Psiquiatra.

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No primeiro mês as consultas com o psiquiatra foram bastante tranquilas.

Zoro estava indo duas vezes por semana. Na primeira consulta praticamente ficou mudo durante todo o tempo, apenas concordando com a cabeça e respondendo evasivo as perguntas, mas, aos poucos, bem poucos mesmo, ainda que muito superficialmente, estava se abrindo com o doutor, falando de seus traumas passados e medos, mostrando as marcas que ele mesmo havia causado em seu corpo em momentos de fraqueza e desespero.

Sentia-se frágil e psicologicamente instável. Muita coisa ainda era mantida em segredo, guardada em seu coração apenas. Às vezes achava que era bem mais fácil de se abrir com seu amigo do que com aquele doutor esquisito. E ele era muito esquisito.

O psiquiatra não era o tipo de pessoa que costumavam enxergar como doutor. Um homem todo tatuado não era um estereotipo muito comum. Sem contar as olheiras marcadas e aquela cara de mau, provavelmente era considerado assustador pela maior parte de seus pacientes.

Na visão de Zoro, ele não era nada além de um psicopata drogado.

Pelo menos o diploma de doutorado em psiquiatria estava em um quadro na parede, sempre bem visível para os clientes. Parecia ser confiável, como deveria ser.

Zoro era muito fechado com as pessoas, então o uso de medicamentos acabou sendo necessário para as consultas serem mais simples e também para uma melhora mais rápida. Antidepressivos foram prescritos para ele e após hesitar muito, Zoro iniciou o tratamento com os medicamentos.

No segundo mês, um convite inesperado surgiu.

— Não quer sair comigo? Isso faria bem para você, sem dúvidas. — Era um convite disfarçado de recomendação profissional, como se ele estivesse fingindo se importar com o bem-estar de Zoro, assim como um médico deveria agir.

Aquele pedido sem sentido fora prontamente recusado. Talvez em um momento em que estivesse com uma maior fragilidade teria aceito sem pensar duas vezes, o que não era o caso. Zoro não era o tipo de pessoa que saía com qualquer um, especialmente alguém que definitivamente não fazia seu tipo. Bom, não que alguém além de Sanji fosse seu tipo.

Infelizmente, o mesmo pedido se repetiu no terceiro mês e Zoro aceitou sem pensar bem no assunto. Ele se arrependeria depois. Aquela sem dúvidas fora a pior decisão de toda sua vida.

Fazia quase uma semana que não se encontrava com Sanji porque aquela monstra havia ameaçado o loiro com um divórcio caso ele saísse para encontrar Zoro. Seu coração estava partido, o amigo estava com problemas em casa e com a família e Zoro sequer podia fazer qualquer coisa. Sentia-se fraco, incapaz e, novamente, percebeu que era inútil.

Ele não conseguiu salvar Kuina e não conseguia ajudar Sanji, era um imprestável sem esperanças. Por que ainda estava vivo? Queria morrer... Aquela fora sua primeira crise depois de meses de tratamento e muito apoio. Machucou a si mesmo e condenou-se por não ter conseguido dar um ponto final ao seu sofrimento mais uma vez, especialmente por ter feito algo que o loiro pedira tantas vezes para evitar. Sentia-se culpado por todos os problemas que acontecia ao redor dos dois, mesmo que sequer tivesse alguma culpa. Não era culpa de Zoro que a esposa de Sanji era uma louca, mesmo assim ele sempre se culparia por tudo, aquilo era tão fora de seu comum que chegava a assustá-lo às vezes.

O loiro nunca soube daquele encontro, ele jamais poderia saber ou se sentiria culpado e a culpa não era dele, era de Zoro por ser tão fraco, por ser um perdedor.

Ao perceber a situação instável de seu paciente, o doutor soube que aquele era o momento perfeito para tirar proveito. O convite não era inocente, havia centenas de intenções ocultas que não foram percebidas por Zoro, ou talvez ele tenha notado e só estava tão mal que queria se destruir de uma vez. Aquilo era para seu bem, não? Ele fingiu que acreditou.

Naquela noite o doutor o induziu a ir para a cama. Sempre usando a desculpa de que isso faria bem para sua saúde, de que assim Zoro melhoraria, seria curado, superaria seu trauma. Zoro sabia que não, mas queria ser machucado, os pensamentos autodestrutivos estavam cada vez mais presentes em sua mente.

Após muitas bebidas que mais pareciam álcool puro, eles foram para um motel. Zoro era muito resistente a álcool por mais forte que fosse, porém naquela noite ele estava bem mais alegre que de costume. Não possuía inteligência o suficiente para perceber que havia algum tipo de droga que ele desconhecia em sua bebida e por isso a manipulação estava sendo tão fácil.

Não era apenas o trauma que o afetava, o doutor havia percebido que um coração partido também existia e o culpado daquilo possuía um nome com míseras cinco letras. Não havia motivos para não usar isso contra a vítima, era isso que mais excitava caras como ele, um doente completo.

— Imagina que eu sou aquele que você ama... — O médico sussurrou perto do ouvido de Zoro, recebendo um olhar completamente vazio e sem sentimentos dele, mesmo drogado, ainda era ele, não se comportaria de forma entregue e fácil com um desconhecido, ele não era assim e aquele homem não era quem amava. — Me chame de Sanji.

Zoro sentiu nojo daquele pedido e não correspondeu nenhuma carícia. Não existia tesão, não existia amor, sequer o desejo estava presente. Ele não conseguia imaginar Sanji ali, o loiro não o trataria daquela forma, Sanji era diferente, com ele seria algo especial que jamais esqueceria. Seu amigo não era o tipo de homem que faria essas coisas com alguém, ele possuía princípios, era um homem perfeito, digno. Imaginá-lo o fodendo naquele momento estava totalmente fora de cogitação. Não estava ali para sentir prazer, apenas queria se destruir de uma vez por todas, acabar com sua própria dignidade, ou era isso que a droga o fazia pensar.

Mesmo extremamente bêbado, infelizmente estava consciente, ainda conseguia discernir os fatos. Sua mente tentava enganá-lo para aceitar o ato, para pensar como apenas sexo consentido, que ele queria, mas não era assim, quando as coisas foram longe demais, ele se odiou por ter acabado naquela situação patética e detestável. Jamais imaginou que simplesmente congelaria em uma situação daquelas a ponto de sequer poder reagir.

Não estava de acordo. Os toques do doutor o davam desgosto. Machucavam, o davam ânsia, o fazia desejar ainda mais a morte. Sentia que estava vivo com aquela dor física, porém aquela não era a forma correta de se sentir vivo. A dor era sim bem menor do que a dor que sentia em seu coração despedaçado. Dor física sempre seria menor que dor psicológica, e Zoro preferia assim, por isso sempre se machucava, mesmo Sanji pedindo para não o fazer, ele não percebia que o amigo apenas queria ajudá-lo para seu próprio bem. Mas, mesmo que a dor física fosse mais agradável, isso não significava que desejava ser tratado daquela forma por um cara desconhecido, por quem não sentia absolutamente nada além de desgosto e nojo, especialmente por aquele ser seu psiquiatra que deveria ajudá-lo a superar suas fraquezas, seu trauma, o que aconteceu com Kuina. Zoro queria morrer.

Ele foi estuprado naquela noite. Em momento algum consentiu com o ato nojento. Não chorou, não gemeu, não sentiu prazer. Não reagiu, seus olhos não demonstraram nenhuma resposta mesmo a vontade de chorar sendo grande, ele só queria que aquilo acabasse de vez, queria perder a consciência e se esquecer do que aconteceu. Desejava nunca ter entrado naquele consultório, desejava que nunca tivesse deixado Kuina para trás por ser um completo imbecil, desejava ter chegado a tempo para salvar sua pessoa preciosa, desejava ter revelado seus sentimentos ao loiro muito antes daquele casamento idiota ser concluído, ou simplesmente tê-lo sequestrado e fugido.

Queria morrer.

Precisava ver Sanji.

PutrefactioneOnde histórias criam vida. Descubra agora