CAPÍTULO 6 - NOSSAS MEMÓRIAS

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Sempre há um final para todas as coisas, inclusive para a vida. Acho que nunca estamos preparados para ver alguém sair de nossas vidas, não dá forma que ele saiu da minha. Passamos tantos anos brigados e quando finalmente encontramos a nossa paz ele se vai. Vai ver ele só precisava disso, de paz para poder ir tranquilo.

Algumas horas antes da sua partida ele disse que não poderia ir sem se desculpar comigo... a gente nunca imagina a dor que a perda pode causar em uma pessoa até sentirmos.

E quantas vezes nós já partimos da vida de alguém sem perceber? Sem ao menos dizer um adeus ou um "volto logo"? Nada é eterno, tudo é finito. Quisera eu ter tido tempo para me reconciliar com ele da maneira correta, e agora estou aqui, o enterrando.

Minha mãe, sentada em um banco amparada por dona Flor, chorava silenciosa. Havia poucas pessoas, somente as mais próximas pois Demétrio não era de muitos amigos - ele não acreditava que as pessoas fossem mesmo amigas umas das outras. A verdade é que ele nunca confiou em alguém ao ponto de chamá-lo de amigo, e queria que eu fosse assim.

Helena está ao meu lado, nossos filhos em nossa frente. Não conheceram muito o avô e pouco tempo passaram com ele desde que chegaram, não tiveram tempo de se apegar a ele e por isso não choraram. Eu já não chorava mais. Helena, assim como minha mãe, derramava algumas poucas lágrimas. Júlia, Jéssica e Cadu estavam próximos também. Cadu bem mais, sua não estava em meu ombro e, estando mais perto, segurou minha mão enquanto dizia pelos olhos "Eu estou aqui". Ele sempre esteve ali para mim e por mim. Ter Cadu naquele momento, de alguma forma, me dava forças.

Após as palavras do padre e uma singela declaração de minha mãe, o caixão finalmente foi enterrado. Aquele foi o nosso adeus. Flores foram lançadas sobre o caixão e uma música que ele tanto amava foi entoada. Fui abraçado por minha mãe e pouco a pouco as pessoas foram deixando o cemitério. Iolanda convidou as pessoas mais próximas para ir em casa, e comigo foram Cadu, Júlia e Jéssica. Uma irmã distante de meu pai apareceu e dona Flor a todo momento dando suporte a minha mãe.

Após um tempo, sem ninguém perceber, subi para o meu quarto para ficar sozinho. Como disse, não sou bom lidando com essas coisas e sempre acabo me isolando. Acho que alguém acabou percebendo a minha saída discreta da sala.

- Entra! - digo em tom alto após ouvir a batida na porta. Era Cadu. Ele entrou, tímido, e por um momento o vi criança na porta do meu quarto. Me lembrei de quando perdi meu porquinho da índia, meu bichinho de estimação, e fiquei profundamente triste com isso. Nesse dia meu melhor amigo foi até o meu quarto, sentou ao meu lado e me abraçou em silêncio. Eu deitei minha cabeça em seu ombro e chorei. Amava muito Sr. P, e perder ele foi a coisa mais triste que já vivi. E agora, anos depois, essa cena se repete e cá estou eu deitado no ombro de Cadu chorando feito uma criança.

Ele sabia que não precisava dizer nada, que só a sua presença e companhia era mais do que suficiente para mim. Cadu me servia como uma âncora... como um farol que sempre me levava de volta pra mim.

Não sei explicar as coisas que ele causa em mim, é como se o vazio que havia aqui dentro tivesse sido preenchido no momento em que ele voltou para minha vida.

A semana após a morte do meu pai foi um pouco complicada, o clima em casa estava meio pra baixo e eu não tinha ânimo para nada. Após Helena insistir um monte, aceitei ir com ela em um barzinho encontrar com Cadu e as meninas. Se eu soubesse que André estaria lá também nem teria me dado ao trabalho de sair da cama. Ele era ridículo contando a história de casa tatuagem e colocando o braço em volta de Cadu, aquilo me deixava tão irritado e eu nem sabia porquê. Acredito que Helena tenha percebido meu incômodo ao me perguntar o que estava me incomodando. Desconversei e mudei de assunto comentando sobre o sítio para qual eu e Cadu fomos quando mais novos.

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