VI - Malik Abalam

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Malik Abalam: do árabe, "Rei Abalam"


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A areia do deserto pinicava sua pele. O calor que irradiava do chão se intensificava com ventos quentes vindos de todas as direções. Para onde olhasse, só via mais e mais dunas de areia fina, se estendendo até onde sua visão podia alcançar.

O sol que brilhava sem piedade sobre suas cabeças o fazia questionar se realmente continuavam no inferno. Tudo ali parecia tão mundano.


— Voltamos para a terra? — finalmente deu voz a suas dúvidas. Asmodeus se virou com os olhos semi cerrados pelo brilho do sol.

— Não, mas eu diria que é perfeitamente igual. A diferença é que isso tudo é inacabável. — ele indicou o lugar todo enquanto andava de costas. — Os domínios são confusos para a mente mortal, mas com o tempo você vai entender.

— Domínios?

— Cada demônio tem o seu, alguns gostam de imitar o Mundo, outros apenas... Não há necessidade de ser físico quando se está entre-planos, é algo que sua mente mortal não conseguiria processar.

— Teoricamente, eu não deveria processar a morte, e aqui estou eu, andando e conversando com você.


O vento uivava, arrastando a areia consigo. Uma sinfonia naturalmente harmônica que era interrompida apenas por um som distante que não conseguia identificar.

A risada de Asmodeus chegou leve aos ouvidos, ele parecia em completa paz. O tecido de sua túnica e capa balançando ao ritmo dos sopros.


— Sua presença aqui é uma exceção, não a regra. Faz muito tempo desde que um espírito mortal entrou aqui com seu próprio corpo.


Ao longo da trajetória das tumbas para aquele deserto, tinha entendido sua situação única no inferno.

Indo junto dos dois demônios para aquele lugar, seu corpo tinha acompanhado o espírito. Embora fosse contra as leis da Criação a entrada de um corpo nas pontes espirituais, o Paraíso e o Inferno, o lar dos demônios quebrava essa regra.

Os demônios por lá podiam caminhar com ou sem seus corpos roubados, contanto que esses corpos aguentassem o peso de transitar entre o mundo físico e aquele lugar. Com alguma sorte, seu corpo tinha suportado a passagem e seu espírito continuava preso nele como quando em vida.

Entendia pouco do funcionamento das coisas para poder compreender com exatidão o que aquilo significava, mas bastava saber que era uma excepcionalidade entre os espíritos mortais que lá sofriam. E descobrir que havia histórico de outros como ele...


— Há outros mortais na mesma situação que eu?


Asmodeus não ouviu, ou o ignorou completamente, mas não teve tempo de repetir. Na pausa de um suspiro, as areias começaram a se agitar, o som desconhecido que ouviu antes se intensificando e cada vez mais próximo.

Era música. Trombetas e címbalos, tambores e flautas. E um canto estranho que não parecia estar em nenhuma língua compreensível. Depois, os músicos apareceram.

Uma procissão festiva se aproximava, perturbando a calma das dunas com seus passos e com a dança. Figuras vagamente humanas trajadas em tecidos coloridos, e bestas adornadas com jóias preciosas. As montarias variavam desde cavalos a elefantes, burros e camelos.

Clavicula Satanae: A Chave de SatãOnde histórias criam vida. Descubra agora