Capítulo 9

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Com o descer da noite, Zylkoris imaginou que a caravana fosse fazer uma pausa, mas os mercadores optaram por se manter em movimento. Acenderam tochas para iluminar a estrada escura, que mais pareciam um farol gigante botando um alvo em carroças abarrotadas de produtos valiosos. O assassino não achava aquela a melhor das ideias, mas preferiu não contestar para não chamar atenção para si. Como suposto guarda, dormir estava fora de cogitação. Ao lado de Dasgrid, ele ficou na frente da carroça enquanto Liam descansava.

— Nosso querido dono da carroça vai arrumar um belo de um torcicolo se ficar deitado nessa posição — comentou Zylkoris.

— É bem possível, viu? — respondeu o anão. — Ele vive com dor nas costas e coisas assim. Não é de se admirar pelo jeito que ele dorme.

— Calem a boca, que tem gente descansando — reclamou um sujeito deitado na carroça ao lado.

A dupla cessou a conversa de imediato. Sem poder falar, Zylkoris se limitou a lutar contra o sono naquela tarefa tediosa. Ele estava acostumado a trabalhar à noite, mas de forma muito ativa. A passividade o incomodava. Tudo era muito monótono no ambiente, desde a grama alta balançando com a brisa noturna até o céu com nuvens carregadas, anunciando uma possível chuva. Só torço para que caia um temporal e a gente passe um dia sem esse calor desgraçado.

De repente, ele viu uma parte da grama alta se mover. Não houve ruídos significativos, mas aquilo chamou-lhe a atenção, deixando-o mais alerta.

— Dasgrid — sussurrou Zylkoris. Ele apontou para onde havia visto o movimento. — Acho que tem alguma coisa ali.

O anão encarou a grama fixamente, apertando os olhos e mexendo a cabeça de posição, como se tentasse achar um ângulo de visão mais favorável. Ele coçou o cabelo e suspirou antes de voltar o olhar para a estrada.

— Não deve ser nada — respondeu finalmente. — Talvez, seja algum bicho.

— Talvez — concordou o assassino.

Eles voltaram a fazer silêncio. Zylkoris não tinha como ter certeza sobre o que tinha visto, mas não conseguia relaxar. Seus olhos passeavam pela grama procurando qualquer mínimo detalhe que indicasse a presença de algo perigoso. Com a falta de comida, a quantidade de bandidos assaltando caravanas havia disparado em Istkor, então a possibilidade de haver criminosos nas redondezas não era absurdo algum.

Zylkoris olhou para o céu e admirou as estrelas. Ele não era supersticioso, mas gostava de observar a constelação Corvo Maior. Ela só aparecia entre dez horas da noite e uma da manhã. A lenda dizia que era perigoso ficar fora de casa quando a ave negra tomava o céu, pois ela era o prenúncio da morte. O assassino lembrava de como seus falecidos pais o repreendiam se ele sequer olhasse para firmamento naquele horário. A ironia do destino fez com que o rapaz se tornasse um agente promotor daquela crença.

Mais um barulho na grama interrompeu o estado de contemplação do humano, que ergueu a cabeça e viu algo. Ele tinha certeza que um vulto passara por ali. Não sabia dizer nada além disso, até porque a iluminação da noite não era favorável, mas estava convicto da presença de algum estranho rondando a caravana.

— Dasgrid — sussurrou mais uma vez.

— Eu ouvi dessa vez — comentou o anão.

— Eu vi um vulto. Estou achando que é um bandido de estrada.

— Um bandido não atacaria sozinho uma caravana.

— Quem garante que ele tá sozinho? Acho bom a gente ficar bem atento.

A caravana seguiu em movimento e, no silêncio da noite, o som das rodas batendo nas pedras era amplificado. Cada rangido parecia alcançar léguas de distância. Zylkoris mordeu os próprios lábios e esfregou as unhas nas pontas dos dedos, contendo-se para não sair por conta própria e encontrar o indivíduo que ele enxergara. Entretanto, talvez fosse uma estratégia melhor permitir que os possíveis inimigos achassem que tinham a vantagem do elemento surpresa.

O Inferno de IstkorWhere stories live. Discover now