I. First.

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[#001] PRIMEIRO — Aquela sobre os idiotas que acreditavam no amor.

Quando o avião com destino a San Francisco finalmente aterrissou, o meu estômago se retorceu.

Naquela época, eu era um jovem no final de seus dezenove anos, beirando a chegada da marca das duas décadas. Era a primeira vez que eu vinha ao Ocidente, e o pensamento de voltar pairava na minha cabeça a cada passo dado pelo aeroporto. A mudança não foi exatamente planejada e eu estava uma verdadeira pilha de nervos.

Fui agraciado com uma bolsa de estudos integral na prestigiada Universidade Arlet Jaeger, localizada em terras estadunidenses, mas também tive um ótimo desempenho no vestibular da grandiosa Yonsei, e era lá que eu queria estudar. Entretanto, houve um pequeno desentendimento entre a minha pessoa e aqueles com quem eu divido o sangue, e vovó, a única parente que me apoiou nesse conflito, disse que passar um tempo longe daqueles urubus faria muito bem para mim. E fez, inicialmente.

A questão é que fazer um mudança dessa escala, sem muitos planos e sem companhia, pode ser uma coisa assustadora — e foi. Veja bem, as únicas pessoas que eu conhecia neste país eram artistas dos quais eu não poderia sequer me declarar fã, a minha suposta fluência no idioma era um tanto questionável e as diferenças culturais chegavam a ser cômicas de tão extremas. Resumindo, tudo era novo e esquisito.

Ao ver-me livre das paredes geladas de cor metálica do aeroporto, dei uma olhada de leste à oeste no que havia diante de mim. Muitos carros, muita gente, mas nada que realmente chamasse a atenção. Nem mesmo a lua estava visível naquela noite.

Agarrei a barra da mala de rodinhas que estava comigo com mais força conforme comecei a andar pela fachada do local, tendo o meu primeiro contato com a brisa abafada da Califórnia. Havia um banco branco mais adiante, e uma placa colada em uma das paredes externas do próprio aeroporto indicava que era um ponto de táxi, coisa que já estava óbvia pela quantidade de veículos desse tipo estacionada nas redondezas. Ali, confortavelmente acomodados, estavam três homens que conversavam aos risos.

As risadas, entretanto, cessaram quando eu limpei a garganta, chamando a atenção destes para mim. Um forte arrependimento me atingiu em cheio no mesmo segundo, mas a vontade de chegar na minha casa nova era muito mais intensa.

— Posso ajudar? — o taxista que direcionou-me a palavra tinha uma aparência que poderia ser descrita como caricata. Bigode grosso, camisa polo azul, calça jeans, botas marrons e um boné vermelho. Se ele me dissesse aleatoriamente que era dono de um caminhão, eu não duvidaria nem por um milésimo.

— Algum de vocês está disponível para fazer uma corrida até a rua… — Sempre tive alguns problemas de memória. Com a mão livre, cacei um papel com o endereço anotado. — Ah, não é rua, perdão. Até a Avenida Mirai?

— Claro — o mesmo homem disse, colocando-se de pé. Em um aceno, ele guiou-me até o veículo que nos levaria até o destino: um carro amarelo com uma faixa de quadrados pretos e brancos cortando sua lateral, a qual identificava sua função. — É pertinho de Chinatown, adoro dirigir para aqueles lados.

A entonação dele não foi agradável. Maldosa, quase maliciosa. Cheguei a repensar a decisão de entrar em seu carro antes de realmente fazê-lo, mas, ao fim, concentrei-me no fato de que provavelmente seria um percurso breve. Cheirava à bala de hortelã.

Enquanto o indivíduo bigodudo ajeitava a mala no compartimento da traseira do veículo, eu soltava a mochila pesada que estava carregando nas costas no assento ao meu lado. Optei por sentar atrás, com o rosto colado em uma das janelas.

— Qual é o número da sua casa? — assim que adentrou o transporte, o taxista questionou. Ele colocou o cinto, mas não fez nenhum comentário sobre eu não estar utilizando o mesmo.

cherry cola | taekookOnde histórias criam vida. Descubra agora