Helena sentia como se tivesse entrado em uma realidade paralela.
Tipo, sério. As pessoas daquela escola eram loucas. Primeiro, havia todas as diferenças gritantes entre escolas públicas e particulares. Ela achava incrível que o colégio tivesse tanta estrutura, mas sinceramente, algumas pessoas dali que careciam de noção de mundo. Só que esse passava longe de ser o maior problema.
Eles levavam religião realmente a sério, e nem sempre num bom sentido.
Para começar, as garotas precisavam usar saias como uniforme. Os shorts eram só para a Educação Física. Em que século estavam, sério? E essa questão dos "bons costumes" parecia uma grande palhaçada hipócrita. Ela estava estudando lá há pouco mais de uns três meses (não considerando que julho quase inteiro tivera férias) e já tinha certeza que nem todos seus colegas eram virgens.
E então, tinha a questão mais irritante: o preconceito. Helena se acostumara a estar em um ambiente em que era normal ser assumidamente LGBT. E de repente caíra de paraquedas em uma cidade em que nunca via casais homossexuais andando de mãos dadas e em uma escola em que logo no seu primeiro dia já assistira uma aula de religião em que o professor usava a Bíblia para pregar abertamente contra a comunidade LGBTQ+.
Mas que porra.
Pelo menos seus amigos eram legais.
Quando decidiu que queria passar o recreio com Daniel, não fazia a mínima ideia de como aquela escolha seria importante e boa futuramente. Tomara aquela decisão pois o garoto parecia estar precisando de amigos. Nas trocas de professores, enquanto estava todo mundo conversando, ele ficava ali no seu canto, parecendo deslocado. A garota logo se identificou, afinal, ela também se sentia assim.
Lembrava-se de ter saído da sala com um Daniel de aparência muito hesitante, que a perguntou de maneira um tanto rude:
— Você não vai perguntar se é verdade?
— O quê? — ela questionou, genuinamente confusa.
— Se eu sou viado — ele respondeu, na telha. Helena pensou que o garoto parecia na defensiva.
— Isso é coisa sua. E ninguém devia ser taxado como "viadinho da sala".
Daniel visivelmente relaxou os ombros depois de sua afirmação. Entretanto, ainda meio desconfiado, perguntou:
— Por que você disse que era "melhor ainda" quando falaram que sou viado? Você é uma daquelas garotas que sonham em ter um amigo gay, quase como um mascote?
— O quê? Não! — Helena se horrorizou com a acusação. — Se eu quero ter um amigo gay, é porque acredito que no geral, eles são muito mais legais do que os homens héteros. E porque gosto de conviver com pessoas que também são LGBTs.
Daniel assentiu lentamente, parecendo novamente avaliá-la. Até que perguntou, mais amigável, com um tom curioso na voz:
— Que também são?
— Sou lésbica— ela declarou com simplicidade.
Ele sorriu, mas logo em seguida olhou em volta, verificando se havia alguém perto o suficiente para ouvir. Então, falou em um tom mais baixo:
— Sou gay mesmo. Mas não saia falando isso por aí, eles já me enchem o saco o suficiente por eu ter um jeito mais afeminado. E também é melhor você se cuidar, não ir contando sobre sua sexualidade para qualquer um. Sei que é uma merda, mas o bullying é pior.
Aquela escola era realmente um pesadelo, foi a conclusão a qual Helena chegou. Daniel provavelmente percebeu que ela estava assustada, pois falou, de modo tranquilizador:
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A trilha sonora de nossas vidas
Teen FictionHelena tem duas certezas em sua vida: A primeira é que música é sua paixão, e a segunda é que ela é, sem sombra de dúvida, lésbica. O que ela não tem certeza, entretanto, é como vai sobreviver mais um ano e meio no inferno chamado Colégio da Graça d...