Capítulo 16

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"Ah, mas você precisa passar por essa floresta de novo e novo... disse a sombra na janela... e você precisa ter sorte para evitar o lobo todas as vezes...

Mas o lobo... o lobo só precisa de ter sorte para te encontrar uma vez."

Through the Woods, por Emily Carroll, tradução livre 

-Tanya, pelo amor de Deus, a gente não ta dentro de um vídeo game não! – Hugo gritou, os dedos brancos de tanta força que ele estava fazendo para se agarrar no banco. – Dirige devagar!

-Ah Hugo, relaxa aí! Não é como se algum de nós fosse morrer se o carro bater, certo? – Tanya revirou os olhos, fazendo uma curva tão abrupta que eu senti o cinto de segurança cortando contra minha pele. – Além do que eu tenho bastante experiência.

-Trauma emocional não conta não? Minha saúde mental não é importante para você? – Hugo questionou, se agarrando com força ao banco. -E você sabia que existem outras pessoas que ainda estão vivas andando por aqui? E se você atropelar uma delas?

Eu não pude deixar de fazer careta. – Ser atropelado dói bastante.

-Affe vocês dois. Vocês acham mesmo que o Exército ia nos emprestar um carrinho normal? – Tanya revirou os olhos, apontando um selo dourado no canto do vidro. – Esse daqui não é um simples carrinho meia tigela, meus amores. É um Bugatti Kyra, ultimate turbo edition.

Uma longa pausa seguiu a fala de Tanya, deixando bem claro que não fazíamos a menor idéia do que ela estava falando.

-Ah, honestamente! – Tanya bufou, parecendo acelerar o carro mais ainda em sua frustração. – Essa belezinha aqui chega a mais de 400km/h, sem contar, é claro, que é elétrico, sua bateria usa energia solar e tem o seu próprio gerador interno. É 100% eco-friendly.

-Deve ser mesmo, porque do jeito que ele ta indo, eu vou acabar virando adubo aqui. – Hugo resmungou, mas Tanya ou não ligou, ou simplesmente não percebeu.

-É claro, sendo o carro padrão para oficiais do Exército, ele tem alguns segredinhos, como o fato de que ele é incapaz de causar dano a propriedade dos humanos vivos. Assim sendo, mesmo que eu vire aqui e bata de cara em uma parede, - Tanya exemplificou, fazendo com que Hugo e eu fechássemos os olhos e começássemos a gritar em pânico – nada aconteceria. – Ela concluiu, um sorriso quase perverso em seu rosto.

Eu respirei fundo, levando a mão no peito. Meu coração batia tão rápido que chegava a doer.

-TRAUMAS PSICOLÓGICOS TANYA, TRAUMAS! – Hugo gritava, batendo na parte de trás do assento do motorista, onde Tanya estava sentada. – Caramba, mas eu vou te mandar a conta do meu analista!

Tanya deu uma risada alegre e, embora uma parte de mim quisesse gritar com ela também, existia outra que estava feliz por vê-la feliz.

Acho que essa era uma parte de mim que nunca iria mudar, eu ficava feliz em ver os outros felizes. Sempre fiquei e sempre ficaria.

E tudo bem. Eu só tinha que ter o cuidado de me lembrar em levar as minhas necessidades em conta também.

Em meio a toda essa bagunça, demorei um pouco para perceber que Aline parecia estranhamente alheia a tudo o que estava acontecendo. Quase como se ela não estivesse ali.

Será que Aline estava aqui?

Como se sentisse meu olhar nela, os olhos de Aline encontraram os meus e ela sorriu para mim através do reflexo do vidro. Uma atitude normal, simpática até.

Mas tão vazia.

Aquilo estava honestamente me incomodando.

O cemitério estava anormalmente silencioso quando finalmente chegamos lá, Tanya estacionando o carro de qualquer jeito no meio da rua.

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