CAPÍTULO 02

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Ruan Callegari

Sabe aqueles dois anos que passam voando?

Quando dei por mim, Xandao o dono da boca batia na porta.

Meu pai aproveitou o acordo para se drogar ainda mais.

Eu juro por Deus que toda vez que ele aparece na minha frente eu tenho vontade de por algum veneno na bebida dele e vê-lo agonizando pelo que fez com a minha mãe e também comigo.

Era meu aniversário de dez anos e eu só queria jogar mais uma partida de futebol com os moleques da rua e pelo número alto de pessoas na porta do barraco eu soube que minha parte do acordo deveria ser cumprida.

Eu só tinha dez anos.

Levanto coçando os olhos e lá está ele de olhos vermelhos dizendo claramente que para as sete e meia da manhã ele não havia dormido.

Sigo o seu comando de ir caminhando a sua frente até a boca que alguns garotos iriam me treinar e que qualquer coisa era para pedir a ele pessoalmente.

Meu cargo era fogueteiro, ou seja, eu deveria sempre avisar quando a polícia aparecia no morro.

Depois virei aviãozinho, que no jargão policial significa a pessoa que leva o tóxico para um comprador e volta com o dinheiro para o traficante dono da droga.

Aos treze, eu era o maior vendedor de drogas do Xandão.

Ao longe eu avistava Marianny.

Ela possuía cabelos castanhos lisos e um tique nervoso de colocar o cabelo atrás da orelha.

Seu uniforme era um pouco pequeno para seu tempo.

Lembro da minha mãe e firmo comigo mesmo que nenhuma mulher fará comigo o que ela me fez sofrer.

Ainda lembro do raro cheiro de seu bolo de cenoura e que sua maior paixão material era um perfume natura farway que até lembra uma música.

Infelizmente ou felizmente sou enfeitiçado pela atração de Marianny e finjo não saber seu nome, mas seu sorriso faz com que eu vá contra todos os meus princípios e troque de sala.

Ela tenta se esforçar para parecer uma cdf e eu ajudo em suas maiores dificuldades usando suas dúvidas para me aproximar.

Mari era dona do sorriso mais lindo e triste que ja vi na vida.
Seu interesse era puro e me apaixonei perdidamente.
Seus beijos e carinhos me tirava do tormento que vivia todos os dias que fechava os olhos e por isso,  quis acabar com o dela também.

Os playba só eram meus "amiguinhos"  porque eu fornecia droga, caso contrario eu seria um rato para a sociedade burguesa
.
Apenas uma mina me cativou.

Vi verdade em seus sentimentos,  quando dizia que se sentia amada, podepá?

Com o dinheiro que recebo comecei a presentea-la.

Fico por entender porque que seu pai sendo advogado não compra coisas melhores para minha princesa.

Ela sempre tem fome, eu escuto sua barriga roncar.

Um dia depois da aula, nossos beijos estavam para lá de quentes.

Eu já não era virgem, mas tenho certeza que Mari era, então a levei em um hotel, sem segundas intenções mesmo já estando em um certo limite de excitação.

Almoçamos e vamos para o quarto afim de trocar de roupa e ir para uma das festas dos riquinhos de merda.

Ela ficou linda na minissaia e blusa rosa que comprei.

Ela me beija em forma de agradecimento e grudo minha mão na sua nuca desesperado.

-----Me faça sua Ruan.

Pensando que talvez ela queira dar algum golpe na pessoa errada me controlo e vamos para a festa que já moia há um certo tempo.

Faço meu serviço de liberação das drogas, recebo com bônus e vou atrás da minha garota que está fumando e rindo de qualquer merda.

-----O que está fazendo?

------Vendo gnomos ou seria unicórnio?

Merda.

Mil vezes merda.

Mari sai catando Cavaco e vou atrás dela.

Deram maconha a ela e eu não sei a quantidade.

Ligo para sua amiga e peço para ela pedir ao merda do seu pai ou da sua mãe para Mari dormir na casa dela e digo que explicarei depois.

Com muito esforço consigo levar Mari para o hotel e do momento risadas ela começa a chorar.

-----Por que ninguém me ama?

Eu já havia ouvido algumas vezes que ela se sentia um peixe fora d'água em casa porque todos só amavam a Melanie e o José.

Ela se odiava ser á mais velha porque só a haviam com obrigações.

-----Eu amo você.

-----Ah _____Sua frase incompleta anuncia a chegada de lágrimas e quando a manhã chega ela parece bem.

Mari me beija sem palavras dessa vez e nos amamos.

Eu parecia ter visto um passarinho verde e decido que por ela eu vou sair da boca.

Acho que os anos trabalhados lá, pagam todo o cortejo fúnebre da minha mãe.

Vou a lan house faço Curriculum para menor aprendiz e tento também vaga para trabalhar nos comércios da favela.

Quando liam meu endereço torciam o nariz como se tivesse escrito ali que eu era uma praga.

Bem, conforme a hierarquia do morro segue seus cargos e mesmo aos quinze anos Xandão me pós como gerente do morro e eu sei tudo que acontece ali.

DONO DO MORRO - é o cargo mais alto no morro. Ele é o dono da boca, e por isso o que recebe os lucros. No caso de morte ou prisão, seu cargo geralmente é ocupado pelo gerente geral. Não há idade mínima para ser "dono".

GERENTE GERAL - é o responsável pela administração da boca.

GERENTE DO BRANCO - é o responsável pelo tráfico de cocaína no morro.

GERENTE DO PRETO - é o responsável pelo tráfico de maconha no morro. Os gerentes (tanto de cocaína quanto de maconha) têm normalmente mais de 18 anos.

RESPONSÁVEL PELAS ARMAS - cuida do armamento do morro. É uma espécie de subgerente da boca.

SOLDADO - usa armas pesadas, faz a segurança dos morros e participa das guerras. A preferência é para quem já serviu o exército (por que sabe manejar armas), mas há alguns soldados com 15 anos.

VAPOR - cuida da venda das drogas dentro da boca.

AVIÃO - vende drogas para as pessoas que vão comprá-las no morro. Geralmente são crianças de 7 a 12 anos.

VIGIA OU OLHEIRO - fica vigiando a entrada do morro para ver se a polícia ou inimigos estão subindo. A preferência é para crianças e deficientes físicos.

FOGUETEIRO - solta fogos avisando da chegada da polícia ou de inimigos. Pode ter qualquer idade.

* Fonte: Divisão de Repressão a Entorpecentes da Polícia Federal.

(Completo)Desafio-A História De Ruan CallegariOnde histórias criam vida. Descubra agora