha querida – afirmou Gerald, em um tom quase severo. – Mitologia em sua forma mais insidiosa. Absurdos. Onde você ouviu falar de Lilith?

EVA - William P. YoungOnde histórias criam vida. Descubra agora