A Velha Igreja

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Assim que saíram da beira do mar surgiram os primeiros drones no céu. Eles faziam um barulho agudo peculiar e todos do grupo já conseguiam identificar pela recorrência em que ouviam. Seguindo os conselhos de Aline, todos cobriram seus rostos e continuaram andando tentando passar sem serem notados. Não demorou muito, eles vislumbraram uma construção antiga e toda branca, haviam portas e janelas pintadas em azul celeste, parecia algum tipo de construção muito antiga.

-- Enfim chegamos. -- Esta era a frase que todos já estavam esperando escutar de Aline pois já estavam exaustos de toda aquela confusão.

Aline então caminhou em direção da porta grande que ficava no centro de uma das paredes da construção. Ela segurou em um arco de metal que ficava no centro da porta, fechou os olhos como se estivesse tentando lembrar de algo. Depois de alguns instantes ela fez uma sequência ligeira de batidas na porta. Bruno olhou para Marcia espantado, como se reconhecesse aquele padrão de batidas. Aline continuava com o olhar fixo para a porta.

-- Você não reconhece, Marcia? -- Perguntou Bruno com o olhar de espanto.

-- Não faço ideia Bruno, o que é? -- Respondeu Marcia.

Enquanto isso, Aline fazia a terceira tentativa.

-- É código Morse. Uma vez eu ouvi algo similar em uma música clássica, e um senhor que estava ouvindo me disse que o compositor tinha usado esse tipo de comunicação na música. Só não lembro o que significa nem o que o compositor queria dizer com o código. -- Comentou Bruno.

-- Sim, é código Morse. Significa SOS. -- Concluiu Tom. -- E acho que você está falando de Bethoven, meu pai um dia me disse que as pessoas achavam que Bethoven tinha usado o código Morse na quinta sinfonia, porém o código foi inventado três décadas depois da composição. E não era esse toque que ela está fazendo, o da música significa V de vitória e é um pouco diferente.

Marcia e Bruno ficaram impressionados com a aula de Tom sobre música clássica e código Morse mas logo foram interrompidos com o clique que a porta fez, alguém a estava abrindo.

Quando a porta se abriu, a luz pôde entrar no cômodo e mostrar o amigo de Aline. Era um senhor quase sem cabelos, de estatura baixa e olhar sereno.

-- A sua benção padre Mauricio. -- exclamou Aline, curvando a cabeça em reverência.

O padre fez o sinal da cruz com os dedos sob a testa de aline e em seguida olhou desconfiado para as crianças.

-- O que lhe traz a essas bandas minha velha amiga? Espero que não traga problemas.

-- Venho lhe pedir sua proteção por alguns dias, apenas para eu me programar e pensar em que fazer. Essas crianças correm perigo. -- Respondeu Aline.

-- Bem, então temos problemas. -- Afirmou o padre, que em seguida concluiu. -- O exército tem me visitado quase todos os dias, eles me consideram um potencial traidor. Não que estejam errados é claro, mas seria perigoso para vocês.

Aline pegou nas mãos do padre, suspirou profundamente e em seguida fez mais uma tentativa.

-- Não temos a quem pedir ajuda padre Mauricio, inclusive a menina é filha de Izadora. Penso que devemos isso a ela ao menos.

Marcia, no mesmo momento, começou a entender a importância de sua mãe em algo maior. Ela não entendia bem o que era, mas sua mãe tinha a consideração daquelas pessoas.

-- Claro, devemos isso a Izadora. Afinal ela foi a pessoa à frente da educação das crianças das famílias da escória. Claro, entrem, vou tentar dar um jeito nas coisas. -- Respondeu o padre que em seguida concluiu. -- Mas temo que vocês devam ficar por poucos dias, eles estão na minha cola. Venham, sigam-me, vou providenciar um local seguro para dormirem.

Os meninos entraram e seguiram o padre. Eles passaram pela igreja, entraram em um cômodo logo atrás do altar, subiram uma escada em espiral de madeira. Quando terminaram os degraus da escada, se depararam com um corredor escuro, cheio de portas. Ele abriu a porta de um quarto grande.

-- Vou deixa-los dormindo nesse quarto grande. É o único que tenho disponível, então vocês precisarão se organizar. -- Afirmou o padre.

-- Está ótimo, obrigado padre Mauricio. Como sempre, generoso. -- Concluiu Aline.

O padre encostou a porta e Aline começou a pensar.

-- Vocês se conhecem a muito tempo Aline? -- Questionou Marcia.

-- Sim. Não sou daqui, sou de um outro estado. Um belo dia, eu vim para o Espírito Santo a procura de novas montanhas para escalar. Eu sempre gostei de montanhismo. Quando estávamos saindo para mais um dia de escaladas, no momento que saímos "boom!". Uma bomba foi lançada no acampamento em que eu tinha acabado de sair, muitas pessoas morreram naquele dia. Eu e os amigos que estavam comigo fugimos desesperados, eu caí e fui pisoteada pelos outros montanhistas, e fiquei muito machucada. Quando acordei, eu estava aqui nessa igreja, este padre salvou minha vida no dia que tivemos a tomada do país.

-- Nossa que triste. -- Você deve sentir falta da sua família, concluiu Marcia.

-- Sim, eu sinto. Eles já devem ter morrido e eu nunca mais consegui vê-los. -- Aline concluiu, virando-se. -- Vou tomar meu banho. Se organizem pois não podemos demorar para sair da igreja.

Todos tomaram banho e colocaram roupas limpas. Não demorou muito, o padre os chamou para descerem. Ao chegarem na cozinha havia uma sopa de legumes no centro da mesa e pratos para todos.

-- Você continua não comendo carne, Aline? -- Perguntou o padre. -- Lembro que você adorava comer sopa de legumes.

-- Claro, isso para mim é uma ideologia. Mas eu já tive que comer carne algumas vezes por necessidade. Eu carrego comigo aqueles belos dias, quando aprendi a ter minha própria horta padre. Um dia, quando toda essa confusão passar, quero voltar e morar aqui pertinho para cultivar na horta novamente. -- Aline sorria enquanto falava, estava nitidamente feliz em estar naquela igreja.

Quando acabaram de comer, o padre sugeriu que todos ficassem dentro do quarto o dia inteiro, e assim o fizeram. Os adolescentes se divertiram com mais uma campanha de RPG enquanto Aline, conversava com o padre.

Enfim, a noite chegou. Estava tudo correndo muito bem, mas Aline ainda não tinha conseguido planejar o que fazer.

-- Ainda não sei o que vamos fazer, estou tentando contato com o restante pelo BIP mas ninguém me responde. Vamos passar a noite aqui e amanhã de manhã vemos se teremos alguma resposta de alguém. -- Afirmou Aline.

Então todos juntaram suas coisas, pegaram alguns colchões e lençóis e fizeram suas camas. Foram dormir cedo, pois estavam exaustos.

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