7 Meses Depois
O celular tocou ás 08:00. Mas agora era tudo diferente. Eu me sentei na cama com certo esforço e olhei para o lado e parei para olhar para a minha nova companheira inseparável: uma cadeira de rodas.
-Trambolho do inferno- eu pensei olhando para aquilo que ao meu ver representava toda a minha fraqueza e minha impotência.
Eu ainda tentava me locomover com a cadeira na minha nova casa enquanto meu pai arrumava tudo para que fosse confortável . Depois de tudo que aconteceu, meus pais se mudaram pra cuidar de mim. Eles sempre foram pessoas dedicadas então não era nada de novo.
-Bom dia, Matias. Sua mãe já está fazendo café.
-Eu estou sentindo o cheiro. Está bom
Eu vou para cozinha como se estivesse indo para um campo de batalha.
-Bom dia mi hijo- ela disse terminando de montar o café da manhã
-Bom dia mama- eu respondi no tom baixo que eu havia adotado depois do meu acidente.
-Eu fiz suco e tamales. Você quer?
-Eu não estou com muita fome mama.
-Querido, coma só um pouco. você não tem comido bem desde que...- ela parou a engoliu as próprias palavras. Era uma atitude que todos tomavam agora quando falavam comigo. Eu odiava essa atitude.
-Eu vou comer um pouco antes de ir falar com a Doutora Truesdale. Agora pode voltar a agir como uma pessoa normal?
Ela acena com a cabeça e então voltamos ao café. Depois, ela me ajudou a me aprontar e saímos.
-Chegamos, mi hijo. -Minha mãe saiu do carro primeiro e se preparou para me ajudar a descer e me sentar na cadeira. Tente tirar proveito da consulta dessa vez, tá bem?
-Eu vou , prometo
Eu entrei no prédio , peguei o elevador e fui até a sala da psicologa. Alice Truesdale, uma mulher de fala mansa e cortês que passava 1 hora querendo que eu expressasse e tentando me levar a aceitar toda a situação que aconteceu comigo , enquanto eu passava toda aquela hora querendo que um buraco no chão se abrisse e me engolisse para evitar toda aquela conversa.
-Senhor Guerrero, como você está hoje?
-Estou ótimo -respondo de forma irônica
-Como em todas as consultas?
-Sim.
Ela colocou seu caderno na mesa ao lado e me olhou profundamente.
-Matia, vamos ser sérios. Como você está sentindo desde que perdeu sua mobilidade? E fale sério comigo, por favor.
Eu normalmente era uma pessoa irritantemente apática nas sessões mas quando ela me pediu a verdade, eu literalmente despejei tudo na cara dela
-Você quer a verdade? Aqui está . Eu me sinto um invalido. E você sabe por que? Por que algum idiota em algum lugar da cidade, disparou a merda de uma arma para qualquer direção e isso me custou tudo o que eu era. Agora eu não consigo me vestir sozinho, não consigo tomar banho sozinho, não consigo nem ir ao mercadinho que fica a 10 minutos da minha casa sozinho. E agora até as pessoas que me odiavam me olham com pena e dizem que eu sou um modelo de superação. Dios mio, quando isso acontece eu tenho vontade de comer vidro.
- O que você falaria para essas pessoas que olha para você e veem uma sub pessoa?
-Eu mandaria todos eles a merda. Eu diria que eu posso estar paraplégico para o resto da vida, mas que nem por isso eu sou um idiota que merece pena ou condescendência. E diria para os curiosos que ainda que seja difícil eu ainda sou capa de ter uma ereção.
-Já te fizeram essa pergunta?
-Ninguém tem coragem mas todo mundo quer.
-Você disse que perdeu tudo o que você era. Você é um artista plástico. Não perdeu a mobilidade das suas mãos. Por que não está mais trabalhando?
Quando ela falou isso , raiva e tristeza se misturaram dentro do meu peito e eu disse lacrimejando
-Por que eu não consigo. Nada me vem a mente, é como se quando eu perdi o movimento das pernas também tivesse perdido a habilidade de fazer arte.
-Você não perdeu a habilidade de fazer arte Matias, você perdeu a força que te leva a querer ser um artista. É isso que você tem recuperar.
Quando ela disse isso, foi como se um soco me atingisse bem no estômago. E quase que magicamente havia chegado a hora do fim da consulta.
-Nos vemos semana que vem?
-Muito provavelmente não.
Eu saí de lá com mais raiva do que quando entrei mas não conseguia deixar de pensar no que ela havia me dito. No caminho de casa eu praticamente não falei nada com a minha mãe e foi assim no jantar. Durante a noite eu peguei o habito de ficar na janela do quarto, não pensando em nada . E nesse dia, meu pai veio falar comigo
-Tudo bem com você mi hijo?
-Sim. Estou pensando em algumas coisas.
-Querido eu preciso falar com você. Eu sei que você passou por muita coisa. A sua mãe e eu tentamos te dar espaço para você se recuperar e se abrir conosco quando quiser. Mas você tem ficado cada vez mais distante, não tem comido direito. não tem pintado ou esculpido e eu sei que é muito egoísmo da nossa parte, eu sei que é, mas- naquele momento meu pai começou a chorar- mas tá acabando conosco te ver assim tão desiludido e sem esperança. A Doutora Alice deu a sua mãe isso- ele me entrega um panfleto- é um grupo de apoio para pessoas que sofreram acidentes e que ficaram com alguma sequela. Você pode por favor dar uma chance?
Eu acenei com a cabeça concordando, mesmo não querendo realmente ir. Meu pai me abraçou como alguém que tirou um peso das costas. Eu decidi ir para poder aliviar a dor deles. Mal sabia eu que ao concordar em ir nesse grupo,eu conheceria aquele que mudaria tudo.
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Perfectly Imperfect
RomanceMatias Guerrero é um artista plástico que vivia a vida normalmente do seu jeito até que um dia ele é vítima de uma bala perdida que tira a mobilidade de suas pernas de forma permanente. Ele se torna uma pessoa fria e niilista . Um dia a muito contra...