A Proposta

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No dia seguinte, logo após o almoço, Aracena estava no escritório do pai lendo um manuscrito sobre curandeirismo feérico quando a irmã abriu a porta e colocou a cabeça para dentro.

- Há alguém aqui que deseja vê-la - anunciou Solena.

A mais velha franziu o cenho, já que não esperava ninguém e, em geral, as visitas eram sempre para seus pais. Além de que sua irmã tinha um brilho estranho no olhar.

- Mande entrar - disse, por fim.

De todas as pessoas no mundo, aquela era a última que Aracena imaginara entrar no escritório de seu pai e seus olhos arregalados denunciavam sua surpresa. O rei parou próximo a escrivaninha e a jovem ofereceu-lhe o acento a sua frente, por educação.

- Nós não nos despedimos propriamente, Srta. Aracena - disse ele, ao acomodar-se.

O coração da jovem se acelerou enquanto ela pensava em que tipo de despedida o rei consideraria apropriada. Sentiu as bochechas queimarem, mas forçou-se a responder.

- Bem, o senhor estava ocupado e meus serviços já não eram mais necessários.

Osmaris notou o livro sobre a mesa e sorriu.

- Vejo que nossa conversa outro dia trouxe bons frutos - disse ele, apontando o exemplar e abrindo um sorriso.

- Confesso que nunca havia dado a devida importância à medicina das fadas até o senhor mencioná-las, majestade - respondeu ela, sorrindo de volta. Então, em um tom mais sério, acrescentou - No entanto, me pergunto qual o propósito de sua visita.

- Bem - disse ele sem parar de sorrir, - eu vim lhe agradecer, é claro.

- Não há o que agradecer, majestade. Eu apenas fiz o meu trabalho. De qualquer forma, o senhor não precisava se dar ao trabalho de vir até aqui.

- Eu queria agradecê-la pessoalmente - ele disse sério, os olhos transbordando intensidade - A senhorita salvou a vida da minha mãe, Aracena, jamais poderei esquecer - ele estendeu a mão e tocou a dela. - Estou aqui como um filho e não um rei.

Aracena sentiu o rubor tomando suas faces, mas não conseguia desviar o olhar daquelas duas lagunas extremamente azuis. Os longos dedos dele eram quentes sobre suas mãos sempre geladas, independente da estação. Não percebera que prendia a respiração até soltar um vacilante suspiro e conseguir puxar a mão de sob a dele. Para seu alívio, a irmã apareceu à porta com uma jarra e dois copos de madeira na mão.

- O senhor aceita um copo de garapa, majestade? - perguntou ela, sorridente.

- Aceito sim...

- Solena.

- Solena - repetiu ele.

A moçoila depositou a jarra e os copos sobre a mesa, serviu o rei e retirou-se, fechando a porta. Aracena despejou um pouco do líquido no outro recipiente e bebeu de uma vez, o sabor adocicado devolvendo-lhe os sentidos.

Osmaris tocou-lhe o rosto, sentindo sua pele macia. Os lábios dela se abriram e ela expirou o ar, trêmula.

- Bem, Srta. Aracena. Gostaria de lhe fazer uma proposta.

Ela olhou para ele com desconfiança, mas indicou que prosseguisse.

- Sinto que minha alma foi enfeitiçada pela senhorita e percebo que não é indiferente a minha presença. É claro que na minha posição não seria permitido desposá-la, uma vez que a senhorita não tem sangue nobre, mas gostaria que retornasse comigo ao castelo, na condição de minha concubina.

A jovem engasgou. Não era possível que ele estivesse lhe propondo aquilo.

- Receio não poder aceitar tal proposta, majestade - disse ela, com incrível serenidade - Posso não vir de linhagem nobre, mas minha família é muito respeitada. E eu não poderia atirar nosso bom nome na lama para viver como uma concubina.

A Bruxa de LádicaOnde histórias criam vida. Descubra agora