◇Crystalline◇

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-Janeiro de 2013, fevereiro de 2013, setembro de 2013

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-Janeiro de 2013, fevereiro de 2013, setembro de 2013. Essa aqui na pilha de 2014. -O Lee dizia baixinho, conferindo a pilha de revistas, enquanto a editora organizava planilhas. -Faz tempo que não vejo pessoas utilizando cópias físicas no ambiente de trabalho. Vocês costumam consultar os exemplares impressos sempre?

-É uma mania que peguei com o pessoal de Seul -Helena dizia, concentrada no monitor - a sensação da revista física também conta como referência. Foi um costume que trouxe comigo, por isso não exijo que os outros me ajudem nesse trabalho.

-Ah, o mesmo motivo pelo qual eu gosto de revelar em analógico - Jinki disse satisfeito, percorrendo as páginas de algumas revistas.

-É verdade - Helena sorriu, concordando. - Talvez eu não tenha me habituado em fazer tudo 100% digital. Ainda tenho necessidade de tocar nos papéis.

-Coisa de gente que nasceu antes da internet - O Lee brincou, tateando mais uma garrafinha de chá gelado sobre a mesa. Helena acabou o observando por alguns instantes, curiosa.

-Sabe, sinceramente não entra na minha cabeça você ter vindo trabalhar aqui -Ela disse - A maioria das pessoas daria tudo pra ter o tipo de trabalho que você tinha.

-Bem... É que eu... Eu precisava criar raízes, sabe? - Ele respondeu reflexivo -Pode não ter sido uma boa ideia ter vindo trabalhar aqui nesse momento da minha vida, mas achei que deveria tentar. E você? O que te trouxe pra esse lado do planeta?

-Talvez a minha incapacidade de criar raízes - Helena dizia, enquanto fazia anotações -Eu sentia que precisava de algo diferente. Meu plano na verdade era passar só um ano aqui, ir pra Seul, passar mais um ano e ir pra Taiwan, ou onde quer que houvessem oportunidades. A realidade é que a gente cansa um pouco de correr. Acho que ninguém consegue viver sem fincar raízes mesmo.

Na maior parte do tempo o Lee continuava empilhando, mas parecia compenetrado no que ela dizia, pensativo. Havia de certo algo diferente em Lee Jinki.

-Eu sei que não é da minha conta - Ele dizia, ponderando - Mas notei que tem estado mais tensa nos últimos dias.

-Bem, minhas costas não me deixam mentir, - Helena completou - estamos com muito trabalho e uma equipe enxuta.

-É só relativo a trabalho mesmo? - ele apanhou mais uma garrafinha de chá gelado e, abrindo-a, entregou a Helena, enquanto sentava-se à sua frente.

-Na verdade não, mas sinceramente, eu não saberia te dizer exatamente o que tem me cansado. - A editora ponderou, dando um gole no chá. Já fazia algum tempo tudo parecia muito confuso em sua mente. Tudo acontecia rápido demais, e por mais que fosse louvável sua capacidade de adaptar-se com facilidade às situações, às vezes sentia parte de si se esvair nesse processo. Como quando você troca a água do vaso sempre, mas as flores continuam murchando.

-Acho que sei como é. Espero que as coisas melhorem pra você.

-Espero que encontre o que procura -Helena respondeu, erguendo a garrafa num brinde, tentando ser mais otimista. E ela assim o desejava, não só para ele, mas também para si. O Lee correspondeu, rindo meio tímido.

-Acho que em parte sim, talvez eu possa dizer que fiz uma amiga hoje.

-Não sou tão amigável quanto pareço -Helena brincou, deixando o Lee surpreso.

-Não foi o que Minho me disse sobre você - ele deixou escapar o comentário, deixando Helena curiosa.

-Ah, então vocês estiveram falando de mim - ela apertou os olhos, irônica, mas de certa forma tentando disfarçar o fato de que aquele era um sinal de interesse da parte do rapaz. Ele meneou com a cabeça, envergonhado, bagunçando as mechas castanhas da própria nuca, recostando-se na cadeira novamente.

-Ah, isso soou péssimo, não foi? Bem, você me pegou mesmo - Ele pousou os braços sobre a poltrona, de olhos fixos na garrafinha em sua mão -Talvez eu tenha perguntado sobre você, sim. Não que tenha sido uma entrevista, ah, assim vou parecer um stalker. É que... Bem, vocês pareceram muito próximos naquele dia que ele veio aqui, e quando conversei com ele por telefone, bem, seu nome acabou surgindo no meio.

-Ah, tudo bem. - Helena disse sem jeito, sentiu o rosto corando. O Lee parecia introvertido e em seu próprio universo sempre, mas era difícil não ter a atenção fisgada pelos olhos do rapaz. Algo na sua presença era interessante, mas por mais que observasse, muito pouco se podia concluir sobre ele. Um homem decerto muito polido, mas alguns gestos despretensiosos deixavam escapar algo sobre ele, algo mais profundo de si mesmo, algo que Helena ainda não sabia descrever. Sentia agora que não era a única observando atentamente.

Já era tarde quando ambos saíram do prédio e o Lee insistiu em esperar o táxi com Helena. Havia sido um dia longo, mas as horas restantes haviam passado de forma mais leve. Chegando ao apartamento, Helena foi de imediato até o banho, sentiu as costas reclamarem depois da ducha.

As noites pareciam ficar cada vez mais quentes, e a insônia a fazia persistir por horas se revirando na cama, até que desistiu e resolveu caminhar um pouco. Levantou-se da cama ainda sentindo a tensão sobre o pescoço gerando fisgadas constantes. Tomou alguns relaxantes e saiu do cubículo olhando ao redor com cuidado, com o hobby sobre o pijama e pantufas nos pés. Ao longe alguma música tradicional tocava no bairro. Provavelmente alguma padaria já estava abrindo àquela hora.

Helena apoiou-se no para-peito do terraço do prédio, olhando a cidade ao redor de si. As Luzes de Tóquio reluziam ainda frenéticas no horizonte, e as árvores do bairro pareciam quase imóveis no calor da madrugada. Helena apanhou o celular no bolso, e permaneceu com a tela acesa alguns instantes, até que começasse a digitar.

-Kibum, você tá aí?

Digitou e apagou de novo algumas vezes antes que conseguisse enviar, e quando o fez, permaneceu imóvel, na esperança de que ele visse, ou não. Um misto de ansiedade e culpa atravessou seu peito. O que ela poderia fazer? Ela não podia contar. Não agora. Mas o nome de Daiso ainda perturbava sua mente, sentia-se encurralada e impotente, e por mais que estivesse confiante de que acharia uma solução, por vezes sentia que era trabalho demais pra conseguir suportar. E ele era o único daquele lado do planeta que parecia ouvi-la tão bem. Com quem ela já pôde compartilhar suas mais legítimas frustrações.

Havia sido um dia confuso. Pensava em Kibum. Pensava em como se sentia só. Pensava às vezes que ficaria bem, mas a sensação era de que nunca ia passar. Pensava em sua conversa com Jinki, e em como, de várias formas, ela se via nele, mas ao mesmo tempo parecia ser alguém completamente diferente e misterioso. Helena se perdia em devaneios com o polegar sobre a opção de apagar a mensagem já enviada, mas sem a coragem de pressionar. Ele iria demorar a ver, e quando visse, talvez perguntasse o que estava acontecendo, ou talvez não dissesse mais nada, e isso ela sentia que não poderia superar. Não estava pronta pra lidar com isso. Não naquele momento. Não valia à pena o risco. Não agora. Mas a tela se acendeu primeiro, antes que pudesse se arrepender de seus próprios impulsos.

-Oi, Helena. Como você está?

ONE OF THOSE NIGHTS: TOKYO BRIDGESOnde histórias criam vida. Descubra agora