Revelações

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Na terça feira fui novamente para o orfanato, Soraya me deixou uma pilha de papéis e foi para o seu quarto com uma desculpa esfarrapada, a preguiça continuava em seu corpo.

Minha tarefa era organizar o histórico de algumas crianças que tinham passado pelo orfanato, segundo Soraya ela já tinha começado mas eu não percebi nada disso. Os registros estavam todos de forma escrita em várias folhas velhas e precisavam ser passados pro computador pra ocupar menos espaço.

No meio da bagunça que eu me encontrava acabei avistando um rostinho familiar, um garotinho bochechudo e branquinho: Antônio. É... o tempo havia sido generoso, mas lhe tinha dado algumas espinhas conforme lembrei na foto que eu vi.

No cantinho direito das folhas havia uma pequena foto de cada criança, de todas as formas que se podia imaginar, a maioria havia sido transferida de outros orfanatos para o da tia Carlota.

Minhas costas já estavam doendo, mas ainda faltava meia hora pro meu intervalo, parecia que aquilo não ia acabar nunca e só estava me atrapalhando, precisava procurar provas contra Soraya no meio daqueles documentos e não ficar fazendo cadastros de crianças que já estavam bem longe dali, deveria haver alguma coisa...

De repente olhei pra uma folha que despontava em meio às outras, a foto que ela trazia teimava em querer aparecer, peguei atentamente e examinei, poucas informações, mas aquele rosto não me seria desconhecido, e aquele olhar... jamais.

Era eu.

Com minha franja infantil, meus cabelos até bem comportados, e as bochechas rosadas, um rosto sério pra uma foto que eu nem sabia pra que era. Havia sido tirada no orfanato da tia Rita. Lembrava malmente.

No meio do meu devaneio Soraya irrompeu porta adentro e eu acabei dando um pulinho na cadeira e segurando a folha contra o corpo.

Soraya nem ligou pra mim e ficou bisbilhotando pelo escritório.

_ Algum problema Soraya?

_ Nada. _ resmungou ela.

Ela veio até mim e começou a abrir e fechar as gavetas da escrivaninha. Meu corpo se arrepiou.

_ E então, está concluindo? _ perguntou.

Concluindo?!

_ É... estou quase lá...

O papel em minha mão atraiu o olhar de Soraya, parecia que minha foto tinha um ímã que chamou sua atenção.

_ Então você já está por aqui... _ ela falou, mas parecia que não era comigo, ou era, mas ela não sabia. E puxou o papel da minha mão. _ Essa aqui era uma pestinha... _ Soraya abriu um sorriso.

_ Sério? _ tentei disfarçar.

_ É. Por quê? Pensou que esse rostinho de anjo era de um anjo mesmo? _ Soraya riu mas rapidamente seu rosto se fechou. _ Ela era um demônio isso sim. _ murmurou.

_ Nossa, desse jeito, parece até verdade...

Soraya me encarou.

_ Você acha que eu estou inventando?

Balancei a cabeça negativamente.

_ Você sabe dos anos de experiência que eu tenho nesse orfanato né? Então você deve ter uma ideia de que já passaram por aqui todos os tipos de pestinhas possíveis. E não se engane, eles não são tão inocentes quanto se imagina...

_ E essa garotinha... Laura_ falei olhando pra folha, fingindo ler_ ela aprontou muitas pra você?

_ Nem me fale... _ Soraya respirou fundo_ se ela permanecesse no lugar dela seria sido tão mais fácil...

_ Como assim?

_ Ah... _ Soraya pareceu ter saído de um devaneio_ nada, nada, esquece. Volte ao trabalho. Quanto mais cedo você terminar isso, mais cedo nos livramos desses papéis.

_ Soraya, e quanto às fotos? Precisamos escaneá-las.

_ Ah... vamos dar um jeito nisso. Se bem que eu não queria mais ver nenhum desses rostos nunca mais. _murmurou ela e saiu do escritório.

Fiquei paralisada. Infelizmente o desejo de Soraya não seria realizado porque o meu rosto tão indesejado estava diante dela todos aqueles dias. 

CHIQUITITAS - RevengeOnde histórias criam vida. Descubra agora