38. Isto não é S. Paulo

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- Sim?!- Despertei confusa.- Oh...- Esfreguei os olhos cansada.

Estava cá fora, no jardim, a apanhar um pouco do Sol da manhã, na companhia da minha sobrinha, Catarina e um chá. Pelos vistos devo de ter adormecido e acordei aflita quando a cabeça caiu da mão.

- A noite foi mesmo complicada, hã?- Beijou a cabecinha frágil de sedosos cabelos negros da Vitória.

- Nem queiras saber.- Suspirei frustrada e bebi o resto do chá.- Devo estar horrível.

- Pois é, mas é melhor recompores-te. Henry chegou há pouco, está lá em cima no escritório com o Lucas, o teu pai e o advogado.

- É maravilhoso ver como têm de ser três homens feitos a decidir sobre a minha própria vida, enquanto eu fico aqui, literalmente a dormir.- Resmunguei zangada, olhando a chávena de porcelana com asco.

- Helena, são os homens que decidem sobre nós.

- Quando prometi a mim mesma que não seria assim comigo.- Revoltei-me.

- Mas conta-me, onde foram ontem?- Sorriu curiosa para aliviar o clima e contei entusiasmada como foi estar na Mouraria e as danças, a disputa deles dois, as apostas, Hetty...

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- Parece que estamos acordados então.- O advogado acabou de assinar e passou-me a caneta e o papel.

Engoli em seco com o desconforto. Não gostava das coisas assim: assinar um papel, como se Helena fosse uma propriedade finalmente comprada.

Era horrível.

O irmão também parecia desconfortável com a situação, porém o velho estava irredutível. Aposto que as negociações com o rei foram difíceis por culpa do marquês e não propriamente pelo feitio de João.

- De duque para conde...- Resmungou contrariado ao assinar.

- Um conde mais rico e bem posicionado que qualquer duque português.- Firmei a voz.- E sem dúvida alguma, mais novo.- Ousei exibir o meu sorriso mais arrogante para Eduardo.

- Podeis ir.- Lucas falou quando o marquês ficou apenas a encarar-me, a desafiar-me.

Não é culpa minha se ele imaginou uma vida ao lado de um velho caduco para a filha; no que depender de mim, Helena não toca em mais ninguém se não em mim.

- Uff.- Respirei fundo quando fechei a porta e senti algo molhado.

Toquei com as mãos nas axilas e reparei que tinha a camisa encharcada.

- Nervoso, sem dúvidas.- Corei embaraçado comigo mesmo e fui procurar pelas minhas coisas.

A governanta entretanto levou-me até ao jardim, onde estaria Helena.

Quando cheguei, ainda havia vestígios da noite de ontem, como confeites pela relva, mesas ainda a serem arrumadas e alguns talheres nos muros e nos buracos das árvores.

- Bons dias.- Sorri por cima do ramo de flores coloridas.

- Bons dias.- Responderam as duas, Helena e outra senhora, cuja cara não me era estranha.

- Para vós.- Estendi-lhe o buquê.

- Obrigada.- Pousou-o numa cadeira perto da mesa.- Mandei fazer café.

- Obrigado.- Disse desconfortável. Helena parecia conter algum desprezo.- Trouxe-vos isto também, pensei que pudesses gostar. É o meu livro favorito, ignorai as pontas gastas.- Sorri embaraçado.

- Obrigada, Henry.- Pegou-lhe com cuidado, admirando a capa, o titulo, as páginas e um pouco da história.

A Divina Comédia.

A Amante do ReiOnde histórias criam vida. Descubra agora