☀〡One〡

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Eu nunca me dei bem no frio. Não que eu não gostasse. Eu simplesmente não havia me adaptado muito bem ainda a esse clima gélido e sombrio. Isso era uma vergonha total, considerando o fato de que eu era filho de um Jotun - gigante de gelo. Mas, não era minha culpa se eu não tinha as habilidades com o gelo. Quando me criou, Loki me concedeu praticamente tudo que a feitiçaria Asgardiana poderia oferecer, entretanto, não me concedeu resistência ao frio. Eu não era como um humano, obviamente. Era bem mais resistente ao clima e à dor do que qualquer Midgardiano que já existiu, mas não o suficiente para não tremer pelo vento gelado do inverno britânico.

Puxei meu casaco contra o meu corpo conforme andava em passos apressados pelo campus da universidade. Era o meu segundo semestre na Cambridge, estudando biomedicina. Eu havia me adaptado bem ao país e aos humanos, mesmo os considerando muito irritantes na maior parte do tempo. Não que eu não gostasse deles. Eu me dava bem com a maioria. O problema era que humanos eram intrometidos e curiosos por natureza. Natureza essa que, na maioria das vezes, eles não conseguiam controlar. Felizmente, eu sabia ser ameaçador o suficiente quando queria, o que me garantia não ser incomodado por pessoas inconvenientes. Claro que, quando queria um pouco de distração, eu os atormentava um pouquinho, com algumas travessuras que eles nunca descobriram de onde vinham. Eu sabia fazer um bom trabalho.

Caminhei em passos largos até o prédio da faculdade. Era hora da minha primeira aula - biologia molecular. Uma de minhas matérias favoritas no curso. Entrei na sala de aula e tomei meu lugar ao fundo. O professor adentrou na sala, e tratou de começar a falar sobre o assunto. Procurei em meu material uma caneta para anotar, mas percebi que eu havia esquecido. Cutuquei um aluno que estava sentado à frente. Ele me encarou surpreso, endireitando os óculos no rosto.

-Teria uma caneta para me emprestar? - Perguntei. Ele arqueou uma sobrancelha, um tanto receoso, quase desconfiado com a minha pergunta. Eu já havia percebido essa característica em alguns humanos. Eles não gostavam muito de emprestar suas coisas. Eu até entendia até certo ponto. Em outros, parecia irracional. No entanto, eu percebia que quanto mais eles tinham, menos eles gostavam de dividir. Parecia loucura, mas era a realidade.

-Ah, eu só tenho essa. - Respondeu mostrando a caneta que tinha entre os dedos. Mentiroso. Sua voz não vacilou quando ele mentiu. No entanto, eu sabia muito bem como reconhecer um mentiroso quando via um. Eu quase ri da fraca capacidade do humano de mentir. Talvez eu devesse ter tido compaixão e ensinado o pobre coitado a mentir com mais decência. Porém, preferi deixá-lo acreditar que ele realmente tinha conseguido me enganar.

-Tudo bem. Obrigado mesmo assim. - Sorri.

Ele se virou para frente de novo e eu contive um sorriso maléfico. Esperei ele posicionar sua caneta em suas anotações. Olhei discretamente para os lados, para ter certeza que ninguém tinha os olhos sobre mim e lancei apenas um fiozinho de magia na caneta do meu colega. A caneta explodiu vazando toda a tinta azul em sua roupa de marca. Contive um sorriso vitorioso. O garoto se atrapalhou, tentando limpar a sujeira que tinha em todo o seu material e em sua roupa.

- Está tudo bem? - Perguntei baixo ao atrapalhado, fingindo não saber o que tinha acontecido.

- Minha caneta estourou. - Explicou confuso. Fingi surpresa, franzindo a testa.

-Ah! - Suspirei. Ele deu de ombros. - É uma pena que você só tinha essa, não é? - Sussurrei, fingindo um tom de pura inocência.

O garoto deu um sorriso sem graça. Preso na própria mentira. Se ele pegasse uma nova caneta ali, ficaria claro que ele tinha mentido para mim, o que eu já sabia. Entretanto, ele nem imaginava que eu sabia disso. Era óbvio que ele era orgulhoso demais para admitir o que fez. Então, ele teria que manter sua mentira até o fim. Sem anotar completamente nada.

Voltei a prestar a atenção na aula, contendo uma risada. Eu sabia que eu não valia nada mesmo. Nem um tostão furado. Se eu me importava com isso? Nem um pouco.

As minhas aulas seguintes passaram rapidamente. Todas bastante exaustantes, ainda sim muito interessantes. Quando deixei o prédio da faculdade estava começando a garoar. Por alguns momentos tive a ligeira sensação de estar sendo seguido por alguém. Ignorei isso. Não deveria ser nada. Segui direto para um Café, como de costume. Eu sempre passava lá depois de minhas aulas. Era um bom lugar para estudar. Silencioso e confortável. Abri a porta do local que não estava muito cheio e fui direto ao balcão de pedidos. A sra. Claire era a dona do estabelecimento. Era um mulher de uns sessenta anos, de estatura baixa e com a língua bem solta para falar o que bem entendia e sempre que queria. Uma humana admirável.

-Se não é o meu cliente favorito! - Exclamou quando me viu. Esbocei um sorriso. - O de sempre, querido?

-O de sempre, sra. Claire. Um capuccino, por favor.

Ela sorriu, anotando o pedido.

-Devia experimentar o novo cupcake. - Sugeriu. - De nozes. - Arqueei uma sobrancelha, observando-a pegar o meu copo de capuccino. - Talvez o darei como cortesia da casa. - Piscou um olho para mim e me entregou meu pedido junto com uma caixa com dois cupcakes no sabor de nozes.

-Obrigado, sra. Claire. - Depositei um beijo no dorso de sua mão. - Já lhe disse que está encantadora hoje? - Ela deu dois tapinhas carinhosos em minha bochecha.

-Você é um sem-vergonha e libertino, Nerfi. - Gargalhou. - Quem não o conhece que te compre. - Contive um sorriso. - Mas... - Cochichou. - Tenho que confessar que é um refresco para os meus olhos. - Soltei uma risada. - Pena que eu não sou mais nova... - Sorriu. - Mas, vá! Não tome o meu tempo com essas besteiras. - Disse bem-humorada.

Paguei o capuccino e agradeci antes de tomar um lugar próximo à vidraça do café. Liguei o notebook, me concentrando em meu trabalho. Bebi um pouco da minha bebida, sentindo a sensação de estar sendo vigiado de novo. Por Odin! Alguém estava me seguindo. Terminei o meu lanche rapidamente e deixei o café em direção aos dormitórios. Andei o mais rápido que eu pude. Estava sendo seguido. Não conseguia ver por quem, mas eu tinha certeza. Cheguei em meu dormitório e tranquei a porta.

-Olá, Nerfi. - Uma voz grave falou. 

The Mischievous Prince - Spin-offOnde histórias criam vida. Descubra agora