Era normal que apenas pessoas que estivessem no plano espiritual, aqueles que já haviam morrido, conseguissem enxergar os messorens em suas viagens ao mundo humano.
Mas existiam humanos especiais, que nasceram com o dom de ver e sentir o outro lado. Alguns deles usavam disso, para ganhar dinheiro em cima da fé alheia, outros realmente verdadeiros, usavam seu poder para ajudar aqueles que queriam se comunicar com o outro lado. Eram conhecidos como médiuns, xamãs, ciganos, profetas ou sacerdotes. Diziam-se poderosos e alguns eram até tratados como divindades.
Ainda assim, existiam aqueles que decidiram esconder do mundo o seu dom, por desejar viver como pessoas normais.
Dentre esse seleto grupo, existiu uma mulher. Filha de Liz, Samila.
Samila nasceu e viveu em uma terra onde santuários dedicados a deuses eram sagrados. E para cada santuário existia um sacerdote. Aquele que nascera com o poder especial dado pelos deuses para proteger o santuário e a cidade de todo mal mundano.E naquela pequena cidade, a criança que nasceu com o dom era ela. Samila nunca quis seguir os passos do grande ancião, seu avô. Mesmo assim o fez, até que chegou o fim de sua adolescência, quando aos seus dezenove anos, a garota se apaixonou a primeira vista. Pelo filho mais velho de um fazendeiro devoto, Lourenzo.
Quando uma sacerdotisa nasce, ela recebe o dom de enxergar tudo aquilo que está oculto aos olhos humanos. Além dos messorens, sacerdotes também conseguem se comunicar com almas perdidas que vagam pelo plano terrestre, conhecidos como espíritos.Depois da morte do grande ancião, Samila seria consagrada como a noiva do santuário. E diferente dos sacerdotes homens, que eram incentivados a procriar, ela teria que permanecer virgem. Para servir aos deuses. Sendo assim, ela não poderia se casar e nem ter filhos.
Lourenzo, era filho mais velho de um fazendeiro que morava próximo ao santuário. Extremamente religiosos, a família dizia ter passado por um grande milagre depois da morte de sua matriarca. Então iam quase todos os dias até o templo para agradecer. Logo os dois jovens começaram a ficar cada vez mais próximos, e como resultado, a vontade de servir aos deuses do santuário se distanciava ainda mais do futuro de Samila.
Com apoio de sua mãe, e desgosto de seu avô, Samila fugiu com o seu amado da pequena cidade. Viveu feliz por um curto prazo e casou-se ainda muito jovem.
Nesse meio tempo a hora da partida do grande ancião acabou chegando. Há aqueles que diziam que o mal havia se instaurado no templo e nos moradores daquele lugar, por consequência da abdicação da futura sacerdotisa.
Ainda assim, Samila e Lourenzo não voltaram. O amor que sentiam um pelo outro era mais forte que qualquer boato que havia se espalhado.
Alguns anos mais tarde, o jovem casal foi agraciado com a benção de seu primeiro filho. Mas as coisas não ocorreram tão bem quanto planejado pelos dois.
Nevou muito no dia em que a criança nasceu, era uma terça feira. Os carros e trens estavam parados, impedindo a locomoção até o hospital mais próximo. Era como se tudo antecipasse, o que ali viria a acontecer. Samila, teve febre e ao mesmo tempo entrou em trabalho de parto. Duas semanas mais cedo do que era esperado.Deitada sobre sua cama, e sentindo uma dor que se assemelhava a vários ossos sendo quebrados de uma só vez. Ela sabia que uma hora ou outra chegaria, sabia o que esperar. Mas não imaginava que fosse tão de repente.
No seu sexto mês de gravidez, Samila sofreu um grave acidente de carro, enquanto atravessava a rua com algumas sacolas de mercado. Ela viu algo parado no meio da estrada. Uma sombra espessa envolta por uma névoa estranha, que por alguma razão parecia olhar em sua direção.
Acostumada com as sombras e as vozes desde criança, ela pensou ser mais um dos chamados espectros que sempre a seguia. Esperou o sinal fechar para os veículos e então atravessou.Nesse momento em diante tudo pareceu um clarão e quando se deu por si, ela já estava no chão, agora ensanguentado. Viu que a sombra se aproximava cada vez mais, e então parou ao seu lado, tomando a forma de um homem de cabelos longos, negros, e olhos penetrantes cor de âmbar.
Ele agachou perto dela e a olhou com seus olhos quase hipnotizantes.
— Salve-o. — Pedia Samila, — Por favor, o meu bebê. — Continuava em meio aos gemidos agonizantes.
Logo os olhos daquele homem se estreitaram desconfiados. Ele olhou para os lados como se procurasse saber com quem ela estava falando.
— Como consegue me ver? — Questionou o rapaz. Ele parecia incrédulo.
— Você.. é um deles? — Perguntou Samila com a voz fraquejando. Agora ela mal conseguia enxergar, percebeu que estava prestes a desmaiar. — Me ajude, eu estou grávida. Por favor. — Implorou.— Eu não posso. Eu não sei como você consegue me ver, mas, eu tenho que ceifá-la. — Respondeu. — Sua hora chegou. — Falou o homem erguendo uma das mãos em direção a jovem mãe.
— Não! Eu imploro. Espere só até o meu bebê nascer. — Pediu mais uma vez e logo depois apagou.
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O ladrão de sonhos
FantasíaEm um universo de seres humanos e criaturas capazes de controlar sonhos e devorar almas, nasce uma garota que mudaria toda a história. Protegida por uma sombra que toma a forma de um belo rapaz de olhos amarelados. Margot, a menina incapaz de sonhar.